Florença foi o berço da
ópera
Pedro
J. Bondaczuk
A ópera, conforme pude
apurar em minhas pesquisas, “nasceu” na Península Itálica, em fins do século
XVI. Surgiu como tentativa de restauração da tragédia, nascida na Grécia
Antiga, e que estava em decadência. Contudo, ao contrário dos gregos antigos,
os criadores desse novo gênero – que pode ser classificado como “híbrido”,
misto de música e de teatro – se propunham a narrar, também, dramas intensos,
mas com auxílio e suporte de uma arte que os italianos eram grandes cultores e
peritos, com artistas dos mais talentosos e criativos: a música.
A idéia era que, as
peripécias de heróis e bandidos, santos e vilões, nobres e párias sociais, que
na tragédia grega eram “recitados” pelos atores – embora algumas peças
contassem com o suporte de coros – no novo gênero fossem todas “cantadas” Era
um grande desafio que podia dar certo ou não. Qual seria a reação do público
diante dessa inovação? Aceitaria? Repudiaria? Ficaria indiferente? E os
cantores, saberiam, simultaneamente, além de interpretar musicalmente as
composições, representar, com um mínimo de verossimilhança? Era caso de se
tentar. E se tentou de fato.
A Península Itálica,
destaque-se, vivia, na ocasião, genuína revolução cultural. Em todas as artes
despontavam talentos excepcionais, que viriam a marcar seus nomes na história
artística não somente da Europa, mas do mundo ocidental. Politicamente, porém,
o panorama era outro. Não existia uma Itália como hoje conhecemos. A exemplo do
que ocorria com os povos germânicos, os italianos estavam dispersos em pequenos
ducados, em principados, em reinos e em cidades-Estado. A unificação apenas
ocorreria em meados do século XIX.
Muitos dos territórios
que viriam a constituir a atual Itália estavam sob domínio de grandes
potências, como França e Áustria, e constantemente mudavam de mãos, ao sabor de
freqüentes, imensas e sangrentas batalhas. Algumas cidades gozavam de precária
independência política, frequentemente ameaçadas pela cobiça de reis, que
ambicionavam anexá-las aos respectivos territórios. Entre essas comunidades
autônomas, uma se destacava, por seus intelectuais e artistas e pelas
magníficas obras que produziam: Florença (Firenze, em italiano).
E foram os florentinos
os criadores da ópera (ou, pelo menos, são considerados como tal). O gênero
“nasceu” (conforme pude apurar em várias fontes), na casa de ilustre família
local, que viria a produzir, um dos “cientistas” rebeldes mais notáveis, o
gênio que revolucionou a Astronomia, Galileo Galilei Galileu. Seu pai, Vicenzo,
era filólogo. E coube-lhe o privilégio de “batizar” o novo gênero que surgia, a
que chamou, inicialmente, de “opera in musica”, ou seja, “peça musical”. Anos
depois, esse nome foi abreviado para a forma com que é conhecido até hoje.
A primeira ópera
composta, “Dafne”, é impossível de ser reconstituía (justo ela!!!). Suas
partituras se perderam e nunca mais foram encontradas. É possível que estejam
em poder de algum colecionador inconsciente que se recuse a partilhá-la com o
mundo ou que sequer saiba o valor artístico e principalmente histórico dessa
peça. Pode ser, também, que tenha sido destruída por algum idiota ignorante. Vá
se saber! O fato é que se sabe que ela existiu (porquanto foi representada e há
registros a propósito), mas se desconhece (infelizmente) seu conteúdo musical.
Essa ópera sumida e
nunca encontrada foi composta por uma dupla: Iacopo Peri, que criou a
partitura, e Ottavio Rinuccini, autor do respectivo libreto. Este último foi
conservado para a posteridade e encontra-se em um museu em Florença. Já a
música... Quem ouviu, ouviu, quem não ouviu, provavelmente não ouvirá jamais. A
menos que... a menos que as desaparecidas partituras, sumidas há quase quatro
séculos, venham a ser localizadas, o que não é nada provável.
A apresentação inicial
da ópera “Dafne” ocorreu em fevereiro de 1597 (o dia exato não consegui
apurar), no Teatro de Florença. Foi uma sensação! Durante muito tempo, não se
falou em outra coisa na cidade, se não nessa novidade artística. Animada com o
sucesso e com a tão bem sucedida experiência, a mesma dupla de autores resolveu
trabalhar em uma segunda composição. Levou três anos para concluí-la. Tratou-se
da ópera “Eurídice”, esta sim intacta, quer na partitura, quer no libreto, que
volta e meia é levada aos principais palcos da Europa, com o mesmo sucesso
original. Sua estréia, também em Florença, deu-se em 6 de outubro de 1600. Para
muitos historiadores musicais, esta data é considerada o “marco zero” de fato,
a data tida como “de nascimento” do novo gênero, que consagrou centenas de
compositores geniais, e não somente italianos, mas alemães, franceses,
austríacos (e o brasileiro Carlos Gomes)
Europa afora. A partir daí, a ópera se arraigou, se desenvolveu, se aperfeiçoou
e... se consagrou.
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