Reformistas radicais estão
com pressa
Pedro J. Bondaczuk
O presidente soviético,
Mikhail Gorbachev, ao lançar seu projeto reformista, agiu de acordo
com a sua formação. Presume-se que tenha sido sincero ao pretender
mudar de fato a sociedade de seu país e não usar somente um
artifício a mais para concentrar uma soma ainda maior de poder, do
que a que era conferida a seus antecessores, em suas mãos.
Não se podia esperar,
portanto, que ele viesse a implantar na URSS uma democracia ao estilo
norte-americano. Ele não tem preparo para isso, não possui formação
democrática anterior. Não foi "educado" para a
democracia.
Esta é a razão pela qual
suas idéias despertam tamanho espanto, pela sua lucidez. Gorbachev,
evidentemente, pode estar errado em muitos pontos. É possível que
esteja equivocado em todos. Por isso, precisa promover realmente a
revolução que propôs em sua célebre obra, ou seja, "de
baixo" para cima.
O escritor norte-americano
Robert Heller, em seu livro "Os Tomadores de Decisão" ---
Makron Books/McGraw Hill --- assinala: "Os tomadores de decisão
de todos os níveis escolhem ou recusam um plano de ação, um
candidato a emprego ou qualquer outra coisa, à luz do entendimento
que têm da opção escolhida e do conhecimento que têm das
circunstâncias presentes, junto com sua visão das circunstâncias
futuras, sua experiência do passado e sua extrapolação das
conseqüências da escolha. Em todas as etapas, é extremamente fácil
de se estar redondamente enganado".
É essa possibilidade que os
reformistas radicais soviéticos, em especial o presidente do
Parlamento da Rússia, Bóris Yeltsin, colocam a todo o instante para
a opinião pública, mas como sendo um fato já consumado: a de
Gorbachev estar equivocado, pelo menos na velocidade das reformas que
quer implantar.
Outros vêem equívocos até
mesmo na substância da perestroika. Entendem que, para o regime
soviético que vai emergir do processo mudancista ser de fato
democrático, é indispensável "a priori" que na economia
seja implantado o capitalismo.
Está aí um erro, aliás
muito comum hoje em dia. Um sistema capitalista não implica
necessariamente em democracia. Temos fartura de exemplos para
demonstrar isso. A Coréia do Sul é um deles. O capitalismo, na sua
mais pura expressão, existe nesse país desde que ele foi formado,
com a divisão da Península Coreana em dois Estados, em 1945, ao
término da Segunda Guerra Mundial. Todavia, ninguém, em sã
consciência, pode afirmar que os governos do presidente Park Chung
Hee --- assassinado em 26 de outubro de 1979 --- e do general
Choo-Doo Hwan tenham sido sequer um arremedo democrático. O mesmo
vale para Formosa, para a Tailândia, para a Malásia e para
Singapura, classificados como "Tigres Asiáticos".
Postulados capitalistas e
socialistas, desde que não antagônicos e bem dosados, podem
conviver harmonicamente numa sociedade, sem que se anulem.
O sociólogo norte-americano
Daniel Bell cita um desses exemplos ao afirmar: "A privatização
na economia e a provisão de recursos para que as comunidades tomem
suas próprias decisões no tocante às necessidades sociais e ao
bem-estar efetivamente andam de mãos dadas, embora a primeira seja
considerada conservadora e a segunda socialista". Neste aspecto
está a principal diferença entre o irado "delenda Cartago"
de Yeltsin, que pretende lançar por terra tudo o que represente
passado, mesmo que seja importante conquista social, e a moderação
de Gorbachev.
(Artigo publicado na página
12, Internacional, do Correio Popular, em 4 de abril de 1991).
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