Saturday, April 26, 2014

Não é o casamento que está em crise


Pedro J. Bondaczuk

A despeito de algumas evidências e de dramas pessoais até recorrentes, prato cheio para nós, escritores, envolvendo casais, a instituição do casamento não está em crise e muito menos falida, como amiúde se apregoa, com base, apenas, em situações particulares. Não se pode generalizar. Contudo... os que defendem a tese generalizam. E incorrem, no meu entender, em grave erro de enfoque. Lembro-me, por exemplo, de um caso específico, ocorrido em 1989, muito explorado pela imprensa, que eu trouxe à baila para meus leitores, na ocasião em que aconteceu, quando eu era então editor do Correio Popular de Campinas. Ele deu o que falar, na época, e foi citado por muitos estudiosos do comportamento como um dos tantos exemplos da falência da instituição do casamento. Discordei então e continuo discordando ainda hoje dessa apressada conclusão. O episódio a que me refiro foi o protagonizado por um tal de Warren Murphy.

Esse norte-americano, de meia idade, por ter sido abandonado pela mulher (que levou consigo os filhos do casal) invadiu o local onde trabalhava, nos Correios de Nova Orleans, feriu a bala três companheiros e manteve uma senhora como refém por 13 horas. Casos como este, com desfechos muito mais trágicos, nunca foram novidade (infelizmente). Aliás, tornaram-se, até, corriqueiros. Ocorrem com enorme freqüência e não apenas nos Estados Unidos, mas em toda a parte do mundo.

Volta e meia, algum desequilibrado, ou desesperado por uma razão qualquer, ou não raro débil mental, ou usuário de drogas invade principalmente universidades, escolas secundárias e até creches, de arma na mão, para matar cinco, dez ou mais pessoas que nada têm a ver com seus desequilíbrios, para depois cometer suicídio. Esses atos brutais têm os mais variados motivos, ou alegações deles, via de regra absurdas como a própria ação violenta. O episódio envolvendo Warren Myrphy, portanto, não foi o único, nem o último e nem mesmo o mais grave do tipo. Não resultou em nenhuma morte. E nada teve a ver, especificamente, com a “instituição” casamento. Só teve com o dele, que por alguma razão (que não ficou bem esclarecida), desmoronou. Até hoje não entendo, portanto, o motivo da grande repercussão que teve.

Quem investe contra a instituição, achando que ela estaria “ultrapassada” e que defende até mesmo sua extinção, aponta dados estatísticos sobre separações e sobre crimes passionais como argumento, indiferente ás causas que, claro, não são todas iguais. Casamentos fracassados, no entanto, e desde tempos bíblicos (e certamente muitíssimo antes), sempre existiram e continuarão existindo tempo e mundo afora. Por que? Porque muitos são ainda feitos por puríssimo interesse, sem que entre nele a indispensável componente do amor. É claro que eles não dão e raramente podem dar certo.

Outros tantos relacionamentos do tipo são “mortos” pela rotina. O marasmo, muitas vezes, leva um dos parceiros, ou os dois, a aventuras extraconjugais. Em vários casos, elas não passam de episódios passageiros, fortuitos, casuais, que sequer são do conhecimento de um dos cônjuges, no caso a parte traída. Terminam como começaram e sequer deixam vestígios. Em outros, contudo, verificam-se dramas pungentes. A parte ofendida, às vezes, reage passionalmente e parte até para brutais assassinatos, que destroem  não somente o casamento, mas todos os que tenham quaisquer vínculos com ele. Em outras situações, a reação é moderada, mas a dor, o sofrimento, a humilhação são pavorosos. Deixam marcas indeléveis. E quase sempre o parceiro traidor arrepende-se do erro, mas quando já é tarde.

Por algumas horas (ou minutos?) de prazer carnal ilícito (que a mulher poderia ter com o marido ou este com a esposa licitamente) todo um passado de carinhos, de sonhos, de mutuo desvelo e de trabalho conjunto não raro é posto a perder. Em geral, o adultério, com suas conseqüências escabrosas, traz resultados danosos para quem não tem nada a ver com o erro do casal. Refiro-me aos filhos. São pessoas, óbvio, que sequer pediram para nascer. O pior é quando os adúlteros são ambos casados. Neste caso, o risco é maior, pois duas famílias, e não somente uma, findam por ser destruídas. Considfero, pois, o adultério não apenas uma violação moral, uma quebra de compromisso, mas uma imensa burrice.

O antídoto para esses casos é um só: Amor. Quem ama raramente trai. E se traído, tem a capacidade de perdoar e, de fato, perdoa. Afinal, errar é humano e ninguém é perfeito. Ninguém está completamente a salvo de alguma “escorregadela”. O que não pode é ela virar rotina. Se isso acontecer... bem, é imperdoável. A palavra amor, convenhamos, está um tanto desgastada pelo uso inadequado. Esse magno sentimento tem que vir acompanhado de uma série virtudes, como paciência, atenção, respeito, desvelo, tolerância, amizade, carinho, compreensão, fidelidade, desprendimento, sexo, e... muito mais. E todas reunidas de uma só vez. E, claro, não se pode esquecer da capacidade de perdão, que nunca falta quando o casal verdadeiramente se ama.

Todavia é preciso ter em conta que o amor é como delicadíssima flor. É belo, belíssimo, sublime e até transcendental, mas é extremamente frágil. Precisa ser cultivado e cuidado diariamente, para que não venha a secar e se transformar em algo mórbido, feio, doloroso, angustiante e doentio. Afinal, nele reside a fonte da vida, por ser o atributo maior da própria divindade. Ausente do casamento, este já nasce morto. Mas, insisto, a instituição em si não tem nada com isso. Não está falida e nem mesmo em crise. E por que trago á baila este assunto em um espaço destinado à Literatura? Simples. Porque se trata de tema infalível para romancistas, novelistas e contistas, pela carga dramática que têm. Só variam as circunstâncias e desfechos. No mais...Tem que ser, portanto, objeto de pesquisa e de observação, mas sem que tiremos conclusões afoitas e, portanto, enganosas.


Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk 

No comments: