Thursday, September 19, 2013

Paz ainda é miragem na América Central


Pedro J. Bondaczuk


A América Central sempre foi tida e havida, desde meados do século passado, como o "quintal" dos fundos dos Estados Unidos. Ou seja, como uma espécie de continuação do império norte-americano; caracterizado não como o britânico que se desfez, mediante ocupação colonial direta, mas pela "influência" político-militar e pela absoluta dependência econômica.

Falou-se muito, em fevereiro do ano passado, numa paz centro-americana, especialmente após a surpreendente vitória de Violeta de Barrios Chamorro na Nicarágua, que derrotou nas urnas o sandinista Daniel Ortega. Praticamente todos os países da região renovaram seus presidentes não mais por golpes militares de Estado, como sempre acontecia, mas pelo voto direto.

Dessa forma, Rafael Callejas passou a governar o Equador; Rafael Calderón assumiu o poder na Costa Rica; Alfredo Cristiani entrou no segundo ano de mandato em El Salvador e para completar esse quadro, Jorge Serrano Elias ganhou o segundo turno das eleições na Guatemala, no início de janeiro passado, e tomou posse no dia 31 desse mês.

Se o leitor atentar bem, porém, para quem são os novos presidentes, perceberá que todos, sem exceção, representam uma elite política, uma oligarquia cristalizada centro-americana, que nada têm de novo a apresentar. Aparentemente, a região respira paz e democracia como nunca antes. As aparências, todavia, sempre foram enganadoras e neste caso não se foge à regra. A América Central está muito longe da pacificação.

As economias dos cinco países da área estão literalmente arrasadas. As dificuldades econômicas, por sua vez, tendem a acentuar os já profundos desníveis sociais, numa zona do mundo caracterizada por um concentracionismo de renda imenso.

Crescem os contingentes de miseráveis, de marginalizados, de deserdados. Em El Salvador, por exemplo, somente 21 famílias detêm mais de 70% da renda nacional. Não é de se estranhar, portanto, que esteja tão distante o fim da guerra civil salvadorenha, responsável por mais de 70 mil mortes desde outubro de 1979.

Não será jamais pelas armas que os guerrilheiros serão vencidos, mas mediante uma mudança nas perversas estruturas que predominam ali, tornando a cidadania virtualmente escrava de uma elite insensível.

Por trás da aparente tranqüilidade que se verifica na América Central, há enormes tensões, como que preparando a erupção de um poderoso vulcão --- dos quais a região é farta, por sinal. A guerrilha segue agindo na Guatemala. Em Honduras, há manifestações de violência, embora esporádicas. Na Nicarágua, o processo de devolução de terras expropriadas durante a reforma agrária sandinista coloca o campo em pé de guerra.

Na Costa Rica pacífica, o desemprego angustia as famílias e causa descontentamentos. Isto para não mencionar El Salvador, onde a Frente Farabundo Marti de Libertação Nacional ainda dá as cartas. Por isso, como não se reformaram as estruturas, a região permanecerá por muito tempo --- não se pode prever quanto --- sendo uma das zonas de maior conflito em todo o mundo.

(Artigo publicado na página 21, Internacional, do Correio Popular, em 17 de março de 1991).


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