“Todo mundo quer
permanência”
Pedro
J. Bondaczuk
“A Literatura é
fascinante por todo e qualquer motivo que se considere. O livro é um mestre
onipresente, o tempo todo à nossa disposição, pronto para nos ensinar,
orientar, emocionar etc.etc.etc. e, sobretudo, para nos fazer refletir. Basta,
somente, que estejamos dispostos a empreender este aprendizado, essa deliciosa
aventura da inteligência, do saber e do espírito e que não o tenhamos, apenas,
como objeto decorativo, como muitos fazem. Manda o bom senso que façamos dele
companheiro constante e indispensável. Tenho pena de quem se priva, ou que seja
privado, do privilégio da leitura”.
Foi dessa forma que
iniciei texto recente – que alguns consideram ensaio curto e que eu classifico
de crônica – intitulado “Isso também passará”. Até parece que quando escrevi
essas palavras estava me referindo especificamente ao volume de poesias da
poetisa e psicanalista fluminense Márcia Mendes (que ela generosamente me
presenteou, com a devida dedicatória), intitulado “Permanência”, oportuno
relançamento da Editora “Mar de Letras”. Não estava me referindo a ele. Mas bem
que poderia (e principalmente deveria) estar. O que escrevi nessa crônica cabe
exatinho, como uma luva, nesse caso. A referida obra satisfaz tudo o que espero
encontrar em um bom livro, notadamente de poesias, quando me preparo para
lê-lo: ensina, orienta, emociona e, sobretudo, induz á reflexão. É a conclusão
a que chego agora, ao terminar, embevecido, sua leitura.
Poesia não pode ser
lida como se leem textos de outros gêneros, como romance, conto, novela,
crônica etc.etc.etc. Tem que ser degustada, saboreada, sentida, como uma comida
saborosa, como nutritivo maná, como a ambrosia dos deuses, posto que delícia
para o intelecto e, sobretudo, para o espírito e não para a carne. A leitura
tem que ser feita sempre em voz alta, para que os ouvidos identifiquem o som de
cada uma das palavras escritas, para que a alma baile leve e solta com sua
musicalidade. Sua mensagem deve ser interpretada pelo leitor, respeitando,
rigorosamente, a pontuação. Além disso, poesia exige releituras, não duas ou
três, mas uma quantidade incontável delas. É assim que as leio. Foi assim que
proporcionei régio banquete à alma com os versos de Márcia Mendes.
Ainda na citada
crônica, observei: “Meu objetivo é o de conferir à obra que pretenda produzir
certo caráter de permanência”. Convenhamos, todo escritor que se preze age da
mesma forma. Ninguém escreve textos, digamos, “pret-a-porter”, do tipo “use e
jogue fora”. Espera que permaneçam e, se possível, até o final dos tempos.
Mas... Ponderei, na sequência: “Essa condição (a da permanência) suscita
infindas considerações. Por mais que pretendamos e nos empenhemos, nada no
mundo é permanente. Vou mais longe: nada no universo é. Tudo está em permanente
mudança”.
Lembrei, então, o
óbvio: “Estrelas nascem, estrelas se extinguem, estrelas explodem, ou seja,
mudam. Novas galáxias surgem, velhas
galáxias desaparecem, muitas galáxias se fundem e vai por aí adiante. Tudo muda
o tempo todo. Nós mudamos, de um dia para o outro, sem que nos apercebamos.
Heráclito de Éfeso já havia chegado a essa conclusão, a da inflexível
mutabilidade das pessoas e das coisas, por volta do ano 500 antes de Cristo. O
lúcido filósofo escreveu a propósito: ‘A permanência é uma ilusão. Somente a
mudança é real’. E ilustrou sua tese com a célebre afirmação: ‘É impossível
pisar duas vezes no mesmo rio’. E não é? A calha pode até permanecer a mesma
(posto que só por algum tempo, e quanto não importa), mas as águas que correm
nela evidentemente, jamais serão”.
Sustento essa opinião,
porém observo que o fato da permanência absoluta ser uma impossibilidade, nem
por isso podemos abrir mão de tentar tornar nossas obras permanentes, mesmo que
não por todo o tempo, mas pelo menos por algum (de preferência por muito)
tempo. É o que Márcia Mendes faz, esbanjando talento e sensibilidade. Seu livro
é daqueles que não podem ser analisados em um único texto, sob pena de se
cometer tremenda injustiça com a autora e de se deixar o leitor no ar.
Certamente, voltarei ao tema. Contudo, deixo-lhes, como preciosa e requintada
“entrada”, de régio banquete, este poema que dá título à obra e que Márcia
dedicou à avó:
Permanência
“Gostava
de crisântemos na janela.
Flor
da Nobreza.
Nâo
eram bonitos, nem feios,
Mas
aguentavam aquele calor suburbano.
Um
dia, pensando no tempo
Ela
acordou rica de tristeza,
Pegou
um crisântemo amarelo,
Botou
numa taça de vinho
E
foi viver mais.
Todo
mundo quer permanência”.
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