Saturday, November 29, 2014

Aiatolás pecam pela retórica


Pedro J. Bondaczuk


A retórica dos aiatolás que dirigem o Irã, prometendo vinganças e retaliações contra todas as potências, a torto e a direito, dependendo do incidente em que o país se envolve, tem feito um grande estrago para a imagem iraniana, em nível de opinião pública mundial.

Mas se alguém se detiver para fazer uma análise serena das ações do governo, nestes quase nove anos de Revolução Islâmica, verá que, à exceção da guerra do Golfo Pérsico, onde, é lógico, o país precisa se defender e se empenhar para vencer o conflito (já dizia um pensador antigo, “ai dos vencidos”), os demais atos extremos, atribuídos a eles, não correspondem à realidade dos fatos. Eles têm sido mais vítimas de ações radicais dos outros do que possíveis agressores.

Por exemplo, além da morte dos 290 passageiros do Airbus A-300, abatido, insensatamente, no domingo, pelo cruzador “USS Vincennes”, os iranianos tiveram a lamentar, ainda, em julho do ano passado, aa perda de mais de 400 peregrinos, que foram a Meca, cumprir suas obrigações religiosas.

Até se admite que eles pudessem ter errado e provocado tumulto na cidade, naquela oportunidade. Mas o que nos parece ter sido excessivo, pelo trágico resultado, foi o modo de reprimir esses atos de caráter político. Para arruaceiros existem prisões.

Se a moda de matar quem se exalte, ou se exceda em manifestar sua opinião, pegar, o mundo estará perdido. Vão faltar sepulturas para tanta gente que será vitimada. Ademais, observe-se o seguinte detalhe: os iranianos retiveram, por 444 dias, 52 reféns norte-americanos. É óbvio que o ato de seqüestrar pessoas não pode ser justificado em nenhuma circunstância.

Mas ao longo de todo esse período (extenuando, é verdade, do ponto de vista psicológico), nenhum dos cativos morreu. Pelo contrário, todos foram repatriados, no dia da posse de Ronald Reagan na presidência dos Estados Unidos, em 20 de janeiro de 1981, sãos e salvos.

Houve relatos de ex-prisioneiros que se internaram em hospitais, com problemas psíquicos e outros chiliques de quem sempre teve tudo o que quis e que não suporta período algum de privações. Mas ninguém perdeu a vida por causa disso.

O Irã foi acusado de ser mentor de seqüestros de aviões e de cidadãos depois disso. De estar por trás do ataque suicida contra o quartel das forças norte-americanas em Beirute, que redundou na morte de mais de 200 soldados. E de outras tantas atrocidades, sem que ninguém jamais provasse a sua participação nesses atos.

Mas, em momento algum sua polícia trucidou quatro centenas de estrangeiros, como ocorreu na Arábia Saudita. E nem sua artilharia abateu qualquer avião comercial de passageiros, nem do seu mais radical inimigo, o Iraque. Os aiatolás, portanto, que nunca mostraram radicalismo exacerbado nas suas ações, precisam aprender, com urgência, a policiar aquilo que dizem.

(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 7 de julho de 1988).


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