Paz ainda é miragem na América
Central
Pedro J. Bondaczuk
A América Central sempre foi tida e havida, desde
meados do século passado, como o "quintal" dos fundos dos Estados
Unidos. Ou seja, como uma espécie de continuação do império norte-americano; caracterizado
não como o britânico que se desfez, mediante ocupação colonial direta, mas pela
"influência" político-militar e pela absoluta dependência econômica.
Falou-se muito, em fevereiro do ano passado, numa
paz centro-americana, especialmente após a surpreendente vitória de Violeta de
Barrios Chamorro na Nicarágua, que derrotou nas urnas o sandinista Daniel
Ortega. Praticamente todos os países da região renovaram seus presidentes não
mais por golpes militares de Estado, como sempre acontecia, mas pelo voto
direto.
Dessa forma, Rafael Callejas passou a governar o
Equador; Rafael Calderón assumiu o poder na Costa Rica; Alfredo Cristiani
entrou no segundo ano de mandato em El Salvador e para completar esse quadro,
Jorge Serrano Elias ganhou o segundo turno das eleições na Guatemala, no início
de janeiro passado, e tomou posse no dia 31 desse mês.
Se o leitor atentar bem, porém, para quem são os
novos presidentes, perceberá que todos, sem exceção, representam uma elite
política, uma oligarquia cristalizada centro-americana, que nada têm de novo a
apresentar. Aparentemente, a região respira paz e democracia como nunca antes.
As aparências, todavia, sempre foram enganadoras e neste caso não se foge à
regra. A América Central está muito longe da pacificação.
As economias dos cinco países da área estão
literalmente arrasadas. As dificuldades econômicas, por sua vez, tendem a
acentuar os já profundos desníveis sociais, numa zona do mundo caracterizada
por um concentracionismo de renda imenso.
Crescem os contingentes de miseráveis, de
marginalizados, de deserdados. Em El Salvador, por exemplo, somente 21 famílias
detêm mais de 70% da renda nacional. Não é de se estranhar, portanto, que
esteja tão distante o fim da guerra civil salvadorenha, responsável por mais de
70 mil mortes desde outubro de 1979.
Não será jamais pelas armas que os guerrilheiros
serão vencidos, mas mediante uma mudança nas perversas estruturas que
predominam ali, tornando a cidadania virtualmente escrava de uma elite
insensível.
Por trás da aparente tranqüilidade que se verifica
na América Central, há enormes tensões, como que preparando a erupção de um
poderoso vulcão --- dos quais a região é farta, por sinal. A guerrilha segue
agindo na Guatemala. Em Honduras, há manifestações de violência, embora
esporádicas. Na Nicarágua, o processo de devolução de terras expropriadas
durante a reforma agrária sandinista coloca o campo em pé de guerra.
Na Costa Rica pacífica, o desemprego angustia as
famílias e causa descontentamentos. Isto para não mencionar El Salvador, onde a
Frente Farabundo Marti de Libertação Nacional ainda dá as cartas. Por isso,
como não se reformaram as estruturas, a região permanecerá por muito tempo ---
não se pode prever quanto --- sendo uma das zonas de maior conflito em todo o
mundo.
(Artigo publicado na página 21, Internacional, do
Correio Popular, em 17 de março de 1991).
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