Sangue novo para tentar salvar
a URSS
Pedro J. Bondaczuk
O líder soviético, Mikhail
Gorbachev, deu, ontem, uma "virada de mesa" e afastou dos
altos cargos da burocracia do Partido Comunista do seu país vários
funcionários que se opõem às reformas econômicas, políticas e
sociais que ele pretende empreender, conhecidas como "glasnost"
e "perestroika". O dirigente, dias atrás, após o término
das suas férias de verão, esteve realizando um giro pela Sibéria.
Ali, ouviu toda a sorte de
queixas, de parte dos trabalhadores e do povo nas ruas, acerca do seu
projeto reformista. Foi então que pôde sentir de perto o que os
soviéticos pensam da sua gestão, sem a indefectível filtragem de
opiniões feita por bajuladores, que fazem qualquer coisa para
agradar o chefe e que no afã de "puxarem o saco" do
mandão, acabam por prejudicar quem deseja conhecer a realidade.
Por isso, Gorbachev convocou,
às pressas, uma reunião plenária do Comitê Central do PC e do
Soviete Supremo, o Parlamento nominal do país. Aliás, a convocação
foi tão intempestiva, que até levou o chanceler, Eduard
Shevardnadze, a cancelar importantes compromissos em Nova York, onde
participava da Assembléia Geral das Nações Unidas, e regressar
correndo a Moscou.
Especulou-se, naquele momento,
que os soviéticos iriam suspender a sua retirada do Afeganistão.
Pode até ser que o façam, mas agora se vê que a razão de um
chamado tão urgente do ministro não foi esta. O líder, em primeiro
lugar, resolveu fazer uma "limpeza" entre os que são
refratários à sua reforma.
O expurgo começou pelo
Politburo, com a renúncia do veteraníssimo Andrei Gromyko, que a
qualquer momento poderá abdicar também da presidência do país
(abrindo caminho para o projeto de tornar esse cargo o mais forte na
hierarquia do poder e cujos integrantes seriam eleitos diretamente) e
pela remoção de três outros altos funcionários. Mas não parou
por aí. Atingiu vários outros postos importantes do partido,
inclusive o número dois do Cremlin, Yegor Ligachev, que deixa de ser
o ideólogo da agremiação para assumir uma função meramente
burocrática.
Gorbachev sabe da necessidade
do seu projeto dar certo, não apenas para assegurar a sua
sobrevivência política, mas para a União Soviética poder
continuar ostentando a condição de superpotência. A economia
nacional está devagar, quase parando. O quadro é de escassez de
produtos essenciais. Dos que são encontrados nas prateleiras dos
armazéns do Estado, a qualidade varia entre péssima e sofrível.
O descontentamento aumenta e
há grande ceticismo dos trabalhadores quanto à "perestroika".
Quem sabe agora, com o expurgo de gente retrógrada, o processo possa
caminhar mais depressa e se refletir por todo o Leste europeu,
aumentando o clima de distensão mundial, que já se manifesta,
embora ainda timidamente. Tomara que sim.
(Artigo publicado na página
11, Internacional, do Correio Popular, em 1º de outubro de 1988)
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