Sunday, May 21, 2017

A dança dos números



Pedro J. Bondaczuk



A mais recente pesquisa do Instituto Vox Populi revela que o presidente Fernando Henrique Cardoso teria "desempatado" o jogo eleitoral com seu principal concorrente, Luís Inácio Lula da Silva, e reassumido as preferências do eleitorado, no caminho da reeleição. Estaria agora com 36 pontos, contra 29 do seu adversário petista.

Daqui até 4 de outubro pode-se esperar essa espécie de "gangorra", ao sabor das declarações desastradas, ou no mínimo inoportunas, de um ou outro candidato. E pesquisa avalia "intenções", que podem ou não se traduzir no ato de votar neste ou naquele postulante. Não decidem eleições. Caso decidissem, seria inútil e desnecessário o comparecimento dos eleitores às urnas.

A menos que algum dos concorrentes cometa uma gafe monumental, o panorama, até 4 de outubro, será este. Ora um estará na frente, ora será a vez do outro e ora se registrará empate técnico. Tudo leva a crer que haverá segundo turno e tentar apontar agora um vencedor é um exercício inútil, senão irresponsável, de "futurologia". Será eleito aquele que souber convencer melhor o eleitorado e que fizer as melhores alianças.

A tarefa de Fernando Henrique, o primeiro presidente a tentar uma reeleição em toda a história do Brasil, é muito mais complicada do que pode parecer ou que certos setores da mídia querem dar a entender. Pelo cargo que ocupa, por mais que tente partir para a ofensiva, ele é a "vidraça" e não a "pedra". Todo seu mandato estará em julgamento e por mais governista que seja um eventual analista, não há como negar falhas, omissões, gafes e sérios problemas nestes seus quatro anos de gestão. Serão, certamente, explorados pela oposição escândalos como o do Sivam, como o Proer, como as mortes de idosos na Clínica Santa Genoveva do Rio ou dos pacientes de hemodiálise de Caruaru, para citar apenas alguns. Pouco vai importar para o cidadão comum se o governo tem ou não culpa nesses casos.

A estabilização da economia --- conquista de todo o povo brasileiro, destaque-se --- já  não será o "cabo eleitoral" capaz de decidir a eleição em favor de FHC. Estarão em julgamento, isto sim, o desemprego, a falência nos setores de Saúde e Educação (embora determinados setores da mídia dêem a entender que neste campo o País já se aproxima do nível de excelência, o que é absurdo), da falta de segurança, da inexistência de um programa coerente e funcional de habitação, etc. etc. etc.

A propaganda dos cinco dedos espalmados, que foram o símbolo das prioridades do candidato de 1994, se for utilizada, tenderá a espantar e não a arregimentar eleitores. O governo fracassou em todos esses pontos. Não é necessária qualquer pesquisa para medir o alto grau de descontentamento do brasileiro com o presidente. Basta sair às ruas. Ou acompanhar a seção de cartas dos jornais e revistas. Críticas e condenações acumulam-se.

Isto quer dizer que Fernando Henrique não será reeleito? Não! Amplos setores da sociedade brasileira ainda "diabolizam" Lula e temem sua eventual chegada ao poder. A reeleição, portanto, pode ocorrer principalmente por causa desse fator. Mas se as taxas de desemprego permanecerem nos intoleráveis patamares atuais (e não importam os motivos), se o presidente continuar fazendo declarações infelizes como aquela em que chamou de "vagabundos" os brasileiros que se aposentam antes dos 50 anos e se a violência urbana não for contida, com ou sem medo do candidato petista, FHC pode ter a pior surpresa de sua carreira política.


(Texto escrito em 23 de junho de 1998 e publicado como editorial na Folha do Taquaral)





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