Líder autêntico, mas desprestigiado
Pedro J. Bondaczuk
O presidente argentino, Raul Alfonsin, que enfrenta
dificuldades enormes em seu país, de caráter político, econômico e até
institucional, pode se tornar, hoje, um dos raros latino-americanos a obter um
Prêmio Nobel. Ele é um dos mais sérios candidatos, ao lado da mandatária
filipina, Corazón Aquino e da Organização Mundial de Saúde, à obtenção da
honraria. Mesmo que ele não venha a conquistar tal distinção, todavia, o
simples fato de ter sido lembrado para tanto mostra o prestígio internacional
de que goza atualmente. Afinal, tem sido, nos últimos quatro anos, um dos
líderes mais sérios, determinados e audazes da América Latina.
Enfeixa em suas mãos uma série de questões capazes
de perturbar o mais sereno dos homens. Mesmo assim, entre tropeços e avanços,
erros e acertos, vem conduzindo a contento a Argentina em meio a um árduo
processo de transição.
Enquanto isso, em seu país, chegaram a circular até
rumores de que o presidente estaria em vias de renunciar ao cargo. É evidente
que tais boatos só podem ter partido de fontes radicais, retrógradas, das tais
que só se satisfazem quando tudo está ruim, para extrair proveitos pessoais. O
presidente, de fato, ainda não se refez da derrota eleitoral da União Cívica
Radical nas eleições de 6 de setembro passado.
Sensível como é, porém, percebeu que os rumos por
onde a nação está enveredando não são exatamente os desejados por sua
sociedade. E dentro do possível (ou factível), com muita humildade por sinal,
tenta reorientar suas ações. Tudo sem traumas, medidas de força e nem qualquer
forma de pressão ilegítima. Age, portanto, dentro do mais perfeito figurino
democrático, o que é (desgraçadamente) uma raridade nessa nossa infeliz América
Latina.
Para um líder que assumiu o país no auge do
desprestígio externo e o recompôs pelo menos a um nível aceitável; para quem
pegou um governo virtualmente falido, que sequer tinha recursos para saldar os
juros da dívida externa e recompôs o perfil do endividamento de forma
vantajosa; para quem teve que curar "feridas" geradas pela
"guerra suja" do regime anterior, que deixou um número de
desaparecidos que nunca será conhecido com exatidão e teve a coragem de punir,
dentro da lei, os que se excederam na repressão, nada mais justo do que ser
lembrado para uma honraria desse porte. Se ele ganhar, em poucas vezes o Nobel
da Paz estará em tão boas e legítimas mãos quanto nessa oportunidade.
(Artigo publicado no Correio Popular em 13 de
outubro de 1987)
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk.
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