Wednesday, May 17, 2017

Falar muito sem dizer nada



Pedro J. Bondaczuk


O ex-prefeito de Curitiba, Jaime Lerner, definiu com extrema clareza o comportamento das elites dirigentes do País, a principal causa do prolongamento da crise que vivemos há mais de 12 anos: “O Brasil vive a síndrome do impasse. Exageramos de tal maneira nossos problemas que estamos perdendo a obrigação de enfrentá-los”.

E não é só isso. Com a suicida antecipação da campanha presidencial em pelo menos um ano, ninguém quer assumir responsabilidades, em especial quando se trata de tomar decisões que, embora necessárias, sejam impopulares. Faz-se um irritante jogo de empurra, cujas conseqüências acabam por ser bastante funestas.

É o que vem ocorrendo agora, por exemplo, em relação à nova política salarial aprovada pelo Congresso, que prevê reajustes mensais de salários mediante o repasse de 100% da inflação. O governo argumenta com a inoportunidade da medida. Explica que os aumentos, da forma prevista pelo projeto, vão causar um acréscimo de US$ 12,6 bilhões no déficit público, causa básica da inflação. Se a conclusão, após estudos feitos pela área econômica (presume-se que tenham sido realizados) é esta, por que o presidente Itamar Franco não veta a proposta, simplesmente, assumindo o ônus da decisão? Ao invés disso, no entanto, a questão vem se arrastando por duas semanas, com intermináveis reuniões que não têm redundado em coisa alguma.

E o que fazem os políticos (salvo honrosas exceções)? Insinuam que o salário não é gerador de inflação. Mas não assumem, na prática, as conseqüências que eventualmente a nova política salarial venha a ter sobre as taxas inflacionárias. Limitam-se, como ressalta um editorial do jornal “O Estado de S. Paulo”, a “falar, mas não dizer”.

Aproveitam-se da desinformação generalizada da população para um “banho de populismo”, que rende polpudos dividendos eleitorais. Mas jamais “assumem” de verdade suas declarações. Preocupam-se com a carreira, em detrimento do País.

O governo Itamar Franco, em parte por causa desse velado boicote do Congresso, vem se caracterizando pela morosidade nas decisões, senão pela absoluta inércia. Depois da novela do IPMF, de centenas de lacrimosos capítulos, tivemos a da reforma ministerial, a do plano econômico de Eliseu Resende que sequer começou a ser implementado por causa da sua demissão, em decorrência do caso Norberto Odebrecht, a do programa de Fernando Henrique, a da crise da Polícia Federal atrelada à busca do empresário PC Farias e agora a da política salarial.

Como a inflação não espera as elites se entenderem, o custo de vida foi para as alturas. E, alpinista ousada e experiente, galga degrau a degrau rumo a novos picos, trazendo consigo as seqüelas da concentração de renda e da ampliação do quadro, já gravíssimo, da miserabilidade do brasileiro.

Toda essa inércia e esse festival de retórica, que somos forçados a assistir, diariamente, lembram-nos a afirmação de Peter Drucker, de que “não existem países subdesenvolvidos, mas Estados subgovernados”. Não adianta a população esperar remédios doces ou apostar em milagres.

O último que tentaram nos impingir, todos sabem no que deu. O filósofo inglês Francis Bacon observou que “todos os governos são necessariamente obscuros e invisíveis”. Mas o atual, incluindo os três poderes, principalmente o Executivo e o Legislativo, não precisava exagerar tanto na sua obscuridade.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 30 de julho de 1993)



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