Coincidência que me
apresentou um gênio
Pedro
J. Bondaczuk
Acredito em
coincidências e muitas delas tornaram-me, se não mais sábio, pelo menos mais
esclarecido. Uma das tantas delas ocorreu-me em 1986. Em setembro desse ano,
recebi, na redação do Correio Popular de Campinas, jornal no qual era editor,
mas também redator de páginas especiais – normalmente ensaios, de temas que eu
escolhia, vários deles abordando livros e escritores, contudo não
especificamente de Literatura, mas “também” dela – entre volumosa
correspondência, um livro de autor que até então desconhecia. Na oportunidade
eu não sabia, mas a coincidência de haver sido procurado propiciou-me o
privilégio de conhecer um gênio das letras.
Hoje, não só sei
bastante a seu respeito, como o considero um dos meus gurus literários, além de
um dos mestres das letras nacionais. Até hoje não sei como ele descobriu meu
nome, minha função e a empresa jornalística em que eu trabalhava. Na
oportunidade, esse escritor já era justamente famoso em todo o País, embora até
então eu nunca tivesse ouvido falar dele. Há que se considerar que isso
aconteceu há 28 anos, quando eu não tinha, digamos, sequer 20% de conhecimento
de Literatura, de livros e de escritores que tenho hoje.
Desde então, “muita
água rolou por baixo da ponte”. Não afirmo que atualmente conheço “todos”
grandes expoentes das letras nacionais. Duvido que alguém conheça. Mas minha
ignorância a propósito não vai ao ponto que foi, em 1986, de desconhecer um
mestre, como Salim Miguel, que foi quem me obsequiou, na ocasião, com uma de
suas obras. O livro que então me enviou foi “O Castelo de Frankenstein”, o
segundo que publicou pela Editora da UFSC (Universidade Federal de Santa
Catarina) e que na oportunidade era o oitavo da sua posteriormente vasta e
excelente bibliografia. Tão boa, que em 2009 recebeu o cobiçado Prêmio Machado
de Assis, da Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto da sua obra.
Fiz, na oportunidade, o
que sempre fazia quando recebia algum livro (e, creiam-me, tinha o privilégio
de receber muitos) e o que faço até hoje. Antes de emitir qualquer opinião,
li-o, de capa a capa, fazendo anotações á margem. Meu critério continua o mesmo
desde que me atrevi, pela primeira vez, a comentar obras literárias alheias. Só
comento – e algumas extensamente, em longos e detalhados ensaios –, os que
gosto e que não tenho restrições a fazer. Os lançamentos em que detecto
defeitos (de lógica, estilo, etc.etc.etc. ou mesmo gramaticais), mas que tenham
conteúdo aproveitável, não ignoro por completo (como gostaria que meus livros
não fossem ignorados). Redijo uma nota, que nem é tão pequena assim, destacando
suas virtudes, sem mencionar suas deficiências. Afinal, não sou o dono da
verdade e posso estar enganado. Não raro estou.
E como procedo em relação
aos livros que não gosto e não considero “recomendáveis”? Ignoro-os por
completo? Não!! Mas não ponho minha mão no fogo por eles. Escrevo uma breve
carta (hoje o mais comum é escrever um e-mail) registrando o recebimento e
agradecendo a lembrança. Todavia, não publico nenhuma avaliação a propósito. Se
elogiasse o que não é elogiável estaria sendo hipócrita e correria o risco de
cair em ridículo, pois muitos outros, além de mim, detectariam as deficiências
e concluiriam (com razão), que não tenho critério, ou bom gosto, ou
conhecimento ou tudo isso reunido. E por que, então, não “esculhambo” o tal
livro, com todas as letras, apontando a totalidade de suas falhas? Porque não
aceito o papel de destruidor dos sonhos de ninguém. Porque sei que quem
escreveu e publicou essa obra se esforçou para fazer o melhor. Há quem
considere essa minha atitude como mera omissão. Que seja! Mas jamais, em
circunstância alguma, irei tripudiar sobre a imperícia de quem quer que seja.
Outros que o façam.
A propósito de “O castelo
de Frankenstein”, de Salim Miguel, escrevi todo um extenso ensaio – cujos
principais tópicos partilharei com vocês, nos próximos dias – publicado no
Correio Popular de Campinas na edição de 19 de setembro de 1986. Nem é preciso
declarar que o livro me agradou. Aliás, muito mais do que simples agrado:
encantou-me, entusiasmou-me, embeveceu-me. E olhem que esse entusiasmo todo não
teve nada de subjetivo. Foi objetivíssimo. Há livros, de escritores famosos,
que nem são tão bons, mas que consideramos “excelentes” pelo que conhecemos
sobre seu autor. Não foi, todavia, o caso de “O castelo de Frankenstein”.
Confesso minha ignorância na época. Não sabia nada, absolutamente nada de Salim
Miguel Se conhecesse sua brilhante trajetória literária, como conheço hoje, provavelmente
não me limitaria a escrever um único ensaio. Escreveria todo um livro a
propósito.
Para quem eventualmente
não conheça nada de Salim Miguel, que em 30 de janeiro de 2014 completou
noventa anos de idade, peço licença para fazer brevíssima apresentação (mais
detalhes, a seu respeito, darei nos próximos dias). Para tanto, recorro a um
parágrafo do texto de Luciana Wrege Rassier, publicado na edição de setembro de
2011 da Revista Litteris (WWW.revistalitteris.com.br),
em que ela escreve: “Homem de cultura e de ação, homem de palavra e da palavra,
Salim Miguel atua desde a década de 1940 escrevendo, lendo, criando projetos,
consolidando parcerias. Escritor, jornalista, editor, redator, crítico literário,
roteirista, dono de livraria, diretor da Agência Nacional de Santa Catarina e
da Editora da Universidade Federal de Santa Catarina, superintendente da
Fundação Cultural Franklin Cascaes, esse respeitado intelectual é múltiplo e
uno”. E pensar que vim a conhecer esse magnífico escritor por pura
coincidência!!!!!
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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