Saturday, May 24, 2014

Indecifrável enigma

Pedro J. Bondaczuk

O potencial humano – quer para o bem, quer para o mal – é incomensurável. É impossível determinar, em ambos os casos, o limite de sua atuação. Até onde ele pode chegar na superação de obstáculos e nos feitos da sua mente? No outro extremo, qual o máximo de degradação, violência, egoísmo e maldade que nossa espécie pode atingir? Quando achamos que, em ambos casos, já atingimos o limite, constatamos, surpresos, que não chegamos sequer à metade das possibilidades, para o bem e para o mal. Estão aí os feitos da ciência e da tecnologia a comprovar isso, com novas e surpreendentes realizações. Todavia, no outro extremo, deparamo-nos, a todo o momento, com monstros cruéis e insensíveis, capazes de infligir sofrimentos inimagináveis aos semelhantes, não importa se a um só ou se a milhões, como os casos dos ditadores tipo Hitler, Stalin, Lon Nol e tantos e tantos outros que nos levam a nos persignar diante da simples menção de seus nomes.

Coloco-me na posição de um suposto extraterrestre (caso isso seja possível e caso exista, alhures, outro ser vivo e inteligente, mais inteligente do que o homem). Portanto, assumo (ou tento assumir) a postura de um elemento neutro, de outro planeta, na tentativa de avaliar esse estranhíssimo animal, que é o homem (e que sou eu). Fosse esse o caso, minha cabeça, certamente, entraria em parafuso à primeira tentativa de avaliação desse animal estranhíssimo, “parecido” com o macaco, mas tão diferente dele. Pudera! Duvido que algum ET (no caso deles existirem, reitero) conseguiria entender minimamente o que ou quem realmente somos e quais as motivações que nos movem.    

O homem, quando se guia só pelos instintos e se deixa levar por seu latente egoísmo, é, de todos os animais, o mais feroz e o mais cruel. Não é, fisicamente, o maior e nem o mais forte. Torna-se tal, todavia, quando recorre à força da sua inteligência, caso a volte para a destruição. Torna-se insuperável nesse aspecto. Um elefante, a despeito do cérebro avantajado que tem, é incapaz de inventar e lançar mão de qualquer arma que não seja alguma parte do próprio corpo. Nunca soube de algum deles que houvesse inventado um revólver, um punhal, uma metralhadora ou mesmo simples porrete para se defender e nem para atacar ninguém e que tenha feito uso desses instrumentos. O mesmo vale para o leão, o tigre, o urso, o crocodilo e vai por aí afora.

E olhem que não estou sequer pensando em armas mais poderosas e letais, como tanques, aviões, granadas, bombas e... artefatos nucleares. Não fosse o homem o animal mais cruel da natureza (quando se deixa levar pelo instinto de fera e cala, por conseqüência, a razão), não haveria extremos, por exemplo, em termos de posses. Numericamente, há muitíssimo mais carentes no mundo, que não têm sequer certeza de obter o almoço de cada dia (por frugal que seja) do que os que não precisam se preocupar com as incertezas materiais da existência.

Milhões, Planeta afora, têm apenas as ruas das cidades como lar. Indigentes não faltam por toda a parte e cada qual é mais desvalido do que o outro. No entanto... essas pessoas são dotadas de inteligência, sentimentos, sonhos e esperanças. São, como nós, feitas “à imagem e semelhança de Deus”. Só na espécie humana há essas diferenças. E tudo porque, para reforçar os efeitos do instinto natural de fera, ele lança mão do que deveria servir somente de instrumento para o bem, para construir e assegurar a sobrevivência da espécie. Age assim com o objetivo de fazer prevalecer exclusivamente sua vontade, sem se importar se essa prevalência vai prejudicar ou mesmo eliminar semelhantes.

Em contrapartida, quando o homem utiliza a razão de forma construtiva, mantendo os impulsos instintivos sob rigoroso controle, opera maravilhas que descambam para a magia ou para o milagre, de tão assombrosas que são. Eu, se fosse o tal ET que mencionei acima, por mais inteligente e evoluído que fosse, ficaria embasbacado ao saber que um homem é capaz de trocar órgãos com mau funcionamento em semelhantes (fígado, rins, pulmões e até mesmo coração) e lhe dá uma sobrevida, às vezes até de décadas. Ficaria boquiaberto diante da habilidade desse animal aparentemente selvagem para criar instrumentos de comunicação tipo rádio, televisão, computador, telefone celular etc.etc.etc. Ficaria maravilhado com sua capacidade de entendimento do universo, das forças que o regem, de descobrir energias como a elétrica, magnética, nuclear etc. e não apenas isso, mas de inventar formas de produzi-las, de controlá-las e de direcioná-las em seu benefício.

Qual o limite de sua inteligência? É possível determiná-lo? Dificilmente. Ouso afirmar que não. No entanto, não se trata de nenhum deus imortal. É animal como outro qualquer, dotado dos mesmíssimos instintos dos demais. É magnífico quando consegue controlá-los. É terrível quando se deixa guiar por eles. Você nunca pensou nisso, caríssimo leitor? Jamais se interessou por conhecer a magnificência e o monstruoso potencial destrutivo da espécie a que pertence?
 
Da minha parte, confesso-me assombrado, confuso e atemorizado com tudo isso. Todos os animais recorrem à força bruta na disputa por território, pela fêmea para procriação, pela comida etc. Travam lutas terríveis, porém raramente letais. São raríssimos os casos, por exemplo, de elefantes matando elefantes, de leões matando leões, de tigres matando tigres e vai por aí afora e, assim mesmo, quando eventuais mortes acontecem, são meramente acidentais. São casuais. Os animais matam, sim, mas os de outras espécies, que não das suas. E fazem-no exclusivamente por razões defensivas ou para se alimentar de suas carnes. Seguem, pois, a lei da natureza, que desde que me conheço por gente considero cruéis, mas que são como são. E eles são irracionais. São movidos, puramente, por instinto, para eles incontrolável, por não contarem com o “freio” da razão. E o homem? Age da mesma maneira? A pergunta prescinde de resposta, não é mesmo? Infelizmente. Por isso jamais entendi, sequer remotamente, o que verdadeiramente sou e por que. Sou, por conseqüência, meu maior e mais indecifrável enigma.


Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk 

No comments: