Não
há motivos para comemorações
Pedro J. Bondaczuk
A
cidade de Nova York está engalanada para uma grande festa, que é a parada da
vitória na guerra do Golfo Pérsico, a ser realizada na segunda-feira.
Washington também fará um desfile semelhante, com a exibição de algumas das
"vedetes" do conflito, como os helicópteros Apaches e os caças
britânicos Harrier, que decolam verticalmente. Tais cerimônias, todavia, não
contam com aprovação unânime.
Diversos
grupos pacifistas opõem-se a elas, e com razão, posto que a morte de milhares
de seres humanos não é nenhum motivo válido para se comemorar. Ademais, a
própria vitória é contestável, já que somente um dos objetivos da guerra, a
expulsão das tropas de Saddam Hussein do Kuwait, foi conseguido e a um preço sumamente
alto, não apenas em perdas de vidas --- não importa quais --- mas sobretudo de
destruição e de agressão aos princípios de civilização, tão apregoados, mas
pouco praticados.
O
simples fato de se ter recorrido às armas para a solução de uma controvérsia
significou a derrota da razão diante da força. Que ser civilizado é esse que só
resolve suas pendências através do recurso da violência? E que não se argumente
com a legitimidade de uma reação diante de um tirano, no caso o presidente do
Iraque.
Embora
seu país tenha sido duramente atingido a ponto de regredir à Idade Média, em
termos de qualidade de vida, o ditador permanece impávido no poder, mais forte
do que nunca. Embora o Kuwait haja sido libertado, o preço pago foi muito alto,
principalmente para a humanidade, que terá de conviver com o maior desastre
ecológico provocado pelo homem desde que esse animal povoou o Planeta.
Estranhamente,
a mídia omite informações a respeito dessa incrível, estúpida, monumental
agressão ao meio ambiente, que foi o vazamento de milhões de litros de petróleo
nas águas do Golfo Pérsico e que tem sido diariamente a fumaça lançada na
atmosfera pela queima de uma quantidade impressionante de óleo cru de mais de
500 poços que ainda ardem em chamas e que não se sabe até quando.
Isto
é razão para se comemorar? Os mais de US$ 400 bilhões jogados fora, importância
que será necessária para a reconstrução do Iraque e do Kuwait, são motivos
válidos para festa?
O
que não daria para se fazer, em termos de correção das injustiças sociais, com
essa importância? Com esse dinheiro, pode-se afirmar categoricamente, sem medo
de exagero, que a miséria seria erradicada da Terra, caso fosse aplicado para o
bem de quem realmente precisa.
Nessa
questão da violência, sempre é oportuno ouvir o que um magnífico ser humano,
que dedicou toda a sua vida ao próximo, como foi Albert Schweitzer, Prêmio
Nobel da Paz de 1952, tem a dizer: "As armas são instrumentos desastrosos
e não são ferramentas apropriadas para um nobre ser. Só quando não pode evitar
é que faz uso delas. Para ele, a calma e a paz são os dons mais altos. Pode
vencer, mas não tem nisso nenhum prazer. Quem quer que se regozije com a
vitória pode regozijar-se também com o assassínio..."
Ao
invés de parada da vitória, portanto, a humanidade, e não somente os
norte-americanos, deveria reservar o dia de hoje para uma profunda meditação
acerca dos rumos que o mundo está tomando. Não será, certamente, pelas armas
que a tão desejada "Nova Era" de paz virá a ser implantada. A menos
que ela seja a "pax romana": a dos cemitérios...
(Artigo
publicado na página 15, Internacional, do Correio Popular, em 8 de junho de
1991).
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