Aventura que custa muito caro
Pedro J. Bondaczuk
A União Soviética, apesar de
não esconder a sua exasperação pelo fato das negociações de paz
de Genebra estarem empacadas, dá, a cada dia que passa, sinais mais
do que evidentes de que deseja ver o Afeganistão pelas costas. As
autoridades atuais do Cremlin, é bom que se frise, nada têm a ver
com essa aventura inconseqüente e temerária, obra do hoje execrado
dirigente Leonid Brezhnev, que fez tantas trapalhadas que serão
precisos muitos anos para que tudo seja reparado.
O “investimento” em
sangue, destruição e sacrifícios não teve a mínima compensação,
nem política, nem militar e muito menos material. O prejuízo,
portanto, foi total e irreparável. Não é difícil do leitor
avaliar o custo astronômico da manutenção de 115 mil combatentes
num país estranho, onde língua, costumes, alimentação e modo de
vida são completamente diferentes.
Pior, ainda, tudo se torna,
quando a presença desses invasores desperta hostilidade geral, até
dos que seriam pretensamente beneficiados com ela, como é o caso das
autoridades marxistas afegãs. Tudo levar a crer que o Cremlin,
dentro da sua tradição mais espetaculosa, está aguardando, apenas,
a proximidade da reunião de cúpula de Moscou para anunciar a sua
saída dessa pobre nação da Ásia.
A presença soviética nesse
território, além de não trazer vantagem alguma para os russos, nem
mesmo conseguiu melhorar um pouquinho que fosse o padrão de
existência dos habitantes do Afeganistão. Eles continuam sendo,
praticamente em todos os parâmetros que se tomem para medida, os
mais pobres e desvalidos cidadãos do Planeta.
Nem mesmo o “imbróglio”
que levou Brezhnev a determinar a invasão, ou seja, a guerra civil
no país, caminhou um só milímetro para qualquer solução, após
oito anos de selvagens combates entre as partes. A nação continua
tão dividida e repleta de animosidade entre os beligerantes como no
dia 27 de dezembro de 1979, quando os tanques e as tropas soviéticas
surpreenderam (ou melhor, decepcionaram) o mundo, colocando esse
lugar (esquecido por todos, há tempos), tristemente, no mapa dos
grandes conflitos deste século.
É lógico que o líder
Mikhail Gorbachev deve ter ponderado tudo isso e já ter decidido o
que fazer. Ademais, a população da URSS está saturada de ver seus
parentes seguirem inteiros e saudáveis para uma guerra sem sentido e
retornarem estropiados, com os nervos e o corpo em frangalhos, quando
não num caixão.
E todos fazem a mesma
pergunta: “Por que tudo isso? Quais as vantagens para os soviéticos
ou para os afegãos dessa presença que nenhuma das partes deseja?”.
As declarações, publicadas, ontem, na Bulgária, dadas pelo
chanceler Eduard Shevardnadze, nada mais fazem do que confirmar que a
saída do Afeganistão é uma questão de dias.
Espera-se, somente, que essa
aventura, e a do Vietnã (para os norte-americanos), sirvam de lições
para as superpotências, para que aprendam que nem sempre a força
resolve as pendências, principalmente quando ela não pode ser usada
em toda a sua plenitude.
(Artigo publicado na página
12, Internacional, do Correio Popular, em 1º de abril de 1988)
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