O governo
do presidente José Sarney, que há menos de um ano estava batendo
recordes de popularidade, com o Plano Cruzado, está colhendo, agora,
outras cifras excepcionais, que, no entanto, lhe são totalmente
desfavoráveis.
A
inflação já ultrapassou o patamar dos 20% (atingiu 20,96% em
abril), defasando o próprio gatilho. As performances do comércio e
da indústria, na outra extremidade desta maluca gangorra econômica,
mostram-se decepcionantes, com as vendas despencando de um mês a
outro. Os juros, em algumas financeiras, bateram, na sexta-feira, nos
estratosféricos 2.000% para o consumidor, prenunciando tempos ainda
mais difíceis para os setores produtivos.
Em
meio a esse quadro desolador, não é de se estranhar, pois, o clima
de sinistrose que se abate sobre cada um de nós, agravado pelo
mirabolante e fantasioso projeto da Ferrovia Norte-Sul, da qual não
se sabe, com certeza, sequer o custo.
Por
isso, não é de se reprovar que o tema sobre as eleições diretas
para a presidência tenha atropelado a Constituinte e já esteja nas
ruas, por todo o País. Os parlamentares, conscientes das
dificuldades do momento que estamos vivendo, começaram a articular
um pacto, um entendimento nacional (ou tenha lá o nome que tiver
essa união de esforços para nos tirar desta perversa crise que nos
assola) de caráter suprapartidário, para que o presidente tenha
respaldo político nessa difícil travessia de 1987.
O
que a população, às voltas com apertos crescentes em seu
orçamento, vivendo o espectro dos protestos e execuções de seus
compromissos nos cartórios, quer saber, é: quais medidas serão
adotadas, doravante, no plano econômico, para deter a vertiginosa
escalada de preços? Como o governo vai agir para gastar menos, e com
juízo, reduzindo o seu monumental déficit e trazendo as taxas de
juros para níveis mais sensatos?
O
cidadão que vive diariamente estas agruras, embora não se aliene
nunca (ao contrário do que muitos pensam) das disputas partidárias,
é prático. Para ele pouco importa se as diretrizes que vão vigorar
serão da autoria do PMDB, do PFL ou dos tecnocratas.
O
que se requer são regras claras, definidas, estáveis, já que há
muito não temos nenhuma. Essa ausência de definições cria
situações que seriam engraçadas, se não fossem trágicas. Tais
como a onda de boatos que varreu o País na semana passada, por
exemplo, e que produziu uma dança maluca em todos os setores da
economia. As bolsas de valores despencaram. Os investimentos
produtivos, portanto, foram penalizados por causa de meros rumores.
Naquelas
circunstâncias, os investidores preferiram postar na prudência.
Afluíram, em massa, para o “over”, que estava pagando taxas de
mais de 40% . Até o câmbio negro, autêntico termômetro de
credibilidade da política econômica em vigor (e, convenhamos, hoje
em dia, virtualmente, não temos nenhuma) foi afetado, com o dólar
no paralelo chegando a ficar mais barato do que o oficial para os
turistas (situação que ainda persiste, embora a diferença já
tenha diminuído).
Esse
comportamento do mercado, que preferiu acreditar nas Cassandras de
mau-agouro a se fiar no governo, é sintomático. O Planalto deveria
extrair uma lição dele. Deveria entender que a erosão de sua
credibilidade vem se acentuando a olhos vistos e que o País caminha
para uma situação caótica que todos temem e nem o mais insensato
dos insensatos deseja. Precisa parar de tatear no escuro, à procura
de saídas. Já é mais do que tempo para se definir a propósito de
que tipo de regra econômica vai nortear as atividades produtivas da
Nação.
Nas
circunstâncias presentes, nada poderia ser mais inoportuno, e
desastroso, do ponto de vista político, do que o anúncio da
construção da Ferrovia Norte-Sul. Não que o transporte ferroviário
seja inviável, ou inútil, num país de dimensões continentais.
Pelo contrário, já deveríamos, no passado, ter dado maior atenção
a ele e ter cortado o Brasil de ponta a ponta com trilhos. Mas não
agora, quando estamos numa situação de não podermos sequer, o
serviço de nossa dívida externa.
Esse
projeto chegou a ser mostrado ao ex-ministro do Planejamento, João
Sayad, que o descartou de pronto, pela impossibilidade absoluta de se
apurar os seus custos sem antes se conhecer o trajeto, o traçado da
ferrovia.
O
investimento necessário para que ela funcione foi anunciado pelo
governo como sendo de US$ 2,5 bilhões. Há técnicos, no entanto,
que juram que o projeto não conseguirá sair do papel; por menos do
que US$ 10 bilhões. Seja qual for a cifra correta, onde o País irá
buscar esses dólares?
Por
que a Norte-Sul está sendo colocada como prioridade? O que
aconteceu, de fato, na questão da concorrência para a execução da
obra? São perguntas que todos fazem e aguardam respostas
convincentes. Ninguém deseja desestabilizar o governo.
A
questão da duração do mandato do presidente José Sarney não foi
posta na mesa agora, como muitos querem dar a entender. Antes mesmo
da vitória do saudoso presidente Tancredo Neves, o tema já vinha
sendo discutido. Basta que se recorra aos arquivos de qualquer jornal
para se comprovar isso.
Portanto,
que ninguém estranhe se a condição imposta para a obtenção do
grande pacto extra-partidário que está sendo tentado forem as
eleições presidenciais para 1988. Não pode haver uma aliança mais
ampla do que a feita com toda a Nação. E esta só conta com um
caminho para ser efetivada: o das urnas!
(Artigo
publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 17 de maio
de 1987).
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