Falência das utopias
Pedro
J. Bondaczuk
A humanidade está
metida em uma encrenca sem tamanho que, se não for encontrada uma solução
exata, e imediata, tende a levar a espécie à extinção. Ouso dizer que se trata
da falência das utopias. E não se trata de nenhuma profecia ou de eventual
arroubo catastrofista da minha parte. Longe disso. Antes fosse. Trata-se de
pura projeção, baseada exclusivamente na lógica. O maior desafio do homem (ou
um dos maiores) é o de tornar perenes recursos que são limitados, e que, claro,
não se renovam.
A população mundial não
pára de crescer e as novas gerações estão ávidas por bens de consumo, não
importa se supérfluos ou essenciais. Não as condeno. Até porque, para complicar
tudo, é exatamente a produção desses tantos produtos que movimenta a economia,
que gera empregos e que possibilita que as pessoas tenham vida minimamente
digna. Qualquer quebra dela, ou redução, mesmo que não drástica, ou sua mera
estagnação, certamente tende a gerar desequilíbrios que, se profundos e
prolongados, desembocariam em descontentamentos e, em casos extremos, em
pavorosas e incontroláveis convulsões sociais.
Certamente ninguém quer
isso. Não só não quer, como não admite. Ocorre que para haver produção, e
continuamente em ascensão, se requer a utilização de matérias-primas
essenciais, isso é óbvio. E estas, se não são (ou se não foram em passado
recente) escassas, não são ilimitadas. Os estoques mundiais de boa parte delas
– temo que seja da maioria – estão se aproximando perigosamente do zero. É
certo que há a possibilidade de reciclagem de materiais, que por enquanto é
prática incipiente, mas que, no médio prazo, tende a se transformar em ação
indispensável para alimentar a indústria e manter a máquina da economia em
movimento, assegurando certa estabilidade social. Não há outra solução à vista.
Se com produção plena –
e não me refiro às regiões que passam por crises em suas economias, às voltas
com recessão e com sua perversa consequência, o desemprego – há tanto
descontentamento mundo afora, imaginem o que ocorreria se houvesse um colapso
econômico mundial! Se as grandes indústrias, por exemplo, tivessem que fechar
suas portas, por falta de matéria-prima para seu funcionamento. Haveria
demissões em massa. E as manifestações como as ocorridas no Egito, na Turquia,
na Ucrânia, no Brasil e em tantos outros lugares, motivadas exclusivamente por
razões políticas, já tão sangrentas, se multiplicariam em quantidade e em
intensidade. Seria o caos social absoluto e certamente não restrito a um
punhado de países ou regiões. Seria mundial. Poderia (ou poderá) representar o
colapso da civilização, tal como ela é hoje. É imperfeita? Sem dúvida. É
injusta? Está mais do que claro que é. Mas poderia, ou melhor, poderá ser
infinitamente pior.
A explosão populacional
que se acentuou por uma série de razões a partir da segunda metade do século
passado é encarada como problemática por pouquíssimas pessoas quando, de fato,
é o grande problema, o central e urgente, a requerer imediata solução. Até por
questão espacial. A Terra é um planeta relativamente pequeno, mesmo em nosso
Sistema Solar, de uma estrela de quinta grandeza. Ademais, quatro quintos de
sua superfície são ocupados por mares e oceanos. E esse um quinto restante é
capaz de abrigar sem, digamos, “aperto”, quantidade limitada de pessoas. A
quanto ascende esse limite? Não creio que alguém saiba com exatidão. Todavia,
se não foi ainda atingido, não deve estar muito distante disso.
Quando o inglês Thomas
Robert Malthus apresentou sua teoria acerca do crescimento da população, foi
contestado, tratado até com certo escárnio e nunca foi levado a sério. Cansei
de ler ensaios rebatendo sua percepção, rigorosamente lógica. Para refrescar a
memória do leitor, lembro que o eminente economista, considerado o “pai da
demografia”, constatou que, enquanto a população mundial cresce em progressão
geométrica, os recursos para a geração de alimentos para nutrir esse
contingente aumenta em progressão aritmética. Não é preciso ser nenhum
matemático para chegar à conclusão elementarmente lógica. Ou seja, a de que, em
determinado momento, haverá falta de comida para alimentar todo mundo. Riram
dele. Argumentaram que novas e modernas técnicas agrícolas garantiriam safras
para prover populações dez vezes maiores do que as de então do necessário.
Ocorre que “dona
cegonha” continua trazendo mais e mais gente para o Planeta, e não a cada dia,
mês ou ano, mas a cada minuto. O número de nascimentos diários ultrapassa,
invariavelmente, e em muito, o de mortes. Por conseqüência... a população não
pára de crescer. E a produção agrícola – que depende de uma série de fatores
aleatórios como o clima, que tende a se desregular mais e mais em decorrência
do aquecimento global – embora ainda suficiente para alimentar o dobro das
pessoas existentes, não evolui em idêntica proporção e velocidade. Qual a
conclusão lógica que se pode tirar? Creio que, até em respeito à inteligência
do leitor, não preciso externar qual é, não é mesmo?
O tema é muito amplo e
eu poderia citar inúmeros outros fatores que agravam a enorme encrenca em que a
humanidade está metida, mas não o farei. Não, pelo menos, por hoje. Apesar da
imensa maioria dos mais de sete bilhões de habitantes do Planeta ser
desinformada, pelo menos a esse propósito (o que é um paradoxo se levarmos em
conta os magníficos e miraculosos meios de comunicação ao nosso dispor hoje),
sinto certa angústia, indisfarçável desconsolo generalizado, um que de
crescente pessimismo pairando no ar. É provável que as pessoas intuam, mesmo
que sem saber, o risco que pesa sobre a humanidade, ou seja, real ameaça á
sobrevivência da espécie humana. Como estudioso das utopias, noto que, a partir
do século XIX, estas escassearam e praticamente desapareceram. O que há, em
profusão, é seu oposto, a distopia. Ou seja, projeções catastróficas para o
futuro, que se acentuam e se multiplicam.
Somos bombardeados, 24
horas por dia sem cessar, e em todos os veículos de comunicação, por notícias e
mais notícias ruins, como crimes, assaltos, roubos, estupros, traições, atos de
corrupção etc.etc.etc. Há tempos que não leio, não vejo e nem ouço nada de
positivo na mídia, e não importa se impressa, eletrônica ou qualquer outra,
Faça um teste você mesmo, paciente leitor. Acesse um site especializado em
notícias, qualquer deles. Acessou? Quantas informações referem-se a novas
descobertas, a atos de justiça, nobreza e bondade e vai por aí afora? Nenhuma,
não é mesmo? Idêntico exercício você pode fazer com a televisão, com o rádio ou
com o seu jornal favorito. O resultado será sempre igual.
Bem, não quero encerrar
estas reflexões, que me fazem mal, já que sou incorrigível otimista (todavia,
não sou alienado), de forma tão sombria. Para “adoçar” estas esparsas, mas
duras considerações, recorro a um dos meus poetas favoritos, Mauro Sampaio.
Dele, partilho com vocês este belíssimo poema, intitulado “Utopia”, que diz:
“Sinto
este mesmo e enorme desconsolo
que
fere os homens.
esta
mágoa que abafa as vozes
e
seca as lágrimas
Mesmo
assim
comovido
ergo os braços
na
certeza de tocar
as
estrelas imutáveis”.
Mas que a humanidade
está metida numa encrenca sem tamanho, não tenho como negar. Ou estou errado?
Tomara que esteja!!!!
No comments:
Post a Comment