Confiar
é preciso
Pedro J. Bondaczuk
A
confiança é essencial para que qualquer espécie de relacionamento seja bem
sucedida e harmoniosa. Nos negócios, por exemplo, será uma tremenda roubada ter
por sócio alguém em quem não confiemos e que não confie em nós. Conflitos serão
inevitáveis e, por consequência, o fracasso da empresa também. O mesmo vale em
relacionamentos afetivos, tanto os de amizade, quanto os amorosos. Não posso,
ou não consigo, considerar determinada pessoa como minha amiga, se não tiver
irrestrita confiança nela. E vice-versa, claro. E nem estou levando em conta se
a desconfiança é fundamentada em fatos pregressos ou não. Se desconfiarmos de
alguém, portanto, ou se este desconfiar de nós, o melhor que podemos fazer é
cada qual ir para o seu canto e seguir seu próprio caminho sozinho.
Uma
infinidade de conflitos seria evitada se as pessoas agissem assim. Todavia...
não agem. Reitero, pois, com absoluta convicção, que a desconfiança é veneno
letal e fulminante em qualquer tipo de relacionamento, quer se trate de ligação
comercial, quer afetiva ou social. Não é fácil conviver com alguém e gostar
dessa pessoa se não confiarmos, sem restrições, nela. E vice-versa. Diria que é
impossível.
Não
há, portanto, amor ou amizade que resistam à desconfiança. É verdade que há
situações em que há motivos concretos, e, portanto, legítimos, para
desconfiarmos de alguém. O melhor que se pode fazer, nestes casos, insisto, é
cada qual seguir seu caminho, para evitar conflitos e ressentimentos. É
inconcebível entregar-se, de corpo e alma, a uma pessoa em quem não se confie.
O pior é quando não há motivos para desconfiança, quando esta for ditada pela
sua causa mais comum, mas mais grave e terrível: o ciúme. O filósofo grego
Epicuro de Samos, por volta do ano 250 antes de Cristo, já constatou essa verdade
e a trouxe à baila aos seus discípulos, ao afirmar: “A amizade acaba onde
começa a desconfiança”. E não tenham
dúvidas: acaba mesmo. Não só ela, como também qualquer outro tipo de
relacionamento: os profissionais, os sociais e, sobretudo, os afetivos, no caso
o amor;
O
pior tipo de desconfiança é aquele em que nós não confiamos em nós mesmos. Em
que não temos certeza da nossa capacidade, da nossa força, do nosso talento, do
nosso valor e vai por aí afora. E isso é muito mais comum do que o leitor possa
supor. Conheço várias pessoas nessa situação. Não acreditam em si mesmas,
titubeiam ao tomarem as decisões mais triviais e julgam-se inferiores a todos.
Há, em casos extremos, um desvio psicológico, conhecido como complexo de
inferioridade. É, no meu entender, o suprassumo da desconfiança. Quem é
desconfiado a esse ponto, está em constante conflito. Mas não com alguém de
quem possa se afastar. Está em guerra permanente com o próximo mais próximo que
se pode ter: consigo mesmo.
Nossas
mais profundas convicções têm sua veracidade de fato testada na prática. Muitas
vezes, iniciamos determinado empreendimento sob generalizada desconfiança e sob
críticas gerais. Aparentemente, nossas atitudes são erradas e tendem a nos
levar ao fracasso. Se confiarmos em nossa capacidade, se não a subestimarmos e
muito menos a superestimarmos, certamente não daremos a mínima às opiniões
negativas alheias. Podemos fracassar, sem dúvida, dando razão, dessa forma, aos
que desconfiavam de nós.
Todavia,
se o resultado final for bom, e não apenas para nós, mas para a coletividade,
nosso modo de pensar e de agir, de acordo com o que acreditamos sem reservas,
imediatamente será aceito por todos como sendo corretos e adequados. Só alguém
muito tolo, ou mal intencionado, continuará desconfiando da nossa capacidade
para levar a bom termo aquele empreendimento. E se fracassarmos? Bem, nesse
caso... de nada adiantará argumentarmos. O resultado é que irá contar. Não raro
fazemos tudo certinho, não omitimos nenhum detalhe e o que resulta daquilo que
fazemos revela-se nocivo e danoso. Por que? Vá se saber!
O
presidente norte-americano Abraham, Lincoln, polêmico por suas idéias e ações –
que levaram, inclusive, os Estados Unidos à única guerra civil de sua história
– afirmou, certa feita, em um de seus discursos: “Se o fim mostrar que estou
certo, o que se disse contra mim não valerá grande coisa. Se o fim mostrar que
estou errado, dez anjos jurando que eu estava certo não farão diferença”.. Ou
farão? Nestes casos, teimar nas convicções mal sucedidas será a mais completa
prova não só da nossa intransigência, mas de estúpida teimosia em se manter na
trilha do erro.
Cultivei
(e ainda cultivo) o hábito de confiar nas pessoas. A menos, claro, elas me dêem
motivo concreto, cristalino e ostensivo de desconfiança. Afinal, confiança não
deve ser confundida com ingenuidade. Há pessoas, todavia, que são condenadas
por seu passado. Mesmo estas podem se redimir. A prudência manda, no entanto,
que não nos arrisquemos. Arrisquei-me em várias ocasiões e me dei mal, ou,
usando uma expressão popular, “dei com os burros n’água” Não me arrependo de haver confiado em quem
não era confiável, pois o errado, no caso, não fui eu. Ademais, como diz
surrado clichê (que nem por isso é menos verdadeiro), “quem vê cara, não vê coração”.
Convivi
com um amigo que pagou preço proibitivo por sua aparência. Era pessoa
boníssima, que nunca fez mal nem mesmo a uma formiga, mas que, conforme opinião
generalizada, “tinha cara de bandido”. Sua chata (e injusta) situação inspirou
um dos meus contos que considero entre os melhores que já escrevi. Comeu o pão
que o diabo amassou. Chegou a ser preso, por estar nos arredores de uma casa em
que ocorrera um assalto. Empenhei-me por sua libertação, não só por falta de
provas, mas pela confiança que depositava nele. E meu amigo não a desmereceu.
No mesmo dia, o verdadeiro culpado foi preso, e confessou o delito, para sua
sorte, confirmando as palavras de Abraham Lincoln. Os fatos foram muito mais
convincentes, enfáticos e definitivos do que a generalizada desconfiança. O
trágico é que nem sempre isso acontece.
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