Sunday, November 09, 2014

Busca de remédio para um mal recorrente

Pedro J. Bondaczuk

A violência urbana é, ao contrário do que muitos pensam, fenômeno recorrente. Não é exclusivo dos tempos que vivemos. Basta ler, atentamente, jornais antigos, nas coleções que podem ser encontradas em boas bibliotecas públicas, para constatar essa verdade. Ou ler, por exemplo, contos e romances de duas ou de três décadas atrás ou, mesmo, livros escritos há mais de um século, para perceber que a violência, que é inerente ao homem, sempre esteve presente, com maior ou com menor intensidade. Afinal, os escritores são os verdadeiros guardiões e testemunhas dos usos, costumes e do comportamento social do seu tempo.

Cá pra nós, era de se esperar que a criminalidade aumentasse, como aumentou, até mesmo em decorrência do explosivo crescimento populacional. E isso vale para todas as partes do mundo. Em alguns países, ela refluiu ou manteve-se constante, em decorrência de medidas inteligentes e eficazes, sobretudo de prevenção de suas autoridades. Mas eles são exceções. Há 44 anos, por exemplo, o Brasil tinha 90 milhões de habitantes. Hoje, tem 250% a mais de pessoas, ou seja, mais de 200 milhões. Municípios que há não muito eram tranqüilos e pacatos burgos interioranos, hoje se transformaram em populosas e agitadas metrópoles, com as vantagens (poucas) e as tantas desvantagens da acelerada urbanização. E, entre estas, óbvio, está a violência urbana.

Vários fatores podem ser apontados como possíveis e prováveis causas desse explosivo aumento de assassinatos, seqüestros-relâmpagos, furtos, roubos etc. em nossas cidades. E hoje, essa violência, que produz justificável  clima de insegurança generalizada nos cidadãos, não se restringe, insisto, mais, apenas, às populosas metrópoles. Comunidades de porte médio, outrora pacíficas e aprazíveis, estão sendo afetadas por ela, para desespero geral. E até os pequenos vilarejos já convivem com o nefasto fenômeno. Talvez a acelerada e caótica migração de pessoas do campo para as cidades seja uma das grandes causas disso, posto que, certamente, não a principal.

Até meados dos anos 40 do século passado, o Brasil era um país eminentemente rural. A maior parte de sua população vivia no campo. Hoje, 85% ou mais vive em cidades, onde as oportunidades – posto que nem sempre (ou nunca) as sonhadas – são, ainda assim, muito maiores. Alguns desses migrantes, bem ou mal, adaptaram-se às novas condições e prosperaram. Outros tantos, porém... se perderam. Marginalizaram-se e descambaram para o outro lado da lei. Uma das principais causas da violência urbana, todavia, é o tráfico e o consumo de drogas, que aumentaram assustadoramente de uns quarenta anos para cá. Até os anos 70 do século passado esse flagelo existia, mas não com a gravidade de hoje.

Tomo como parâmetro uma cidade de porte médio, no caso Campinas. Há somente quarenta anos, sua população girava ao redor dos 600 mil habitantes. As ocorrências policiais eram relativamente escassas. Homicídios, então, eram raridades. Quando ocorria algum, o assunto ganhava manchetes e era abordado durante semanas, quando não meses, por se tratar de acontecimento raríssimo. As pessoas ficavam chocadas e o episódio era tema de conversas e comentários por toda a parte. E hoje, o que acontece? Crimes de morte, em geral, merecem somente breves registros. E olhem lá! Às vezes, nem isso, de tão comuns que se tornaram. Há tempos deixaram de ser novidade. Tempos atrás, o aumento da criminalidade era atribuído, exclusivamente, à crise social do País. Mas o Brasil, embora não seja uma Suíça ou uma Suécia, evoluiu muito nesse aspecto. Milhões de pessoas ascenderam de classe e outras tantas deixaram, pelo menos, a vergonhosa e injusta linha da miséria, com novas e promissoras perspectivas de vida. Mas a violência urbana diminuiu? Não, não e não!!! Aumentou, e exponencialmente.

Não se pode negar que a má distribuição de renda ainda se constitui num dos fatores determinantes da criminalidade. Mas não é o único. Na região de Campinas, cidade que em 40 anos viu dobrada sua população e tem hoje mais de 1,2 milhão de habitantes, a violência começou a se multiplicar após o exagerado aumento das migrações. A cidade, dada sua riqueza, se tornou pólo natural de atração de trabalhadores do Brasil inteiro, em busca de oportunidades. Com eles, porém, vieram também pessoas que nunca gostaram de trabalhar. E deu no que deu. Seria mera coincidência? Quem sabe?!

Para reverter esse quadro de insegurança, que ameaça a integridade física e o patrimônio dos cidadãos – senão a curto, pelo menos em médio prazo – é necessária mobilização geral, no sentido de se detectar as reais causas desse fenômeno (que são várias e complexas), e de se estabelecer estratégias de prevenção. As várias campanhas de desarmamento, por exemplo, não impediram o aumento da violência urbana. Todavia, se não se desarmasse a população o que aconteceria? Estou plenamente convicto que seria muitíssimo maior do que já é.. Só isso, no entanto, como se vê, não bastou e não basta. Faz-se indispensável ação mais firme e constante das autoridades, apurando e localizando os principais focos de criminalidade e combatendo sem tréguas quadrilhas de traficantes e de assaltantes, responsáveis pela maioria dos delitos cometidos.

Mas que não se caia no erro de buscar soluções à margem da lei. Que não se combata a violência com outra maior. Seria erro gravíssimo optar por esse caminho, que sempre que foi trilhado, trouxe trágicas e dolorosas conseqüências às comunidades envolvidas, como ilustram os episódios da Favela Naval de Diadema ou da Cidade de Deus no Rio, entre outros. A criação de sistemas de "disque-denúncia" é outra das muitas idéias úteis, desde que não exponham a risco os que queiram colaborar com a polícia. Outra providência seria a adoção de policiamento ostensivo freqüente, constante, se possível diário, com policiais fardados nas ruas e nos logradouros públicos de maior movimento, para inibir a prática de crimes e dar ao cidadão a segurança que ele merece e pela qual paga.

Ao mesmo tempo, compete aos meios de comunicação a tarefa de esclarecimento, além daquela que vêm exercendo tão bem: a da denúncia e da cobrança. Simultaneamente, requer-se um programa eficaz de assistência social, que ampare os desempregados e recupere os viciados em drogas (entre as quais o álcool) e encaminhe para as escolas  meninos e meninas de rua, livrando essas crianças da marginalidade e do crime. Trata-se, como se vê, de tarefa de toda a comunidade, que não pode permanecer passiva, ilhada ou aterrorizada, esperando que a solução caia do céu, que surja do nada, como em um passe de mágica. Certamente, não surgirá.


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