Questão de nome
Pedro
J. Bondaczuk
O
nome de uma pessoa – embora sua escolha não dependa dela e seja
imposto pelos pais no momento do registro em cartório, logo depois
do nascimento – é importante fator de identificação, embora nem
sempre seja original. Há milhões de casos de homonímia, que causam
enorme confusão e muitas vezes dão dores de cabeça muito grandes
ao cidadão. Por exemplo, quem conseguiria catalogar todos os que se
chamam José da Silva no País? E nem é preciso abrangência tão
ampla. Quantos, em Campinas, são chamados dessa maneira? Tentem
contar em uma lista telefônica!
No
mesmo caso estão os John Smith, nos Estados Unidos. Ou os Ivans, na
Rússia. Ou outros tantos nomes que são mais do que comuns em várias
partes do mundo. Mas as obras de um indivíduo – única coisa que
lhe sobrevive caso tenha de fato alguma que seja consistente e que
mereça ser lembrada – se associam ao nome e nunca à imagem.
Muitos não gostam do seu e, na idade adulta, o trocam no cartório.
Alguns adotam pseudônimos, com os quais passam para a posteridade.
Estão,
neste caso, artistas, esportistas e políticos famosos. Quem conhece,
por exemplo, Allen Stewart Konigsberg? Pouquíssima gente sabe de
quem se trata. Talvez essa pessoa seja conhecida dessa maneira só
pelos parentes mais chegados e amigos mais íntimos, quando muito.
Agora se dissermos que se trata do ator e diretor de cinema Woody
Allen, a coisa muda de figura. Quase ninguém irá alegar
desconhecimento, a menos que se trate de um sujeito extremamente mal
informado.
O
mesmo ocorre com Frederic Austerlitz (Fred Astaire), Dóris Kapelhoff
(Dóris Day), Lucy Johnson (Ava Gardner), Marion Morrison (John
Wayne) ou Joseph Levitch (Jerry Lewis), entre outros. Como se vê, o
nome fica imediatamente associado àquilo que o seu detentor faz, de
bom ou de mau, e é o primeiro referencial para a sua identificação,
quer na vida social no dia a dia, quer para a posteridade, dos que
conseguem vencer a "segunda morte": a da memória. Quanto
mais original for, portanto, mais chances terá de ser lembrado
dentro de vinte, trinta, cinqüenta, cem, quinhentos ou mil anos.
Um
casal sueco, no entanto, exagerou na dose de originalidade. Registrou
o filho, nascido na cidade de Gotemburgo, da seguinte forma:
"Brfxxccxxmnpcccclllmnprxvclmnckssqlbb11116". Não pense o
leitor que houve falha de impressão e que as letras ficaram todas
embaralhadas. Foi exatamente dessa forma que o garoto foi chamado e
registrado. Claro que o caso despertou repercussão na imprensa, não
apenas da Suécia, mas do mundo todo. A princípio, pensou-se que
algum funcionário do cartório tivesse empastelado a certidão de
nascimento. Por isso, os pais foram convocados para esclarecer tudo.
Perante o tabelião, confirmaram que era exatamente dessa forma que
queriam chamar o menino.
Logo o caso
caiu no esquecimento. Cinco anos depois, o garoto continuava sem
nome. Afinal, essa sucessão de 43 caracteres é ilegível e
impronunciável. O casal foi intimado para proceder a mudança e
denominar o filho de forma digna e civilizada. Por manter-se
irredutível, porém, acabou multado em 5 mil coroas suecas (o
equivalente a US$ 735). Quando parecia que os pais do jovem sem nome
iriam parar de brincadeira e alterar o registro, os dois resolveram
recorrer da multa em um tribunal de recurso fiscal da cidade.
Seus
advogados argumentaram que o casal tem crenças esotéricas e que a
sucessão de letras e números, na verdade, tem um significado
lógico: "Albino". O juiz indagou: "Por que, então,
vocês não registraram o filho dessa maneira?". "Porque
ele teria azar na vida", responderam. "A formulação é
mágica", acrescentaram. Sem comentários... Claro que o
tribunal não levou a sério esta e outras argumentações. Entendeu
– se com razão ou não nunca se vai saber – que o nome não
passava de brincadeira de mau gosto, de uma enorme "sacanagem"
com a criança.
Por
isso, confirmou a multa e mandou o cartório fazer um novo registro
do menino. O nome que passou a constar na certidão é Albino. Uma
das argumentações do casal, quando da apresentação do recurso,
retirada do processo (ao qual a imprensa teve acesso) é esta
"pérola" de ambigüidade: "Os caracteres utilizados
são de uma formação pletórica de sentido e tipograficamente
expressionista, que nos parece uma nova criação artística".
Pobre garoto! Se em uma coisa tão simples, quanto a escolha do nome,
houve tanta confusão, o que não deve ocorrer na sua convivência
com esses pais? De fato, a ficção jamais conseguirá superar a
realidade em termos de coisas insólitas...Ou malucas...
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