Separatismo beneficia só
russos
Pedro J. Bondaczuk
As Repúblicas separatistas na
União Soviética, neste período de exacerbação nacionalista em
decorrência da frustrada tentativa de golpe contra o presidente
Mikhail Gorbachev, ainda não se deram conta da sua não viabilidade,
pelo menos a médio prazo, como sociedades nacionais independentes.
Mesmo a Ucrânia, com área de
603.700 quilômetros quadrados e uma população de 51,7 milhões de
habitantes, a despeito de ser uma espécie de celeiro alimentar do
país, é carente de muitíssimas coisas. Unidos numa federação,
tais Estados beneficiam-se da riqueza da Rússia. A rigor, fazendo-se
uma análise criteriosa dos números disponíveis, os russos seriam
os únicos beneficiados com a extinção da URSS.
Guardadas as devidas
proporções, esse Estado soviético tem o papel que São Paulo
representa em termos brasileiros. É o principal pilar de sustentação
da nação em todo e qualquer aspecto, político, econômico,
cultural, esportivo e militar. Pode-se afirmar, sem riscos de
descambar para o exagero, que a Federação Russa, com seus 17,1
quilômetros quadrados (duas vezes o território do Brasil) e seus
147 milhões de habitantes, sustenta a União Soviética às custas
do bem estar de seu próprio povo.
Ali são produzidos, por
exemplo, 91% do petróleo do país, que é o maior produtor do mundo.
Na atualidade, o produto é simplesmente transferido para as outras
Repúblicas, de graça, sem nenhum pagamento. E quando os
separatistas tiverem que pagar pela matéria-prima, em dólares, aos
preços de mercado? Onde arranjarão recursos?
Uma coisa ficou claríssima
nesse movimento secessionista. Os líderes nacionalistas estão
seguros de que o Ocidente irá despejar toneladas de dólares em suas
economias. Afinal, raciocinam, para quem interessa a desagregação
do império soviético senão às ricas potências ocidentais? Nada,
porém, é mais equivocado do que isso. Eles deveriam olhar e tomar
como exemplo o que ocorre atualmente bem na sua vizinhança.
Os países do Leste europeu,
notadamente Polônia, Hungria, Checoslováquia e Bulgária,
abandonaram o comunismo e aderiram ao mercado livre. Todavia, não se
sabe de nenhuma grande corrida dos grandes capitalistas estrangeiros
para investirem ali. Muito pelo contrário.
Ressalte-se que, mesmo
enquanto comunistas, as economias dessas nações eram muito mais
saudáveis e equilibradas do que a soviética. Os separatistas
lembram o caso daqueles filhos adolescentes rebeldes, que embora
sustentados pelos pais, não querem se submeter à sua autoridade.
Sem preparo profissional para
enfrentar a vida, resolvem sair de casa e sofrem o diabo. Os
secessionistas, sem que percebam, não estão lançando base alguma
para o futuro. Estão implantando o terceiromundismo em plena Europa.
Enquanto no restante do continente a tendência é a de aglutinação
em blocos, como é o caso da Comunidade Européia, no Leste ocorre o
inverso, a fragmentação, que também se verifica, e de forma mais
dramática, posto que sangrenta, na Iugoslávia.
Outro problema grave, que terá
de ser equacionado se a desagregação soviética se concretizar, o
que, por mais paradoxal que pareça diante dos últimos
acontecimentos, é improvável, é quanto à reação dos russos
étnicos que vivem em outras Repúblicas.
Tais pessoas estariam
dispostas a embarcar nessa aventura? Elas são, hoje, mais de 16
milhões, distribuídas da seguinte maneira: 21,1% na Ucrânia; 11,9%
na Bielorrússia; 10,8% no Uzbequistão; 36% no Kazaquistão; 7,4% na
Geórgia; 7,9% no Azerbaijão; 8,6% na Lituânia; 12,8% na Moldávia;
32,8% na Letônia; 22% na Kirghizia; 10,4% no Tadjiquistão; 11,6% no
Turkmenistão e 27,9% na Estônia.
Caso não precise sustentar o
restante do país, a Rússia, certamente, assumirá sua vocação
para superpotência. Perderá somente 10% do Produto Nacional Bruto
com a desagregação, mas deixará de ter de alimentar quase 140
milhões de bocas, elevando, vertiginosamente, sua renda per capita e
herdando, de quebra, 27 mil ogivas nucleares das 30 mil da União
Soviética. Por isso, talvez Bóris Yeltsin não esteja se empenhando
para preservar a federação.
(Artigo publicado na página
16, Internacional, do Correio Popular, em 30 de agosto de 1991).
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