Wednesday, April 01, 2015

Temores a serem superados


Pedro J. Bondaczuk


A reunificação das duas Alemanhas, embora seja tacitamente aceita por europeus ocidentais e orientais, causa inquietação nos dois lados da Europa. Todos negam isso publicamente, mas aqui e ali escapam alguns retalhos de temores  mal contidos, que se reunidos, demonstram que o processo não desperta o entusiasmo que muitos procuram dar a entender. A Comunidade Econômica Européia, por exemplo, em vias de abolir diversas barreiras no âmbito das 12 nações que a compõem, tem lá seus receios acerca de uma nova preponderância que teria um Estado germânico fortalecido. A Polônia, embora se diga satisfeita com a possibilidade de participar da conferência "Quatro mais Dois", envolvendo as quatro potências vencedoras da Segunda Guerra Mundial --- EUA, União Soviética, Grã-Bretanha e França --- e a Alemanha Ocidental e Alemanha Oriental, mal esconde seus traumas.

Estes, evidentemente, referem-se às suas fronteiras atuais, que possuem terras germânicas que lhes foram anexadas após o conflito. A França, muito secretamente, teme que se reacenda, a longo prazo, no país unificado, a tentação de reaver a Alsácia e a Lorena, que nos últimos séculos mudaram diversas vezes de mãos. A Grã-Bretanha, pelo visto, diante das declarações da primeira-ministra Margaret Thatcher, já sequer esconde seus receios em torno da reunificação. Acha que a ambigüidade do chanceler Helmut Kohl na questão de fronteiras com os poloneses é sintomática.

Quanto à Europa Central, embora as manifestações da Hungria e da Checoslováquia sobre o tema não sejam freqüentes, as poucas que são feitas vêm carregadas de inquietações. Isto para não falar da União Soviética, que não está gostando nada da intenção germânica de filiar a Alemanha reunificada à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Como se vê, apesar de mais de meio século de iniciado e de 45 anos de terminado, o conflito mundial ainda não teve seus efeitos plenamente absorvidos, apesar da geração que o protagonizou já estar virtualmente extinta.

Curiosamente, o processo reunificador foi previsto publicamente, de forma clara, pela primeira vez, não por Kohl ou qualquer líder alemão ocidental. Quem o mencionou foi o deposto comunista de linha-dura alemão oriental, Erich Honecker, em 10 de setembro de 1987, ao visitar a sua cidade natal, Neukirchen, no Estado Federado do Sarre. Ele prognosticou, na ocasião: "Ainda chegará o dia em que as fronteiras não nos irão separar, mas unir". No que diz respeito aos germânicos, isto já é de fato quase uma realidade. Mas no que se refere à Europa...Muitos temores terão que ser acalmados, fantasmas precisarão ser exorcizados e lembranças amargas necessitarão ser esquecidas.

(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 27 de março de 1990)


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