Falar muito sem dizer nada
Pedro J. Bondaczuk
O ex-prefeito de Curitiba,
Jaime Lerner, definiu com extrema clareza o comportamento das elites
dirigentes do País, a principal causa do prolongamento da crise que
vivemos há mais de 12 anos: “O Brasil vive a síndrome do impasse.
Exageramos de tal maneira nossos problemas que estamos perdendo a
obrigação de enfrentá-los”.
E não é só isso. Com a
suicida antecipação da campanha presidencial em pelo menos um ano,
ninguém quer assumir responsabilidades, em especial quando se trata
de tomar decisões que, embora necessárias, sejam impopulares.
Faz-se um irritante jogo de empurra, cujas conseqüências acabam por
ser bastante funestas.
É o que vem ocorrendo agora,
por exemplo, em relação à nova política salarial aprovada pelo
Congresso, que prevê reajustes mensais de salários mediante o
repasse de 100% da inflação. O governo argumenta com a
inoportunidade da medida. Explica que os aumentos, da forma prevista
pelo projeto, vão causar um acréscimo de US$ 12,6 bilhões no
déficit público, causa básica da inflação. Se a conclusão, após
estudos feitos pela área econômica (presume-se que tenham sido
realizados) é esta, por que o presidente Itamar Franco não veta a
proposta, simplesmente, assumindo o ônus da decisão? Ao invés
disso, no entanto, a questão vem se arrastando por duas semanas, com
intermináveis reuniões que não têm redundado em coisa alguma.
E o que fazem os políticos
(salvo honrosas exceções)? Insinuam que o salário não é gerador
de inflação. Mas não assumem, na prática, as conseqüências que
eventualmente a nova política salarial venha a ter sobre as taxas
inflacionárias. Limitam-se, como ressalta um editorial do jornal “O
Estado de S. Paulo”, a “falar, mas não dizer”.
Aproveitam-se da desinformação
generalizada da população para um “banho de populismo”, que
rende polpudos dividendos eleitorais. Mas jamais “assumem” de
verdade suas declarações. Preocupam-se com a carreira, em
detrimento do País.
O governo Itamar Franco, em
parte por causa desse velado boicote do Congresso, vem se
caracterizando pela morosidade nas decisões, senão pela absoluta
inércia. Depois da novela do IPMF, de centenas de lacrimosos
capítulos, tivemos a da reforma ministerial, a do plano econômico
de Eliseu Resende que sequer começou a ser implementado por causa da
sua demissão, em decorrência do caso Norberto Odebrecht, a do
programa de Fernando Henrique, a da crise da Polícia Federal
atrelada à busca do empresário PC Farias e agora a da política
salarial.
Como a inflação não espera
as elites se entenderem, o custo de vida foi para as alturas. E,
alpinista ousada e experiente, galga degrau a degrau rumo a novos
picos, trazendo consigo as seqüelas da concentração de renda e da
ampliação do quadro, já gravíssimo, da miserabilidade do
brasileiro.
Toda essa inércia e esse
festival de retórica, que somos forçados a assistir, diariamente,
lembram-nos a afirmação de Peter Drucker, de que “não existem
países subdesenvolvidos, mas Estados subgovernados”. Não adianta
a população esperar remédios doces ou apostar em milagres.
O último que tentaram nos
impingir, todos sabem no que deu. O filósofo inglês Francis Bacon
observou que “todos os governos são necessariamente obscuros e
invisíveis”. Mas o atual, incluindo os três poderes,
principalmente o Executivo e o Legislativo, não precisava exagerar
tanto na sua obscuridade.
(Artigo publicado na página
2, Opinião, do Correio Popular, em 30 de julho de 1993)
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