A
inflação romana e o Brasil
Pedro J. Bondaczuk
O ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso,
disse, numa das tantas entrevistas que já concedeu desde que assumiu o cargo,
que está preocupado “diariamente em colocar a casa em ordem”. Ou seja, procura
fórmulas para zerar o déficit público e para baixar a inflação a níveis mais
suportáveis.
O combate a essa disfunção econômica, para ter
sucesso, precisa ser persistente, contínuo, sem tréguas e sem, mistificações.
Exige, além de conhecimento técnico, grande capacidade de negociação política
e, sobretudo, autodisciplina. A luta tem que ser diária.
O ideal é que essa guerra sem quartel se desenvolva,
simultaneamente, em duas frentes distintas. De um lado, requer-se austeridade
nos gastos governamentais, de forma a que as despesas sejam rigorosamente
compatíveis com a arrecadação de tributos.
Na outra ponta, é desejável o aumento da produção de
bens e serviços, com o estímulo à livre concorrência, quando então as
inflexíveis leis do mercado passam a ser aliadas. Havendo maior oferta do que
procura, a tendência dos preços é a de queda.
Daí a fórmula recessiva, aplicada por tanto tempo no
País, ter sido um veneno econômico, não o remédio que se pretendia. O melhor
caminho para esse “boom” produtivo é o do estímulo e amparo às pequenas e
médias empresas. Hoje, elas são responsáveis por 60% da geração de empregos no
Brasil.
Essa cifra poderia ser muito maior caso houvesse uma
política consistente de amparo e orientação ao microempresário. E regras claras
de mercado, com a aplicação das leis existentes para punir práticas desleais de
comércio, entre as quais o “dumping”. Ou seja, a redução artificial de preços,
por um período determinado, até a eliminação do concorrente mais frágil.
A inflação, ao contrário do que muitos pensam, não é
um fenômeno dos nossos tempos. É um mal muito antigo, que afetou inúmeras
sociedades através dos séculos, sem que as lições deixadas pelo passado viessem
a ser aproveitadas. O Império Romano conviveu durante um longo período com os efeitos
inflacionários, conforme revela interessante estudo histórico publicado na
edição de janeiro/fevereiro de 1984 da revista interna do Banco Real. Em tudo
esse caso tão antigo lembra o que ocorre hoje no Brasil.
Ou seja, tanto na Roma, a superpotência daquela
época, quanto em nosso país, hoje, a moeda nacional foi aviltada. Os denários
de pratas, que nos tempos do imperador Augusto (31 a.C-14 d.C) tinham um grau
de pureza de 98%, em 270 d.C possuíam apenas 3% do metal, o suficiente para
lhes dar a aparência brilhante, e assim mesmo, enquanto novos.
Essa corrupção monetária deveu-se à descontrolada
emissão, que se fazia necessária para cobrir os delírios perdulários dos vários
governantes de então. Claro que naqueles tempos remotos não havia índices para
aferir o aviltamento da moeda. Mas seus efeitos não tardaram a se fazer sentir.
O supramencionado trabalho, intitulado “A inflação
através dos tempos”, destaca que em 129 d.C uma escrava custava 1.200 moedas de
prata. Dois séculos depois, esse custo já havia ascendido para 42 mil! Todos os
outros produtos e serviços, alguns mais, outros menos, dependendo de sua
abundância ou escassez, sofreram brutal encarecimento.
À luz dessas revelações, não se pode negar que a
desordem econômica foi um dos fatores que levaram o Império Romano à derrocada.
Daí não podermos ter ilusões acerca de uma possível convivência entre
desenvolvimento e uma inflação elevada, como a que o País suporta há mais de
uma década.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio
Popular, em 6 de julho de 1993)
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