Friday, May 12, 2017

A hora é de definições



Pedro J. Bondaczuk



O governo do presidente José Sarney, que há menos de um ano estava batendo recordes de popularidade, com o Plano Cruzado, está colhendo, agora, outras cifras excepcionais, que, no entanto, lhe são totalmente desfavoráveis.

A inflação já ultrapassou o patamar dos 20% (atingiu 20,96% em abril), defasando o próprio gatilho. As performances do comércio e da indústria, na outra extremidade desta maluca gangorra econômica, mostram-se decepcionantes, com as vendas despencando de um mês a outro. Os juros, em algumas financeiras, bateram, na sexta-feira, nos estratosféricos 2.000% para o consumidor, prenunciando tempos ainda mais difíceis para os setores produtivos.

Em meio a esse quadro desolador, não é de se estranhar, pois, o clima de sinistrose que se abate sobre cada um de nós, agravado pelo mirabolante e fantasioso projeto da Ferrovia Norte-Sul, da qual não se sabe, com certeza, sequer o custo.

Por isso, não é de se reprovar que o tema sobre as eleições diretas para a presidência tenha atropelado a Constituinte e já esteja nas ruas, por todo o País. Os parlamentares, conscientes das dificuldades do momento que estamos vivendo, começaram a articular um pacto, um entendimento nacional (ou tenha lá o nome que tiver essa união de esforços para nos tirar desta perversa crise que nos assola) de caráter suprapartidário, para que o presidente tenha respaldo político nessa difícil travessia de 1987.

O que a população, às voltas com apertos crescentes em seu orçamento, vivendo o espectro dos protestos e execuções de seus compromissos nos cartórios, quer saber, é: quais medidas serão adotadas, doravante, no plano econômico, para deter a vertiginosa escalada de preços? Como o governo vai agir para gastar menos, e com juízo, reduzindo o seu monumental déficit e trazendo as taxas de juros para níveis mais sensatos?

O cidadão que vive diariamente estas agruras, embora não se aliene nunca (ao contrário do que muitos pensam) das disputas partidárias, é prático. Para ele pouco importa se as diretrizes que vão vigorar serão da autoria do PMDB, do PFL ou dos tecnocratas.

O que se requer são regras claras, definidas, estáveis, já que há muito não temos nenhuma. Essa ausência de definições cria situações que seriam engraçadas, se não fossem trágicas. Tais como a onda de boatos que varreu o País na semana passada, por exemplo, e que produziu uma dança maluca em todos os setores da economia. As bolsas de valores despencaram. Os investimentos produtivos, portanto, foram penalizados por causa de meros rumores.

Naquelas circunstâncias, os investidores preferiram postar na prudência. Afluíram, em massa, para o “over”, que estava pagando taxas de mais de 40% . Até o câmbio negro, autêntico termômetro de credibilidade da política econômica em vigor (e, convenhamos, hoje em dia, virtualmente, não temos nenhuma) foi afetado, com o dólar no paralelo chegando a ficar mais barato do que o oficial para os turistas (situação que ainda persiste, embora a diferença já tenha diminuído).

Esse comportamento do mercado, que preferiu acreditar nas Cassandras de mau-agouro a se fiar no governo, é sintomático. O Planalto deveria extrair uma lição dele. Deveria entender que a erosão de sua credibilidade vem se acentuando a olhos vistos e que o País caminha para uma situação caótica que todos temem e nem o mais insensato dos insensatos deseja. Precisa parar de tatear no escuro, à procura de saídas. Já é mais do que tempo para se definir a propósito de que tipo de regra econômica vai nortear as atividades produtivas da Nação.

Nas circunstâncias presentes, nada poderia ser mais inoportuno, e desastroso, do ponto de vista político, do que o anúncio da construção da Ferrovia Norte-Sul. Não que o transporte ferroviário seja inviável, ou inútil, num país de dimensões continentais. Pelo contrário, já deveríamos, no passado, ter dado maior atenção a ele e ter cortado o Brasil de ponta a ponta com trilhos. Mas não agora, quando estamos numa situação de não podermos sequer, o serviço de nossa dívida externa.

Esse projeto chegou a ser mostrado ao ex-ministro do Planejamento, João Sayad, que o descartou de pronto, pela impossibilidade absoluta de se apurar os seus custos sem antes se conhecer o trajeto, o traçado da ferrovia.

O investimento necessário para que ela funcione foi anunciado pelo governo como sendo de US$ 2,5 bilhões. Há técnicos, no entanto, que juram que o projeto não conseguirá sair do papel; por menos do que US$ 10 bilhões. Seja qual for a cifra correta, onde o País irá buscar esses dólares?

Por que a Norte-Sul está sendo colocada como prioridade? O que aconteceu, de fato, na questão da concorrência para a execução da obra? São perguntas que todos fazem e aguardam respostas convincentes. Ninguém deseja desestabilizar o governo.

A questão da duração do mandato do presidente José Sarney não foi posta na mesa agora, como muitos querem dar a entender. Antes mesmo da vitória do saudoso presidente Tancredo Neves, o tema já vinha sendo discutido. Basta que se recorra aos arquivos de qualquer jornal para se comprovar isso.

Portanto, que ninguém estranhe se a condição imposta para a obtenção do grande pacto extra-partidário que está sendo tentado forem as eleições presidenciais para 1988. Não pode haver uma aliança mais ampla do que a feita com toda a Nação. E esta só conta com um caminho para ser efetivada: o das urnas!

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 17 de maio de 1987).


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