Profissionais da
solidão
Pedro
J. Bondaczuk
A atividade de escritor
– antiqüíssima, cuja origem se perde nas brumas do tempo e coincide com a
invenção da primeira forma de escrita – é das mais peculiares em todos os
sentidos. Esse indispensável (óbvio) agente literário pode ser classificado,
entre tantas e outras classificações, como “profissional da solidão”. Sequer é
necessário justificar a designação. Trata-se de atividade rigorosamente
individual (embora haja muitos livros escritos em parceria, a quatro mãos, que
são, no entanto, relativamente raros). O escritor, em seu momento decisivo, o
da produção de sua obra, é um sujeito solitário. Tem que ser. O ato de escrever
requer solidão, e quanto maior, melhor. Ademais, esta condição, em outro
sentido, mais amplo, é um dos seus temas preferenciais, quer em verso, quer em
prosa.
“Profissionais da
solidão” é, porém, o título do livro de uma escritora multitarefa, de vários
talentos cuja designação metafórica de “artista dos sete instrumentos” não é
exagerada e lhe cabe como uma luva, acaba de lançar, pela Editora Senac de São
Paulo. Refiro-me a Cecília Prada que é, entre outras coisas, ficcionista,
dramaturga, historiadora, professora, tradutora, ex-diplomata de carreira e...
jornalista. E que jornalista!!! Para que o leitor tenha uma idéia de sua
competência nessa função, basta dizer que conquistou o maior prêmio existente
no jornalismo brasileiro, o “Esso” de 1980, o que é privilégio de poucos,
pouquíssimos profissionais de comunicação. O tema que lhe valeu esse
reconhecimento público foi uma série de reportagens, publicada no jornal
paulista “Folha de S. Paulo”, intitulada “Menores do Brasil: a loucura nua”,
sobre menores internados em instituições psiquiátricas.
Escrever sobre Cecília
Prada é tarefa complicada, notadamente para novatos ou para redatores
desatentos. Mas e complicação não decorre do fato dela ser, eventualmente,
dessas intelectuais “difíceis”, temperamentais ou coisa que o valha. Aliás,
muito pelo contrário. A dificuldade está em retratá-la exatamente como ela é,
em todas as atividades que exerce ou que exerceu, tantas que são elas (e em
todas, com inegável competência e sucesso). Corre-se o risco de, ao esboçar seu
perfil, omitir algum detalhe relevante que a torne, aos olhos do leitor, menor
do que de fato é. Admiro-a, há tempos, como admiro todos os vencedores. E
Cecília é vencedora.
Não a conheço
pessoalmente, mas tenho dela as melhores referências. Tive a oportunidade de
conhecê-la pessoalmente, quando do lançamento do seu livro “Profissionais da
solidão” em Campinas, aqui no Senac da cidade, ocorrido em 13 de setembro de
2013 (ontem). Fui convidado para a noite de autógrafos, no entanto, o convite
chegou-me às mãos muito em cima da hora. Não consegui adiar compromissos
anteriormente agendados exatamente para esse dia (ou melhor, para essa noite) e
perdi a oportunidade de expressar, de viva voz, a Cecília Prada, o quanto a
admiro e o quanto respeito sua brilhante trajetória.
Claro que recomendo,
sem pestanejar, seu livro. Como é hábito meu, ao tratar de lançamentos, não
farei nenhuma sinopse da obra, até para não tirar do leitor o prazer da
descoberta. A única pista que me permito fornecer-lhe é o texto utilizado pela
própria editora para divulgar a obra: “Em Profissionais da solidão, Cecíçia
Prada reuniu artigos sobre Mário de Andrade, João Guimarães Rosa, Cecília
Meirelles, Lúcio Cardoso, Euclides da Cunha, Adalgisa Nery, Gilka Machado,
Joaquim Nabuco, João Cabral de Melo Neto, Clarice Lispector, José Lins do Rego,
Oswald de Andrade, Marcos Rey, Vinícius de Moraes, Hilda Hilst, Caio Fernando
Abreu, Nelson Rodrigues, Lima Barreto, Pedro Nava, Qorpo-Santo, Graciliano
Ramos, Antonio Carlos Villaça e Maura Lopes Cançado, abrindo um horizonte
literário para todos os apaixonados por literatura”.
Como se vê, guardadas
as devidas proporções, Cecília Prada reúne em livro o que venho fazendo há
muito tempo neste espaço, posto que não com a mesma propriedade e idêntico
talento que essa consagrada autora. Ou seja, trazendo à baila aspectos
pitorescos e inusitados da vida e do estilo desses tantos “profissionais da
solidão” que o Brasil produz. Faço questão absoluta de conhecê-la pessoalmente.
Creio que não faltarão oportunidades para tal, porquanto descobri que essa
intelectual multitarefa, nascida na vizinha Bragança Paulista (em 1929) reside
aqui, pertinho de mim, na minha cidade, nesta Campinas magnífica e acolhedora.
“Profissionais da
solidão” é seu sétimo livro, e o segundo de não ficção. O anterior é “Entre o
itinerário e o desejo”, de crônicas, lançado em 2012. As outras cinco obras são
todas ficcionais, a saber: “Ponto morto” (1955 – Edigraf São Paulo), “Caos na
sala de jantar” (1978, Editora Moderna), “Estudos de interiores para uma
arquitetura da solidão” (2004, Editora DBA), “O país dos homens de gelo” (2007,
Editora Atlanta) e “Faróis estrábicos na noite” (2009, Editora Bertrand
Brasil).
Tenho em comum com
Cecília Prada, além do exercício do jornalismo (também ganhei um Prêmio Esso,
mas coletivo, integrando equipe de Redação do Correio Popular) sua predileção
pelo conto. Em termos de visibilidade (e, sobretudo, de criatividade) não há
termos de comparação entre nós. Afinal, seus contos figuram em várias
antologias, nacionais e estrangeiras, ao contrário dos meus. Descobri também
que, em 1994, ano em que o Brasil foi país-tema na Feira Internacional de
Livros de Frankfurt, na Alemanha, seu conto “La Pietá”, traduzido por Kurt
Meyer-Clason, foi escolhido para inaugurar o evento, sendo lido em toda a rede
de rádio germânica. Voltarei, certamente,
a tratar dessa intelectual, que merece, sobretudo, todo o carinho e admiração
dos amantes da boa literatura.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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