A doença que atrapalhou
e abreviou a vida de Humberto de Campos
Pedro
J. Bondaczuk
A vida de Humberto de
Campos teve tantas circunstâncias que, claro, influenciaram decisivamente em
sua vasta obra, que para relatá-las todas, seria preciso redigir um livro
inteiro, e dos mais volumosos, e ainda assim muita coisa acabaria omitida. Um
dia, quem sabe, eu encare esse desafio e tente trazer o máximo delas à baila. A
mais dramática, sem dúvida, foi a doença que o acometeu. Foi a acromegalia, que
tornou seus derradeiros seis anos de vida um inferno. Imagine, o leitor, o que
significa, por exemplo, para um escritor (e ademais para qualquer pessoa, sem
dúvida), a perda progressiva da visão! O efeito disso sobre o ânimo de quem
passa por essa provação é bombástico. Mas não foi só isso – que mesmo que
fosse, já seria terribilíssimo – mas a doença progressivamente o inutilizou.
Pior: deformou-o, tornando seu aspecto físico “monstruoso”. Levou-o a
retrair-se, a evitar o contato com as pessoas, a privar-se por completo da vida
social e a afastar-se, até, da família.
Recorro, para a
descrição da doença que acometeu Humberto de Campos, aos sempre bem vindos
préstimos da Wikipédia. Essa enfermidade, que nem mesmo é assim tão rara e que,
a despeito dos recursos médicos atuais, tende a ser incurável, era pouco
conhecida na primeira metade do século XX. Ainda hoje, é possível que um ou
outro “sortudo” seja curado. Mas caso a cura ocorra, ela é raríssima. Imaginem
em 1928, quando a Medicina era bastante atrasada, se comparada aos dias atuais!
Para o leitor ter uma idéia, sequer a penicilina havia, ainda, sido descoberta
por Alexander Fleming, o que viria a ocorrer somente em 1937. Os diagnósticos
eram quase que na base do “palpitômetro”. Tanto que os sintomas (hoje
claríssimos e rapidamente identificáveis), foram diagnosticados por um dos
médicos a que o escritor recorreu, como “reumatismo articular”. Claro que não
era isso. Será que se fosse feito um diagnóstico correto o paciente teria
chance de cura? Talvez! Todavia, não creio. É possível, contudo, que os
sintomas mais desagradáveis pudessem, pelo menos, ser minorados.
Wikipédia caracteriza
assim a acromegalia: “síndrome causada pelo aumento da secreção do hormônio de
crescimento (GH e IGF-I) em adultos”. Ocorre que a doença é mais comum na
infância e na adolescência, quando recebe o nome genérico de “gigantismo”. E o
que acontece quando a acromegalia atinge adultos? A enciclopédia eletrônica
responde: “Por ocorrer na fase adulta, em que as epífises já encerraram, o
crescimento se dá nas partes moles e nos ossos (não no crescimento longitudinal
– ficando mais alto como no gigantismo – mas em largura. Geralmente o intervalo
entre o início da doença e o seu diagnóstico é de 12 anos, pois o crescimento
anormal demora para ficar claramente distinto do normal”. Esse aspecto leva à
conclusão que a acromegalia já estava presente no organismo de Humberto de
Campos pelo menos seis anos antes de serem detectados seus primeiros sintomas,
ou seja, possivelmente em 1922.
E como é essa doença
neste nosso avançado século XXI? A Wikipédia responde: “A incidência é de 5 a 6
casos novos por milhão por ano. Já a prevalência é de 40 a 50 casos por milhão.
A idade de início geralmente é entre a terceira e a quarta década de vida,
sendo mais comum em mulheres. Tem um índice de mortalidade 2 a 3 vezes maior
que a população normal, e as causas de morte são, na sequência, cardiovascular,
respiratória e neoplasias”. Como se nota, a despeito dos progressos da
Medicina, a acromegalia segue matando, e com relativa rapidez, as pessoas a que
afeta.
E o que a pessoa, o
adulto no caso, como ocorreu com Humberto de Campos, sente quando acometida
pela acromegalia? Wikipédia lista alguns dos sintomas, cujos principais são:
“cefaléia (dor de cabeça), distúrbios visuais, perda de campo visual, paralisia
de pares cranianos, letargia, fraqueza, perda da libido, infertilidade,
desfiguração facial (a arcada do maxilar inferior excede a do maxilar superior,
havendo, portanto, prognatismo), aumento de mãos e pés (as mãos crescem em
largura e espessura. O seu volume contrasta particularmente com o do braço, que
se conserva normal), crescimento exagerado do volume do tórax, do nariz e dos
genitais, fraqueza muscular, aumento da área do coração com insuficiência
cardíaca e hipertensão arterial sistêmica, apneia do sono, por aumento de
partes moles e aumento da língua”. Imaginem o sofrimento de Humberto de Campos.
Mas o notável que, mesmo quase cego, ele não parou de escrever, até pelo menos
seis dias antes de sua morte. Isso é que era força de vontade!
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