Wednesday, April 29, 2015

Dolorosa tentativa de reconciliação


Pedro J. Bondaczuk


O processo de pacificação nacional no Líbano continua penoso e instável, embora muitos passos tenham sido dados rumo à reconciliação, pelo gabinete de Rachid Karami. Beirute, por exemplo, está, virtualmente, sob o controle do Exército, o aeroporto da capital funciona outra vez, tanto para pousos quanto para decolagens e a Linha Verde, que dividia a zona urbana em duas virtuais e distintas cidades (a parte Leste, dos cristãos, e a Oeste, de predominância muçulmana), já não mais existe.

Entretanto, ao que parece, ainda há muita brasa ardendo sob as cinzas, como demonstra o incidente ocorrido ontem, no bairro de Basta. Atentados, como este, podem pôr a perder todo um trabalho lento, paciente, de refinada diplomacia, como este, conduzido pelo hábil político Karami. O passo dado, em Beirute, para a reconciliação nacional, embora expressivo, ainda é muito pequeno. Um quase nada.

Sob intensa expectativa e uma vacilante esperança, no sábado da próxima semana, dia 18 de agosto, o governo libanês tentará avançar mais alguns centímetros, penosos, sofridos, rumo ao restabelecimento da ordem no país.

O Exército, agora revigorado e com o moral alto, após o sucesso da operação em Beirute, tentará ocupar as problemáticas Montanhas Chuf, que circundam a capital, com o objetivo de pacificar duas das dezessete milícias rivais libanesas: as drusas e as cristãs maronitas.

Mas é necessário que haja boa vontade, não apenas de Karami, de Gemayel e de outros líderes, que sonham com uma sociedade reestruturada, onde a lei e a ordem voltem a imperar. É preciso que todos desarmem os espíritos, arregacem as mangas e caiam em si, atentando para a dura realidade do país.

Uma família desunida nunca pode prosperar. Da mesma forma, ocorre com uma comunidade nacional, que não passa de uma macro-família, ligada por laços comuns, de língua, do território e das tradições.

O que aconteceu ao Líbano, nesses penosos nove anos de guerra civil, deve servir de exemplo, e de alerta, a outros países. Exemplo de como a intolerância pode prosperar quando se dá ouvidos a extremistas, internos e externos. Alerta para as conseqüências desastrosas que o ódio, a insânia e as ações ao arrepio das leis podem trazer em termos de perda de vidas e de bens. Por isso, nunca é demais a aplicação do surrado clichê, que por vir do povo, cristaliza uma grande sabedoria: “É sempre preferível um mau acordo do que uma boa demanda”.     

(Artigo publicado na página 10, Internacional, do Correio Popular, em 10 de agosto de 1984)


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