Monday, April 13, 2015

Coincidência que me apresentou um gênio

Pedro J. Bondaczuk

Acredito em coincidências e muitas delas tornaram-me, se não mais sábio, pelo menos mais esclarecido. Uma das tantas delas ocorreu-me em 1986. Em setembro desse ano, recebi, na redação do Correio Popular de Campinas, jornal no qual era editor, mas também redator de páginas especiais – normalmente ensaios, de temas que eu escolhia, vários deles abordando livros e escritores, contudo não especificamente de Literatura, mas “também” dela – entre volumosa correspondência, um livro de autor que até então desconhecia. Na oportunidade eu não sabia, mas a coincidência de haver sido procurado propiciou-me o privilégio de conhecer um gênio das letras.

Hoje, não só sei bastante a seu respeito, como o considero um dos meus gurus literários, além de um dos mestres das letras nacionais. Até hoje não sei como ele descobriu meu nome, minha função e a empresa jornalística em que eu trabalhava. Na oportunidade, esse escritor já era justamente famoso em todo o País, embora até então eu nunca tivesse ouvido falar dele. Há que se considerar que isso aconteceu há 28 anos, quando eu não tinha, digamos, sequer 20% de conhecimento de Literatura, de livros e de escritores que tenho hoje.

Desde então, “muita água rolou por baixo da ponte”. Não afirmo que atualmente conheço “todos” grandes expoentes das letras nacionais. Duvido que alguém conheça. Mas minha ignorância a propósito não vai ao ponto que foi, em 1986, de desconhecer um mestre, como Salim Miguel, que foi quem me obsequiou, na ocasião, com uma de suas obras. O livro que então me enviou foi “O Castelo de Frankenstein”, o segundo que publicou pela Editora da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) e que na oportunidade era o oitavo da sua posteriormente vasta e excelente bibliografia. Tão boa, que em 2009 recebeu o cobiçado Prêmio Machado de Assis, da Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto da sua obra.

Fiz, na oportunidade, o que sempre fazia quando recebia algum livro (e, creiam-me, tinha o privilégio de receber muitos) e o que faço até hoje. Antes de emitir qualquer opinião, li-o, de capa a capa, fazendo anotações á margem. Meu critério continua o mesmo desde que me atrevi, pela primeira vez, a comentar obras literárias alheias. Só comento – e algumas extensamente, em longos e detalhados ensaios –, os que gosto e que não tenho restrições a fazer. Os lançamentos em que detecto defeitos (de lógica, estilo, etc.etc.etc. ou mesmo gramaticais), mas que tenham conteúdo aproveitável, não ignoro por completo (como gostaria que meus livros não fossem ignorados). Redijo uma nota, que nem é tão pequena assim, destacando suas virtudes, sem mencionar suas deficiências. Afinal, não sou o dono da verdade e posso estar enganado. Não raro estou.

E como procedo em relação aos livros que não gosto e não considero “recomendáveis”? Ignoro-os por completo? Não!! Mas não ponho minha mão no fogo por eles. Escrevo uma breve carta (hoje o mais comum é escrever um e-mail) registrando o recebimento e agradecendo a lembrança. Todavia, não publico nenhuma avaliação a propósito. Se elogiasse o que não é elogiável estaria sendo hipócrita e correria o risco de cair em ridículo, pois muitos outros, além de mim, detectariam as deficiências e concluiriam (com razão), que não tenho critério, ou bom gosto, ou conhecimento ou tudo isso reunido. E por que, então, não “esculhambo” o tal livro, com todas as letras, apontando a totalidade de suas falhas? Porque não aceito o papel de destruidor dos sonhos de ninguém. Porque sei que quem escreveu e publicou essa obra se esforçou para fazer o melhor. Há quem considere essa minha atitude como mera omissão. Que seja! Mas jamais, em circunstância alguma, irei tripudiar sobre a imperícia de quem quer que seja. Outros que o façam.

A propósito de “O castelo de Frankenstein”, de Salim Miguel, escrevi todo um extenso ensaio – cujos principais tópicos partilharei com vocês, nos próximos dias – publicado no Correio Popular de Campinas na edição de 19 de setembro de 1986. Nem é preciso declarar que o livro me agradou. Aliás, muito mais do que simples agrado: encantou-me, entusiasmou-me, embeveceu-me. E olhem que esse entusiasmo todo não teve nada de subjetivo. Foi objetivíssimo. Há livros, de escritores famosos, que nem são tão bons, mas que consideramos “excelentes” pelo que conhecemos sobre seu autor. Não foi, todavia, o caso de “O castelo de Frankenstein”. Confesso minha ignorância na época. Não sabia nada, absolutamente nada de Salim Miguel Se conhecesse sua brilhante trajetória literária, como conheço hoje, provavelmente não me limitaria a escrever um único ensaio. Escreveria todo um livro a propósito.

Para quem eventualmente não conheça nada de Salim Miguel, que em 30 de janeiro de 2014 completou noventa anos de idade, peço licença para fazer brevíssima apresentação (mais detalhes, a seu respeito, darei nos próximos dias). Para tanto, recorro a um parágrafo do texto de Luciana Wrege Rassier, publicado na edição de setembro de 2011 da Revista Litteris (WWW.revistalitteris.com.br), em que ela escreve: “Homem de cultura e de ação, homem de palavra e da palavra, Salim Miguel atua desde a década de 1940 escrevendo, lendo, criando projetos, consolidando parcerias. Escritor, jornalista, editor, redator, crítico literário, roteirista, dono de livraria, diretor da Agência Nacional de Santa Catarina e da Editora da Universidade Federal de Santa Catarina, superintendente da Fundação Cultural Franklin Cascaes, esse respeitado intelectual é múltiplo e uno”. E pensar que vim a conhecer esse magnífico escritor por pura coincidência!!!!!


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