Pomadinha antiinflacionária
Pedro J. Bondaczuk
O ministro
da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, na tentativa de levar uma
mensagem otimista à sociedade, num período de tanto descrédito e
pessimismo, tem feito pronunciamentos usando figuras de linguagem até
pitorescas. Na semana passada, ao criticar os que pressionam o
governo para que imponha um congelamento de preços e de salários,
afirmou que o brasileiro é “esquizofrênico”.
Nesta
segunda-feira, resolveu imitar o ex-ministro do Trabalho, Antonio
Rogério Magri, e criou um neologismo. Disse que “a inflação
brasileira não é mais convivível, virou uma urticária e é
preciso parar de coçar e acabar com ela”.
Realmente,
não há na História recente nenhum povo que tenha convivido por
tantos anos consecutivos com este flagelo, e em níveis tão
elevados, como ocorre com nossa população. Fernando Henrique
ressaltou bem, no discurso que pronunciou para 300 banqueiros e
seguradores, no Rio, durante a entrega do prêmio “Bem-Sucedidos no
Mercado de Capitais”, que há por aí “pomadinhas” para acalmar
essa coceira (e como coça!), que não são suficientes para
solucionar o problema.
A
luta contra a inflação, de forma consistente, passa,
necessariamente, pela independência do Banco Central. Ele deve ser
absolutamente livre para definir, sem qualquer espécie de
interferência, a política monetária do País. Não será eficaz,
por outro lado, a estratégia que não cortar as despesas do Estado a
um mínimo indispensável. E essa cirurgia deve ir muito além das
gorduras, que sequer deveriam existir.
Precisa
aprofundar-se até mesmo na carne, ou mais fundo, em alguns órgãos
chegando até o osso ou mesmo à amputação. Nesse contexto,
torna-se imprescindível o enxugamento da máquina estatal, de forma
a que ela não absorva em salários os eventuais aumentos de
arrecadação, como vem ocorrendo até agora, fato admitido pelo
próprio ministro.
O
processo de privatização, com toda a celeuma que gera, dada a
exploração demagógica feita em torno dele por pessoas leigas em
economia, mas especializadas em retórica bombástica, mas vazia,
tem, não somente que continuar, mas sobretudo se aprofundar, ser
mais rápido, mais eficiente, mais competente para se tornar, por
conseqüência, menos polêmico. Requer absoluta transparência e
regras consensuais, claramente definidas.
O
Estado brasileiro, finalmente, deve se conscientizar de que não lhe
cabe o papel de empresário, mas uma função muito mais nobre e
indispensável. Cumpridos esses pressupostos, a sociedade,
certamente, vestirá a camisa na luta contra a inflação.
Uma
das tarefas que os agentes econômicos poderiam, e deveriam fazer,
era a de aumentar a produção. De investir na economia de escala, o
que se refletiria na redução de preços, no aumento do faturamento
e, conseqüentemente, de arrecadação.
Para
tanto, porém, seria necessário que o governo gozasse de
credibilidade, o que não ocorre por uma série de razões
sobejamente conhecidas por todos. Outro fator indispensável para que
esta inteligente estratégia de combate inflacionário desse certo
seria o aumento do poder de compra dos salários.
E
aí surge uma questão semelhante à pergunta “quem surgiu antes, o
ovo ou a galinha?”. Ou seja, o que deve ser feito em primeiro
lugar: deter a inflação ou valorizar a renda da população? Enfim,
há uma série de caminhos alternativos para vencer esta disfunção
econômica que não seja o do desgastado expediente do choque, do
congelamento ou do confisco monetário, que são as “pomadinhas”
aludidas por Fernando Henrique Cardoso.
(Artigo publicado na página
2, Opinião, do Correio Popular, em 18 de agosto de 1993).
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