Descobertas e rebeldia
Pedro
J. Bondaczuk
A adolescência é uma
fase da vida caracterizada, entre outras coisas, pela rebeldia. É a época da
contestação aos princípios, e às regras de comportamento, que foram
estabelecidos (e que nos foram transmitidos) pelos mais velhos. Em geral, os
que transmitem esses valores (alguns válidos, outros ultrapassados, superados
pelo tempo) são os pais e/ou os mestres (de uns tempos para cá, sobretudo,
estes).
Muitos adolescentes,
contudo, não têm esse privilégio, esse adestramento para a vida, essa atenção
aos seus desejos e aspirações. Tornam-se adultos prematuramente, na marra,
premidos pelas circunstâncias, diria pelas carências de lares que, convenhamos,
não merecem essa designação. São criados ao Deus-dará, em superpovoadas
favelas, ou em precárias vilas das periferias das grandes cidades, expostos a
todo o tipo de más-influências. Claro que isso traz conseqüências, e não raro
irreversíveis.
Quase sempre (embora
não se trate de nenhuma espécie de regra não escrita), esses rapazes e moças,
amadurecidos precocemente, privados, até, dos sonhos mais comezinhos, mas,
sobretudo, de oportunidades, descambam
para a marginalidade e para o crime. É a chamada rebeldia sem causa. Ou melhor,
tornam-se rebeldes com motivos, sim, (até que sólidos), mas os ditados pela
revolta, pela inveja dos privilegiados e pelo rancor despertado pela injustiça
social e pela exclusão a que são submetidos.
Esses meninos e meninas
de rua crescem privados de tudo, principalmente de educação (no sentido lato do
termo) até das normas mais elementares de vida e de comportamento, inclusive
dos princípios mínimos de higiene. Poucos chegam à plena maturidade. Acabam
mortos antes dos trinta anos. Ou vão superlotar, em princípio, as Febens da
vida e, posteriormente, as cadeias e penitenciárias (autênticas “universidades
do crime”) pelo País afora. Ou reproduzem, nos descendentes, a única realidade
que sempre conheceram: a do ódio, do abandono e da violência. Claro que há
exceções. Estas, todavia, são raríssimas,
e por isso, dignas de nota.
A adolescência é,
sobretudo, um período de “explosão” dos hormônios, muitas vezes em detrimento
dos neurônios. Tratemos de outra categoria de adolescentes, daqueles que,
bem ou mal, foram instruídos nas regras
e valores sociais vigentes. Sua rebeldia, se bem direcionada e compreendida,
tende a ser positiva. Pode resultar na criação de líderes, de revolucionários,
de contestadores de usos e costumes inadequados, posto que consolidados pelo
tempo, e que podem conduzir os povos a importantes avanços em termos de civilização.
Estes, igualmente, são
raros. E nem eles estão a salvo dos riscos causados pela imaturidade e dos
perigos, sempre presentes, ditados pelas más-influências. Experiências sexuais
prematuras e inadequadas, por exemplo, podem resultar em paternidade e
maternidade precoces, quando não em doenças sexualmente transmissíveis, entre
as quais a ultimamente onipresente Aids. O desejo de fuga da realidade, por
outro lado, tende a expor esses adolescentes ao alcoolismo e às drogas. E daí,
para a marginalidade e o crime, é só um passo.
Todos passamos por esse
tipo de experiência, por esse período de rebeldia, por essa fase de contestação
(sobretudo da autoridade), homens ou mulheres, não importa. Uns vivem essa
etapa com mais intensidade (e com maiores riscos, é claro). Outros
atravessam-na com menos exposição, dependendo do temperamento e da formação de
cada um. É, porém, uma época crítica da vida. É um momento de descobertas, de
surpresas e/ou de decepções. E, inegavelmente, é um período de formação ou, mais
precisamente, de consolidação da personalidade, daquilo que se convencionou
chamar de “caráter”.
André Maurois observou,
em um de seus ensaios: “Em quase toda a adolescência, os tempos mágicos e
abrigados da infância são sucedidos, com a descoberta da dureza da vida, por um
período de rebeldia. É o primeiro tempo da adolescência...O segundo é a
descoberta, apesar das decepções, maldades e dificuldades, da beleza da vida.
Nos seres normais, essa descoberta se realiza entre os dezoito e vinte anos. Ela
produz, em sua maioria, os poetas líricos”.
Embora seja cada vez
mais difícil agir dessa maneira, temos que induzir (com muito tato e
sabedoria), o adolescente nessa direção. Ou seja, na da descoberta da beleza da
vida. Pode até ser (o que é mais provável), que não se venham a produzir poetas
líricos em profusão, como André Maurois afirma. Mas, agindo assim, estaremos,
certamente, fornecendo a essa pessoa um roteiro seguro para uma descoberta
fundamental: a da felicidade (que sempre é relativa) e da alegria de viver.
Será que isso não vale a pena?
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