Falta de compreensão
Pedro J. Bondaczuk
A capacidade humana de
compreensão é ainda ínfima e limitadíssima, a despeito da nossa
empáfia e arrogância. Julgamos já compreender os mistérios da
matéria e da energia e até colocamos limite na extensão do
universo, baseados, somente, em princípios matemáticos. Claro que
tudo não passa de teorias, baseadas em hipóteses e suposições,
mais em fantasias do que em dados confiáveis.
A imaginação humana sim é
fértil e quase sem limites, não sua real compreensão. Escrevi, há
alguns anos, um poema a respeito, inspirado por um besouro, que se
chocou contra a vidraça do meu quarto. Duvido que o inseto tenha
entendido a natureza daquele obstáculo. Tanto, que fez inúmeras
tentativas para passar pela janela com o vidro fechado. Claro que o
esforço foi em vão. Assim somos nós em relação a conceitos como
infinito e eternidade.
Outro dia, fechado em meu
gabinete de trabalho, ouvi insistentes latidos do meu poodle, o Nick,
provenientes do meu quarto. Levantei assustado, com a possibilidade
de algum estranho haver entrado em casa, e corri para o local, para
conferir o motivo de tamanho alarido. A cena com a qual me deparei,
naquele momento, em princípio, somente me causou riso. Só depois é
que refleti nela para extrair alguma lição.
Ao chegar ao quarto, lá
estava o Nick rosnando e latindo, desesperado, em posição de
ataque, para a sua imagem num espelho que eu tenho e que cobre, de
alto abaixo, uma das paredes do recinto. Isso me levou à conclusão
de que a absoluta irracionalidade dos animais, tão apregoada pelos
cientistas, é uma balela. Especialmente a dos cães.
Um tantinho de compreensão
eles têm. Não agem só por instinto, conforme se convencionou
achar. Se fosse assim, o Nick não latiria tanto para a própria
imagem, julgando que se tratasse de um rival. Reconheceria, pelo
olfato, que não havia ali nenhum outro cão, além dele.
Nossa capacidade de
compreensão, guardadas as devidas proporções, é como a do besouro
do meu poema ou como a do meu poodle. A noção do infinito, por
exemplo, é tão profunda e absurda, para nossas mentes efêmeras e
finitas, que não há quem dela tenha a verdadeira compreensão.
Pense em alguma coisa – no
espaço, por exemplo – que nunca termine. Você avança, avança e
avança e sempre há o que avançar. Além de não ter fim, não tem
princípio. Você retrocede, retrocede, retrocede e nunca chega ao
ponto de partida. Por que? Porque não há um! Deu para entender?
Duvido!
Só compreende essa noção, e
a sua correspondente, ou seja, a da eternidade, quem é Eterno e
Infinito e que criou essa imensidão sem fim. Ou seja, Deus. A bem da
verdade, não entendemos conceitos muito mais simples e mais
rasteiros, como nossas próprias atitudes e a dos que nos cercam.
Volta e meia, nos
surpreendemos com as nossas contradições e isso quando nos damos o
trabalho de analisá-las. Somos, por exemplo, sumamente lépidos e
constantes no exigir benesses de que nos julguemos merecedores e
morosos, quando não omissos, no agradecer os bens recebidos.
A gratidão, convenhamos, não
é a característica mais constante no homem. Mesmo em nossas
orações, pedimos, pedimos e pedimos o necessário e o supérfluo, o
benigno e o que nem sempre nos é o melhor, o útil e o inútil.
Contudo, quase sempre esquecemos de agradecer pela vida, saúde,
disposição, luz do sol, pingos de chuva e tudo o quanto nos garante
a vida e a felicidade, dados de graça por Deus.
Acho, por exemplo, uma piada
ridícula quando alguém me diz que o limite do universo situa-se a
12 bilhões de anos-luz. Será que quem afirma isso já tentou, pelo
menos, colocar essa cifra no papel em sua inteireza, sem a utilização
de potência? Já tentou converter em segundos os dias de um ano,
multiplicou isso por doze bilhões e voltou a multiplicar o resultado
por trezentos mil? Duvido! Como, então, alguém pode afirmar uma
coisa dessas, e com tamanha certeza?!
Só acreditaria na exatidão
do estabelecimento desse limite se a pessoa que pela primeira vez
afirmou isso, e com tamanha convicção, mostrasse que compreende,
mas compreende mesmo, a noção do infinito e do eterno. Ao
estabelecer esse marco para a extensão do universo, baseado, apenas,
em hipóteses e fantasias, esse astrônomo, ou físico, ou sabe-se lá
o quê, apenas demonstrou que não tem nada sequer aproximado dessa
compreensão.
Se essa noção, por si só,
já é complexa, Mauro Sampaio coloca nela ainda mais complexidade,
nos versos finais do poema “Meditação para o Ano Novo”:
“A última hora, a que
esmaga o tempo,
renasce no Tempo.
Chegado o limite, principia
o limite do ilimitado,
E aí sim, o Tempo infinito
só cabe no tempo da
aceitação.
E este é o milagre:
na última hora do primeiro
minuto se resume o infinito!”.
Fantasia por fantasia, prefiro
a dos poetas. Estes, pelo menos, são muito mais criativos e
sinceros.
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