Causas
de alegrias ou de frustrações
Pedro J. Bondaczuk
O ato de decisão faz com que
aquele que o irá praticar, guardadas as devidas proporções, assuma, naquele
momento fatal de decidir, o papel de um “deus”, ou quase. Ou então de um
demônio, conforme o caso. Faz com, que se sinta poderoso e onipotente. Nós
todos decidimos alguma coisa, e o tempo todo, em nossa vida. E essas decisões
vão desde as triviais, como que roupa vestir, ou o que comer no café da manhã
(ou outras tantas trivialidades como
estas a que sequer atentamos), até as
mais “sérias”, diria fundamentais, muitas das quais definitivas, que tendem a
determinar nosso futuro, o rumo de nossas vidas e, não raro, até nossa
sobrevivência.
As decisões, digamos, “menores”
são tomadas, salvo uma ou outra exceção, instintivamente, por impulso. E quando
as circunstâncias impõem, tomamo-las por simples intuição. Já as maiores, as
“importantes”, as que levam o indivíduo a sentir a emoção do risco – que sempre
existe, variando de intensidade, de acordo com a natureza do que se vai decidir
– devem ser planejadas (quando isso for possível, pois nem sempre é), mesmo que
o planejamento possa vir a ser (ou seja) arruinado pelo acaso, pelo
imprevisível, pelo fortuito, o que acontece, praticamente, o tempo todo. Qualquer
decisão dá a quem a toma a oportunidade de “antecipar o futuro”. Essa
antecipação – sequer seria necessário observar, por ser óbvia – é a lógica das
lógicas, porquanto não se decide nada para interferir no passado.
Corremos a vida toda atrás do sucesso, sem que sequer tenhamos visão
clara e definida do que ele signifique. Por conseqüência, fazemos o possível e
o impossível para fugir de fracassos – embora, às vezes, eles sejam até
necessários, por serem didáticos e muitas vezes nossa própria redenção, posto
que nos doam e nos frustrem. Quando iniciamos um empreendimento, não temos a
menor condição de “saber” qual será o resultado. Podemos, quando muito, apenas
tentar prevê-lo, com razoável (jamais absoluta) margem de acerto. Ao nos
depararmos com algum obstáculo, ao qual tenhamos que superar – ou mesmo ao
planejarmos algum empreendimento – fazemos, geralmente, três tipos de
avaliação, antes da tomada da decisão (que pode ou não ser irreversível): ou a
exata (raríssima e casual), ou a subestimada ou a do outro extremo, ou seja, a
superestimada.
A subestimação de um obstáculo pode ser fatal, pois nossa capacidade de
superá-lo será insuficiente dada a carência de forças para tal. Isso tende a
trazer, está claro, conseqüências seriíssimas, se não letais. Em termos de
planejamento, todavia, desde que ao subestimar as dificuldades de um
determinado empreendimento isso não nos leve a desistir dele, sem ao menos
tentar, pode ser, em alguns casos, até, um bem. Explico.
Citei, há algum tempo, em um dos meus textos, determinado episódio do
tipo trazido à baila por Machado de
Assis, no preâmbulo do romance “Memórias Póstumas de Brás Cubas”. O genial
escritor carioca lembrou que o francês Heri-Marie Beyle – que assinava seus
textos com o pseudônimo de Stendhal, com o qual ficou conhecido – confessou
haver escrito um de seus livros para apenas cem leitores. Não esperava nada
além disso. Qualquer coisa que excedesse essa cifra seria considerada por ele
como inesperado sucesso. Claro que superou, em muito, esse número. Stendhal
sentiu-se, pois, vitorioso. face á superação de suas expectativas, claramente
subestimadas. Escapou, portanto, da frustração, apenas por subestimar a própria
capacidade de mobilizar leitores. Esse tipo de subestimação valeu a pena para o
ilustre escritor. Nem todos, porém, valem.
Quanto à superestimação, embora esta possa evitar que nos lancemos em
alguma aventura irresponsável, que nos traga dissabores ou coisas piores, ela
pode, também, impedir que façamos algo de notável que esteja ao nosso alcance,
mas que não acreditemos e por isso não nos empenhemos por realizar. Nesse caso,
perderemos preciosa oportunidade que certamente iremos lamentar para o resto da
vida. Como se vê, tudo é relativo.
O amigo que me dá a honra da leitura certamente já notou minha
insistência, quase obsessão, em tratar desses dois temas, sucesso e fracasso.
Por que? Porque essa é a preocupação, mesmo que inconsciente, da maioria das
pessoas (desconfio que de “todas”), dependendo, reitero, de como cada qual
define essas duas condições. O que é sucesso para mim, por exemplo, não será,
necessariamente, para você e vice versa. Quem está certo? Quem está errado? Eu?
Você? Ambos, cada qual por um motivo? Nenhum dos dois? Como saber?
Há os que se aplicam no que fazem
somente por gosto. Pintam, por exemplo, um quadro; fazem uma escultura; compõem
uma sinfonia; escrevem um poema; redigem um romance, conto ou novela, ou
produzem qualquer outra coisa, sem preocupações, pelo menos momentâneas, quando
estão executando essas obras, com o resultado. Não pensam, por exemplo. no
sucesso comercial e no dinheiro que poderiam ganhar. Seu pensamento é
totalmente voltado só para a qualidade. Nem se lembram da possibilidade de que
o que fizerem pode durar anos, décadas, séculos, milênios, através de gerações.
No instante em que esses artistas
estão agindo, não lhes passam pela cabeça as questões do lucro nem da
imortalidade. Querem é fazer o que apreciam: com alegria, com entusiasmo, com
prazer, com talento e qualidade. Depois da obra concluída é que, para muitos,
vem o momento dessas ambições, dos resultados, da paga pelo esforço ou talento.
E este é, também, para alguns (desconfio que para a maioria) o duro instante da
frustração, caso superestimem o que fizeram. Ou também da euforia, por que não,
se as decisões que tomaram, no caso baseadas em subestimação, se revelem as
adequadas e o resultado seja o que desejaram quando não muito maior. Creio que
valha a reflexão. Afinal, “tudo vale a
pena se a alma não for pequena”, como concluiu Fernando Pessoa em um de seus
imortais poemas.
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