Oásis no coração
Pedro J. Bondaczuk
Os conceitos fundamentais, os
que dão grandeza e transcendência ao homem e que simbolizam o que
ele tem de mais nobre – seu diferencial em relação às demais
criaturas – ou seja, a inteligência, curiosamente, na língua
portuguesa, são representados por três palavras bastante curtas,
duas delas com apenas três letras: fé, paz e lei. E exatamente o
mais poderoso dos sentimentos e atos humanos, aquele que é capaz,
até, de “remover montanhas”, caso seja necessário, é grafado
com apenas dois caracteres.
Uma quarta característica,
igualmente essencial, o amor (que assegura, entre outras coisas, a
perpetuação da espécie) é escrito com somente quatro sinais
gráficos. Curiosamente, portanto, quanto maior o sentimento, menor é
a palavra que o representa. Seria intencional? Vai se saber!
Desses quatro conceitos, o que
mais me desperta reflexão e que tenho dificuldade de entender – e
por isso, de explicar – é a fé. É acreditar, sem restrições,
no invisível, no impalpável, no improvável, enfim, no
inacreditável. Para que isso se torne possível, é necessário que
se tenha inquestionável convicção no objeto da crença: pessoa,
acontecimento e, principalmente, em Deus.
Temos que ter total confiança,
como, por exemplo, a do trapezista que, sem nenhuma rede de proteção,
se projeta no espaço, sem qualquer apoio, na certeza absoluta que
seu parceiro o irá aparar no ar com segurança, impedindo que se
precipite ao solo e venha a sofrer graves ferimentos, quando não a
morte. Se pairar a mínima dúvida, a menor incerteza, é melhor que
sequer tente a façanha. Muitos tentam e se dão mal.
É verdade que não podemos
ver Deus. Não sabemos qual é o Seu aspecto, quais são Suas feições
(se é que as tem), como são Seus olhos, qual o timbre de Sua voz
etc.etc.etc. Mas há indícios de Sua existência, onisciência e
onipotência. Por exemplo, se estamos neste planeta, óbvio, é
porque ele existe. Se existe, alguém o criou (e a nós também,
claro). E essa esfera, meio ovalada, de cores azul e branca quando
vista do espaço, é apenas um ínfimo, infimíssimo fragmento de um
todo, que é o universo.
Como não acreditar em tudo
isso?! Como achar que nós e tudo o que nos rodeia somos meros frutos
do acaso?! Se formos, então o “acaso” é uma das tantas
designações para a divindade. Pois não importa o nome que Lhe
dermos – se Jeová, Alá ou Tupã, ou outro qualquer que nos venha
à cabeça. Importa o conceito. Importa que Ele existe, é eterno,
onipotente, onisciente e onipresente, entre outras coisas.
A fé, porém, ao contrário
do que os tolos apregoam, não é cega. É fundamentada numa
convicção indestrutível, como a do trapezista, que confia, sem
vacilar, no parceiro. Tem bases sólidas, inabaláveis e
irremovíveis, tendo por matéria-prima a lógica. Prende-se muito
mais à intuição, que é poderosa, do que à comprovação, que é
frágil, e ao conhecimento humano, escassíssimo (e o homem, tolo, se
julga tão sábio!).
O poeta libanês, Gibran
Khalil Gibran, numa feliz metáfora, compara o coração (encarado,
também metaforicamente, como a sede do entendimento e dos
sentimentos), a um vasto e desolado deserto. Por ele viaja, exausta e
meio perdida, a “caravana do conhecimento”, em busca de um oásis,
para refazer as forças e poder completar a travessia. E este, no
entender do escritor, é a fé. E não é?! Há maior refrigério
para os aflitos e desesperados do que este? Claro que não! Os poetas
(sempre os poetas...) com seu jeito aparentemente irracional, são
capazes de explicar, como quem não quer nada, conceitos que os
doutos filósofos, os arrogantes sábios e os cientistas de todas as
ciências se mostram incapazes.
Quanto à fé, são
incontáveis, por exemplo, os casos de pessoas que, com doenças
incuráveis, desenganadas pela Medicina, se recusaram, no íntimo, a
aceitar esse veredicto. Acreditaram na cura, sem nutrirem a mais leve
dúvida e, para o espanto (diria, estupefação) dos médicos (que
jamais encontraram explicações racionais para essas súbitas
reversões de expectativas, contrárias à natureza e a tudo o que
aprenderam), tiveram a saúde restabelecida e viveram, anos e mais
anos, saudáveis e produtivas, após esse dramático episódio.
Por que? Porque acreditaram,
sem a mínima vacilação, de coração, corpo (literalmente, em cada
célula do seu organismo) e alma que isso iria acontecer. Foram
trapezistas que se projetaram no vazio, na certeza de que seriam
“aparados” no ar pelo parceiro. E, de fato, foram. Fé... É uma
palavrinha tão pequena, de duas letras somente, e com tamanho poder!
Como explicar? E precisa de explicações?!
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