Cidadãos fazem história
Pedro J. Bondaczuk
O
dia 29 de setembro de 1992 incorpora-se, definitivamente, à história do Brasil,
mas o seu sentido --- se positivo ou negativo --- vai depender da sociedade que
se mobilizou por todo o País a favor do impeachment do presidente Fernando
Collor e da restauração da ética na política.
A
mesma exigência feita em relação ao político afastado, deve ser renovada, daqui
para a frente, em relação a todo o homem público. O brasileiro pôde exercer,
nos últimos meses, parte de seu direito de cidadania e tomara que tenha tomado
gosto pelo exercício e o transforme doravante em rotina.
Mas
não se esgotaram ainda todos os motivos para mobilização. Há muita, muitíssima
coisa a ser mudada no Brasil, para reverter a atual e perversa ordem social. Há
inúmeros direitos consagrados pela Constituição que vêm sendo sonegados aos
cidadãos.
Há
aberrações monstruosas, ilhas de prosperidade e desperdício convivendo com
continentes de miséria tão profunda, capaz de rivalizar com a de países
africanos, como a Somália, ou asiáticos, como Bangladesh.
O
29 de setembro terá um sentido histórico positivo, por exemplo, se cada
intenção manifestada pelos deputados a favor do impeachment, enunciada antes do
respectivo voto, seja, de fato, concretizada em atos. Os parlamentares falaram
muito em dignidade, honestidade, num país ideal para os seus filhos.
Compete-lhes,
agora, realizar tudo isso. O padre Antonio Vieira, num de seus antológicos
sermões, observou: "Palavras sem obras são tiros sem balas; atroam, mas
não ferem. A funda de Davi derrubou o gigante, mas não o derrubou com o estalo,
senão com a pedra".
É
importante, pois, que cada parlamentar tenha em mente as manifestações de boas
intenções que expressou na hora em que for votar algum projeto envolvendo
aposentados, ou assalariados, ou os menores abandonados.
Colbert
já dizia que "a grandeza de um país não depende da extensão de seu
território, mas do caráter do seu povo". E isto o brasileiro mostrou que
tem e de sobra, a despeito de tantas análises depreciativas que circularam nos
últimos tempos a seu respeito nos meios de comunicação.
O
cidadão tem senso ético aguçado. O assalariado que recebe um mísero salário
mínimo mensal não é o mesmo que distribui às mancheias cheques sem fundo, ou sonega
impostos, ou suborna autoridades para obter o que não lhe cabe. E quem corrompe
é gângster. Não é cidadão.
O
29 de setembro terá um sentido histórico positivo caso o novo presidente,
Itamar Franco, governe com e para o povo, sem arroubos populistas, mas sem
considerar a gente humilde de seu País como meros dados estatísticos. Se seus
ministros e assessores não quiserem transformar as pessoas, os trabalhadores
operosos e íntegros, em cobaias de experiências econômicas estapafúrdias. Se
não repetir o detestável e criminoso exercício do "é dando que se
recebe". Se eliminar de uma vez por todas a intermediação de verbas, o
tráfico de influências, o apadrinhamento, enfim, a corrupção ativa e passiva,
não apenas do seu governo, mas através de campanhas publicitárias bem
engendradas, do próprio comportamento nacional.
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 1 de outubro de 1992).
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