Foco potencial de frustração
Pedro J. Bondaczuk
A
atuação da Assembleia Nacional Constituinte, e o fato dela não
ser exclusiva, foram os dois geradores de tensões políticas no
corrente ano, caracterizado por crises de toda a sorte, que foram
desde a econômica – que nos acompanha a partir do grande naufrágio
de setembro de 1982, quando o País constatou, perplexo, que estava
virtualmente falido – até a de credibilidade dos homens públicos.
A
má assessoria prestada ao presidente José Sarney conseguiu, em
pouco tempo, não somente causar erosão em sua popularidade –
conquistada na vigência do Plano Cruzado – mas, pior: tornou o
governante um dos mais impopulares da história republicana
brasileira. Não que esteja cometendo erros sobre erros. Ocorre que a
falta de sintonia entre seus colaboradores o deixa, virtualmente, de
mãos atadas, impedindo-o de governar de fato.
Quanto
à Constituinte, intransigência tem se mostrado a palavra-chave. Os
vários grupos que compõem a Assembleia de notáveis não vêm
conseguindo se entender (ou não querem chegar ao entendimento, o que
nos parece mais provável). Essas desavenças causam grande atraso na
conclusão da nova Constituição.
A
sociedade, por seu turno, mostra-se assustada com algumas propostas,
que revelam, no mínimo, falta de compreensão, por parte dos
parlamentares, do seu relevante papel. Se desconhecem, de fato, o que
devem fazer, o País se encontra em uma grande enrascada, sem dúvida.
Há
deputados querendo inserir de tudo na nova Carta Magna. Esquecem-se
que a excelência de um texto constitucional não está na extensão
e nem na minuciosidade, mas no conteúdo. Por outro lado, quando
defendemos, antes das eleições de 15 de novembro de 1986, que a
Constituinte deveria ser exclusiva, independente do Congresso,
recebemos inúmeras críticas.
O
argumento dos que se opunham à nossa tese era o de que, um país
pobre, como o Brasil, não poderia se dar o luxo de sustentar duas
assembleias simultâneas. No entanto, com o vencimento do prazo
previsto para a conclusão da Constituição (e sequer se sabe quando
ela estará pronta para ser promulgada, já que os parlamentares,
quando entraram em recesso, não haviam chegado a um entendimento
sequer a respeito do regimento), os custos já são muito maiores dos
que seriam caso houvesse uma Constituinte exclusiva, independente do
Congresso Nacional.
Enquanto
isso, os trabalhos legislativos normais estão paralisados. Uma série
de leis ordinárias, muitas delas urgentes, aguardam a disposição
de deputados e senadores para serem analisadas e votadas, paralisando
o Legislativo e deixando o País, virtualmente, com apenas dois
poderes atuando: o Executivo e o Judiciário. E essa é uma nítida
aberração institucional.
É
verdade que uma comissão mista do Congresso tem, periodicamente,
desobstruído a pauta, mediante simples voto das lideranças
partidárias. Mas isso vem ocorrendo de afogadilho. Os projetos não
são sequer analisados. Quem perde somos todos nós, que pagamos os
custos de uma decisão equivocada e que corremos o risco de estarmos
submetidos a leis defeituosas e inadequadas.
Há,
por outro lado, um grande temor na sociedade de que a nova
Constituição venha a se constituir em uma das maiores frustrações
nacionais da nossa história. A expectativas despertada na população,
pela elaboração dessa Carta Magna, são imensas. Falta, contudo, um
esclarecimento adequado do real significado de uma Constituição
para um determinado país, no caso o Brasil.
Políticos
demagogos vêm dando a entender que o novo texto constitucional será
panacéia para todos os males nacionais. Claro que não será! Deu-se
a entender, por exemplo, na campanha eleitoral do ano passado,
que a Constituinte iria acabar com a miséria, que afeta 80% da
população brasileira, como que em um passe de mágica. Que acabaria
com a corrupção, com a prepotência, com a irresponsabilidade
administrativa e que, da noite para o dia, o Brasil se transformaria
quase que num paraíso.
Todavia,
não se mente, de forma impune, para o povo. Está chegando a hora da
verdade, quando os véus de falsidade e de demagogia certamente vão
cair. Não há como sustentar por muito tempo tamanha farsa. E, ao
que tudo indica, o País terá, ao invés de uma Constituição que
sobreviva a séculos, um texto constitucional que sequer deverá
alcançar uma década de vigência. E isso é sumamente lamentável,
se não leviano e até criminoso.
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 25 de
dezembro de 1987. Observação: o texto em questão foi publicado na
Coluna do Castelo e com o crédito errado, dado, indevidamente, ao
colunista Carlos Castello Branco. O artigo, porém, foi escrito por
mim).
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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