O
tema esquecido
Pedro J. Bondaczuk
A imprensa dos países chamados de Primeiro Mundo
destacou, nas semanas anteriores, que a explosão demográfica foi o tema que
faltou na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e
Desenvolvimento, Rio-92, que se encerrou, oficialmente, no domingo passado.
É verdade que a falta de um planejamento familiar
cuidadoso é uma das causas – embora remotas – do aumento do grau de
miserabilidade do chamado Terceiro Mundo. E a miséria, conforme consenso obtido
entre os participantes dessa histórica e inédita reunião, é, por diversos
motivos, o perigo maior para o Planeta na atualidade. A questão, todavia,
precisa ser colocada nos devidos termos.
O economista suíço Rudolf H. Strahm, em seu livro
“Subdesenvolvimento, por que somos tão pobres?”, apresenta uma abordagem do
assunto que deveria ser a daqueles que se arrogam donos da Terra, como se esta
pudesse ou devesse ter proprietários e não meros inquilinos. Ou tripulantes, já
que ela é uma gigantesca nave a singrar o espaço.
Quem depreda mais os recursos terrestres, em nome de
um pretenso progresso, palavra em torno da qual sequer existe um consenso sobre
o que seja? Certamente não são os povos do chamado Terceiro Mundo, caso
contrário eles não deteriam as reservas que detêm e que as sociedades
desenvolvidas, oportunisticamente, se arrogam em “guardiãs”.
Strahm, em sua obra, põe o dedo direto na ferida.
Constata: “Superconsumo e penúria caracterizam a situação energética mundial:
um americano do Norte consome em média tanta energia quanto dois europeus, 55
indianos, 168 tanzanianos e 900 nepaleses. Os 6% da população mundial que vivem
nos Estados Unidos consomem mais de um quarto da energia mundial e 2,3 vezes
mais do que todos os países em desenvolvimento reunidos (inclusive os países
produtores de petróleo)”.
Entende-se, diante desse simples dado – citado,
aliás, por um economista suíço, do Primeiro Mundo e que, portanto, não tem o
mínimo interesse em exagerar estatísticas – a razão pela qual o presidente
norte-americano, George Bush, se recusou a assinar o Tratado da Biodiversidade.
Não foi só por razões eleitoreiras. Nem por preocupações humanitárias.
Ele argumentou que seu compromisso básico é com o
emprego dos cidadãos do seu país. Só que se fez de esquecido num pequeno “detalhe”.
Os recursos do Planeta não são inesgotáveis nem renováveis e aqueles que os
Estados Unidos tinham de sobra, estão, praticamente, exauridos.
Como suas indústrias vão continuar fabricando
milhões e milhões de unidades de produtos supérfluos, alimentando um consumismo
absurdo, sem matérias-primas ou sem fontes de energia? Strahm assinala,
portanto, que a chamada “explosão demográfica”, para ser colocada em seus
devidos termos, precisa ser “relativizada”. E conclui:”...cada recém-nascido
nos Estados Unidos custa ao meio-ambiente e aos recursos naturais o mesmo que
55 recém-nascidos na Índia”, por exemplo.
Do ponto de vista da ecologia mundial o consumo de
energia, a utilização de matérias-primas naturais e a degradação do
meio-ambiente que ocorrem nos países ricos são, certamente, tão graves quanto a
explosão demográfica dos países em desenvolvimento.
Este, sim, foi o grande tema ausente das
deliberações da Rio-92. Embora fosse mencionado (muito de passagem), não
recebeu a ênfase que mereceria. Fica a impressão de que os povos do Primeiro
Mundo acham que os desequilíbrios da natureza seguirão o mesmo padrão de seu
egoísmo e ausência de bom-senso, ou seja, atingirão somente as sociedades cujos
territórios se situam ao Sul da linha do equador.
Seria este o “paraíso” que sua mídia tanto apregoa
como fruto dos milagres da “tecnologia”, que tais países querem “construir”? Um
ambiente como esse a pena de Dante Alighieri idealizou com muito mais talento e
humor, só que o denominou de “inferno”, onde os que entram precisam deixar na
porta “todas as suas esperanças”.
(Artigo publicado na página 3, Opinião, do Correio
Popular, em 21 de junho de 1992)
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