Tuesday, May 30, 2017

Foco potencial de frustração



Pedro J. Bondaczuk



A atuação da Assembleia Nacional Constituinte, e o fato dela não ser exclusiva, foram os dois geradores de tensões políticas no corrente ano, caracterizado por crises de toda a sorte, que foram desde a econômica – que nos acompanha a partir do grande naufrágio de setembro de 1982, quando o País constatou, perplexo, que estava virtualmente falido – até a de credibilidade dos homens públicos.

A má assessoria prestada ao presidente José Sarney conseguiu, em pouco tempo, não somente causar erosão em sua popularidade – conquistada na vigência do Plano Cruzado – mas, pior: tornou o governante um dos mais impopulares da história republicana brasileira. Não que esteja cometendo erros sobre erros. Ocorre que a falta de sintonia entre seus colaboradores o deixa, virtualmente, de mãos atadas, impedindo-o de governar de fato.

Quanto à Constituinte, intransigência tem se mostrado a palavra-chave. Os vários grupos que compõem a Assembleia de notáveis não vêm conseguindo se entender (ou não querem chegar ao entendimento, o que nos parece mais provável). Essas desavenças causam grande atraso na conclusão da nova Constituição.

A sociedade, por seu turno, mostra-se assustada com algumas propostas, que revelam, no mínimo, falta de compreensão, por parte dos parlamentares, do seu relevante papel. Se desconhecem, de fato, o que devem fazer, o País se encontra em uma grande enrascada, sem dúvida.

Há deputados querendo inserir de tudo na nova Carta Magna. Esquecem-se que a excelência de um texto constitucional não está na extensão e nem na minuciosidade, mas no conteúdo. Por outro lado, quando defendemos, antes das eleições de 15 de novembro de 1986, que a Constituinte deveria ser exclusiva, independente do Congresso, recebemos inúmeras críticas.

O argumento dos que se opunham à nossa tese era o de que, um país pobre, como o Brasil, não poderia se dar o luxo de sustentar duas assembleias simultâneas. No entanto, com o vencimento do prazo previsto para a conclusão da Constituição (e sequer se sabe quando ela estará pronta para ser promulgada, já que os parlamentares, quando entraram em recesso, não haviam chegado a um entendimento sequer a respeito do regimento), os custos já são muito maiores dos que seriam caso houvesse uma Constituinte exclusiva, independente do Congresso Nacional.

Enquanto isso, os trabalhos legislativos normais estão paralisados. Uma série de leis ordinárias, muitas delas urgentes, aguardam a disposição de deputados e senadores para serem analisadas e votadas, paralisando o Legislativo e deixando o País, virtualmente, com apenas dois poderes atuando: o Executivo e o Judiciário. E essa é uma nítida aberração institucional.

É verdade que uma comissão mista do Congresso tem, periodicamente, desobstruído a pauta, mediante simples voto das lideranças partidárias. Mas isso vem ocorrendo de afogadilho. Os projetos não são sequer analisados. Quem perde somos todos nós, que pagamos os custos de uma decisão equivocada e que corremos o risco de estarmos submetidos a leis defeituosas e inadequadas.

Há, por outro lado, um grande temor na sociedade de que a nova Constituição venha a se constituir em uma das maiores frustrações nacionais da nossa história. A expectativas despertada na população, pela elaboração dessa Carta Magna, são imensas. Falta, contudo, um esclarecimento adequado do real significado de uma Constituição para um determinado país, no caso o Brasil.

Políticos demagogos vêm dando a entender que o novo texto constitucional será panacéia para todos os males nacionais. Claro que não será! Deu-se a entender, por exemplo, na campanha eleitoral do ano passado, que a Constituinte iria acabar com a miséria, que afeta 80% da população brasileira, como que em um passe de mágica. Que acabaria com a corrupção, com a prepotência, com a irresponsabilidade administrativa e que, da noite para o dia, o Brasil se transformaria quase que num paraíso.

Todavia, não se mente, de forma impune, para o povo. Está chegando a hora da verdade, quando os véus de falsidade e de demagogia certamente vão cair. Não há como sustentar por muito tempo tamanha farsa. E, ao que tudo indica, o País terá, ao invés de uma Constituição que sobreviva a séculos, um texto constitucional que sequer deverá alcançar uma década de vigência. E isso é sumamente lamentável, se não leviano e até criminoso.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 25 de dezembro de 1987. Observação: o texto em questão foi publicado na Coluna do Castelo e com o crédito errado, dado, indevidamente, ao colunista Carlos Castello Branco. O artigo, porém, foi escrito por mim).



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