Mediação
requer total isenção
Pedro J. Bondaczuk
As
tropas do Exército da Síria, cumprindo um mandado da Liga Árabe, de 1976, para
evitar massacres de refugiados palestinos em vários acampamentos no Sul de
Beirute, como os ocorridos nesse período em Tal Al-Zhatar e, em 1982, em Sabra
e Shatila, entraram no Líbano com a missão específica de pacificar essa
comunidade nacional. Na pior das hipóteses, a sua tarefa seria a de evitar o
agravamento dos confrontos entre as diversas milícias, que travam, entre si, um
desgastante e sangrento conflito há 14 anos.
Subentende-se,
portanto, que no seu papel de mediadoras, tais forças alienígenas tivessem
absoluta e irrestrita neutralidade, não protegendo e nem respaldando nenhuma
das facções. Nem mesmo as muçulmanas, até porque há várias delas no país.
No
entanto, não é isso o que está sendo observado agora, em Beirute, na nova fase
da guerra civil libanesa, cuja escalada teve início em 13 de março passado, com
a decisão do comandante cristão do Exército local, general Michel Aoun, de
lutar pela expulsão dos sírios da sua nação. Eles não somente passaram a
emprestar decisivo apoio aos seus simpatizantes dentro do Líbano, como a
participar ativamente dos combates, levando a luta a um grau de paroxismo
poucas vezes visto nos últimos anos, em algum lugar.
Barragens
de artilharia são disparadas, diariamente, contra outrora populosos bairros
residenciais, zonas comerciais, legações diplomáticas, logradouros públicos e
tudo o quanto é local, transformando essa extraordinária cidade em pouco mais
do que um monte de ruínas. Tornando-a uma pilha fumegante de escombros, onde
teimosos moradores resistem à insânia que se apossa dos chefões das poderosas
milícias.
Nessa
onda de mortes e destruição, que a cada dia que passa vai se tornando
virtualmente incontrolável, a ética passa a ser a última coisa a contar. Todo e
qualquer sentimento humanitário é deixado de lado, no afã da conquista de
palmos de terreno arrasado das mãos dos adversários.
Os
habitantes de Beirute, que não puderam, ou não quiseram, deixar a capital,
chegam a passar 15 ou mais horas seguidas em precários abrigos, com explosões e
incêndios por todos os lados, ouvindo, como pano de fundo, essa tétrica
"sinfonia" de insanidade e rancor da detonação de mísseis e do matraquear
de metralhadoras. Nem tempo para adquirir alimentos eles têm.
Além
do medo permanente e da incerteza da sobrevivência, podendo ser colhidos a
qualquer instante por um projétil assassino, são assolados agora pela fome.
Falta luz na cidade, já que navios tanques não conseguem descarregar, em seus
reservatórios, o óleo para movimentar as termelétricas. Há carência de água e
de todos os serviços públicos essenciais. E tudo isso por quê? Porque quem
recebeu a missão de pacificar o Líbano fracassou e resolveu tomar partido,
entrando na luta. E a comunidade internacional? Não vai fazer nada a respeito,
a não ser emitir inócuos comentários e ineficazes recriminações?!
(Artigo
publicado na página 16, Internacional, do Correio Popular, em 15 de agosto de
1989).
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