Saturday, May 13, 2017

Reformistas radicais estão com pressa


Pedro J. Bondaczuk


O presidente soviético, Mikhail Gorbachev, ao lançar seu projeto reformista, agiu de acordo com a sua formação. Presume-se que tenha sido sincero ao pretender mudar de fato a sociedade de seu país e não usar somente um artifício a mais para concentrar uma soma ainda maior de poder, do que a que era conferida a seus antecessores, em suas mãos.

Não se podia esperar, portanto, que ele viesse a implantar na URSS uma democracia ao estilo norte-americano. Ele não tem preparo para isso, não possui formação democrática anterior. Não foi "educado" para a democracia.

Esta é a razão pela qual suas idéias despertam tamanho espanto, pela sua lucidez. Gorbachev, evidentemente, pode estar errado em muitos pontos. É possível que esteja equivocado em todos. Por isso, precisa promover realmente a revolução que propôs em sua célebre obra, ou seja, "de baixo" para cima.

O escritor norte-americano Robert Heller, em seu livro "Os Tomadores de Decisão" --- Makron Books/McGraw Hill --- assinala: "Os tomadores de decisão de todos os níveis escolhem ou recusam um plano de ação, um candidato a emprego ou qualquer outra coisa, à luz do entendimento que têm da opção escolhida e do conhecimento que têm das circunstâncias presentes, junto com sua visão das circunstâncias futuras, sua experiência do passado e sua extrapolação das conseqüências da escolha. Em todas as etapas, é extremamente fácil de se estar redondamente enganado".

É essa possibilidade que os reformistas radicais soviéticos, em especial o presidente do Parlamento da Rússia, Bóris Yeltsin, colocam a todo o instante para a opinião pública, mas como sendo um fato já consumado: a de Gorbachev estar equivocado, pelo menos na velocidade das reformas que quer implantar.

Outros vêem equívocos até mesmo na substância da perestroika. Entendem que, para o regime soviético que vai emergir do processo mudancista ser de fato democrático, é indispensável "a priori" que na economia seja implantado o capitalismo.

Está aí um erro, aliás muito comum hoje em dia. Um sistema capitalista não implica necessariamente em democracia. Temos fartura de exemplos para demonstrar isso. A Coréia do Sul é um deles. O capitalismo, na sua mais pura expressão, existe nesse país desde que ele foi formado, com a divisão da Península Coreana em dois Estados, em 1945, ao término da Segunda Guerra Mundial. Todavia, ninguém, em sã consciência, pode afirmar que os governos do presidente Park Chung Hee --- assassinado em 26 de outubro de 1979 --- e do general Choo-Doo Hwan tenham sido sequer um arremedo democrático. O mesmo vale para Formosa, para a Tailândia, para a Malásia e para Singapura, classificados como "Tigres Asiáticos".

Postulados capitalistas e socialistas, desde que não antagônicos e bem dosados, podem conviver harmonicamente numa sociedade, sem que se anulem.

O sociólogo norte-americano Daniel Bell cita um desses exemplos ao afirmar: "A privatização na economia e a provisão de recursos para que as comunidades tomem suas próprias decisões no tocante às necessidades sociais e ao bem-estar efetivamente andam de mãos dadas, embora a primeira seja considerada conservadora e a segunda socialista". Neste aspecto está a principal diferença entre o irado "delenda Cartago" de Yeltsin, que pretende lançar por terra tudo o que represente passado, mesmo que seja importante conquista social, e a moderação de Gorbachev.

(Artigo publicado na página 12, Internacional, do Correio Popular, em 4 de abril de 1991).



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