Temores a serem superados
Pedro J. Bondaczuk
A reunificação das duas Alemanhas, embora seja tacitamente
aceita por europeus ocidentais e orientais, causa inquietação nos dois lados da
Europa. Todos negam isso publicamente, mas aqui e ali escapam alguns retalhos
de temores mal contidos, que se
reunidos, demonstram que o processo não desperta o entusiasmo que muitos
procuram dar a entender. A Comunidade Econômica Européia, por exemplo, em vias
de abolir diversas barreiras no âmbito das 12 nações que a compõem, tem lá seus
receios acerca de uma nova preponderância que teria um Estado germânico
fortalecido. A Polônia, embora se diga satisfeita com a possibilidade de
participar da conferência "Quatro mais Dois", envolvendo as quatro
potências vencedoras da Segunda Guerra Mundial --- EUA, União Soviética,
Grã-Bretanha e França --- e a Alemanha Ocidental e Alemanha Oriental, mal
esconde seus traumas.
Estes, evidentemente, referem-se às suas fronteiras
atuais, que possuem terras germânicas que lhes foram anexadas após o conflito.
A França, muito secretamente, teme que se reacenda, a longo prazo, no país
unificado, a tentação de reaver a Alsácia e a Lorena, que nos últimos séculos
mudaram diversas vezes de mãos. A Grã-Bretanha, pelo visto, diante das
declarações da primeira-ministra Margaret Thatcher, já sequer esconde seus
receios em torno da reunificação. Acha que a ambigüidade do chanceler Helmut
Kohl na questão de fronteiras com os poloneses é sintomática.
Quanto à Europa Central, embora as manifestações da
Hungria e da Checoslováquia sobre o tema não sejam freqüentes, as poucas que
são feitas vêm carregadas de inquietações. Isto para não falar da União
Soviética, que não está gostando nada da intenção germânica de filiar a
Alemanha reunificada à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Como
se vê, apesar de mais de meio século de iniciado e de 45 anos de terminado, o
conflito mundial ainda não teve seus efeitos plenamente absorvidos, apesar da
geração que o protagonizou já estar virtualmente extinta.
Curiosamente, o processo reunificador foi previsto
publicamente, de forma clara, pela primeira vez, não por Kohl ou qualquer líder
alemão ocidental. Quem o mencionou foi o deposto comunista de linha-dura alemão
oriental, Erich Honecker, em 10 de setembro de 1987, ao visitar a sua cidade
natal, Neukirchen, no Estado Federado do Sarre. Ele prognosticou, na ocasião:
"Ainda chegará o dia em que as fronteiras não nos irão separar, mas
unir". No que diz respeito aos germânicos, isto já é de fato quase uma
realidade. Mas no que se refere à Europa...Muitos temores terão que ser
acalmados, fantasmas precisarão ser exorcizados e lembranças amargas
necessitarão ser esquecidas.
(Artigo publicado na página 13, Internacional, do
Correio Popular, em 27 de março de 1990)
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