Friday, May 09, 2014

Causas de alegrias ou de frustrações

Pedro J. Bondaczuk

O ato de decisão faz com que aquele que o irá praticar, guardadas as devidas proporções, assuma, naquele momento fatal de decidir, o papel de um “deus”, ou quase. Ou então de um demônio, conforme o caso. Faz com, que se sinta poderoso e onipotente. Nós todos decidimos alguma coisa, e o tempo todo, em nossa vida. E essas decisões vão desde as triviais, como que roupa vestir, ou o que comer no café da manhã (ou outras tantas  trivialidades como estas  a que sequer atentamos), até as mais “sérias”, diria fundamentais, muitas das quais definitivas, que tendem a determinar nosso futuro, o rumo de nossas vidas e, não raro, até nossa sobrevivência.

As decisões, digamos, “menores” são tomadas, salvo uma ou outra exceção, instintivamente, por impulso. E quando as circunstâncias impõem, tomamo-las por simples intuição. Já as maiores, as “importantes”, as que levam o indivíduo a sentir a emoção do risco – que sempre existe, variando de intensidade, de acordo com a natureza do que se vai decidir – devem ser planejadas (quando isso for possível, pois nem sempre é), mesmo que o planejamento possa vir a ser (ou seja) arruinado pelo acaso, pelo imprevisível, pelo fortuito, o que acontece, praticamente, o tempo todo. Qualquer decisão dá a quem a toma a oportunidade de “antecipar o futuro”. Essa antecipação – sequer seria necessário observar, por ser óbvia – é a lógica das lógicas, porquanto não se decide nada para interferir no passado.

Corremos a vida toda atrás do sucesso, sem que sequer tenhamos visão clara e definida do que ele signifique. Por conseqüência, fazemos o possível e o impossível para fugir de fracassos – embora, às vezes, eles sejam até necessários, por serem didáticos e muitas vezes nossa própria redenção, posto que nos doam e nos frustrem. Quando iniciamos um empreendimento, não temos a menor condição de “saber” qual será o resultado. Podemos, quando muito, apenas tentar prevê-lo, com razoável (jamais absoluta) margem de acerto. Ao nos depararmos com algum obstáculo, ao qual tenhamos que superar – ou mesmo ao planejarmos algum empreendimento – fazemos, geralmente, três tipos de avaliação, antes da tomada da decisão (que pode ou não ser irreversível): ou a exata (raríssima e casual), ou a subestimada ou a do outro extremo, ou seja, a superestimada.

A subestimação de um obstáculo pode ser fatal, pois nossa capacidade de superá-lo será insuficiente dada a carência de forças para tal. Isso tende a trazer, está claro, conseqüências seriíssimas, se não letais. Em termos de planejamento, todavia, desde que ao subestimar as dificuldades de um determinado empreendimento isso não nos leve a desistir dele, sem ao menos tentar, pode ser, em alguns casos, até, um bem. Explico.

Citei, há algum tempo, em um dos meus textos, determinado episódio do tipo trazido à baila por  Machado de Assis, no preâmbulo do romance “Memórias Póstumas de Brás Cubas”. O genial escritor carioca lembrou que o francês Heri-Marie Beyle – que assinava seus textos com o pseudônimo de Stendhal, com o qual ficou conhecido – confessou haver escrito um de seus livros para apenas cem leitores. Não esperava nada além disso. Qualquer coisa que excedesse essa cifra seria considerada por ele como inesperado sucesso. Claro que superou, em muito, esse número. Stendhal sentiu-se, pois, vitorioso. face á superação de suas expectativas, claramente subestimadas. Escapou, portanto, da frustração, apenas por subestimar a própria capacidade de mobilizar leitores. Esse tipo de subestimação valeu a pena para o ilustre escritor. Nem todos, porém, valem.

Quanto à superestimação, embora esta possa evitar que nos lancemos em alguma aventura irresponsável, que nos traga dissabores ou coisas piores, ela pode, também, impedir que façamos algo de notável que esteja ao nosso alcance, mas que não acreditemos e por isso não nos empenhemos por realizar. Nesse caso, perderemos preciosa oportunidade que certamente iremos lamentar para o resto da vida. Como se vê, tudo é relativo.

O amigo que me dá a honra da leitura certamente já notou minha insistência, quase obsessão, em tratar desses dois temas, sucesso e fracasso. Por que? Porque essa é a preocupação, mesmo que inconsciente, da maioria das pessoas (desconfio que de “todas”), dependendo, reitero, de como cada qual define essas duas condições. O que é sucesso para mim, por exemplo, não será, necessariamente, para você e vice versa. Quem está certo? Quem está errado? Eu? Você? Ambos, cada qual por um motivo? Nenhum dos dois?  Como saber? 

Há os que se aplicam no que fazem somente por gosto. Pintam, por exemplo, um quadro; fazem uma escultura; compõem uma sinfonia; escrevem um poema; redigem um romance, conto ou novela, ou produzem qualquer outra coisa, sem preocupações, pelo menos momentâneas, quando estão executando essas obras, com o resultado. Não pensam, por exemplo. no sucesso comercial e no dinheiro que poderiam ganhar. Seu pensamento é totalmente voltado só para a qualidade. Nem se lembram da possibilidade de que o que fizerem pode durar anos, décadas, séculos, milênios, através de gerações.

No instante em que esses artistas estão agindo, não lhes passam pela cabeça as questões do lucro nem da imortalidade. Querem é fazer o que apreciam: com alegria, com entusiasmo, com prazer, com talento e qualidade. Depois da obra concluída é que, para muitos, vem o momento dessas ambições, dos resultados, da paga pelo esforço ou talento. E este é, também, para alguns (desconfio que para a maioria) o duro instante da frustração, caso superestimem o que fizeram. Ou também da euforia, por que não, se as decisões que tomaram, no caso baseadas em subestimação, se revelem as adequadas e o resultado seja o que desejaram quando não muito maior. Creio que valha a reflexão. Afinal,  “tudo vale a pena se a alma não for pequena”, como concluiu Fernando Pessoa em um de seus imortais poemas.


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