Sunday, April 06, 2014

A arte de dialogar

Pedro J. Bondaczuk

O filósofo Platão é uma das figuras mais fascinantes de todos os tempos, quer por suas atitudes, quer, e principalmente, por suas idéias. É possível (não se pode descartar a possibilidade) que tenha havido pensadores mais profundos e geniais do que ele, de vida até mais exemplar e de descobertas, lições e propostas muito mais importantes e factíveis do que as dele. Ainda no terreno das possibilidades, podem ter existido esses seres geniais aos milhares, quiçá aos milhões, ao longo da História. Mas... se existiram ou não, jamais poderemos saber. Em, caso positivo, não restaram, sequer, mínimos vestígios de quem foram, onde e como viveram, o que fizeram ou pensaram e vai por aí adiante. Simplesmente desapareceram na poeira do tempo.

Já sobre Platão, não se tem essas dificuldades. Trata-se do único filósofo antigo cuja obra completa está disponível a nós, homens do século XXI. Mesmo que um ou outro dos seus livros tenha chegado até nós com naturais e prováveis distorções (como omissões, cortes e/ou acréscimos), ela pelo menos existe, está disponível e foi traduzida para os principais idiomas. Pode, portanto, ser (e é) estudada por interessados em idéias e conceitos de todo o mundo. Chega a ser até um milagre que isso tenha acontecido, ditado, no meu entender, exclusivamente pelo acaso. E dos outros, cujas opiniões a propósito da vida e do mundo que nos cerca são citadas a todo o momento e também se constituem em objetos de estudo, talvez até mais do que Platão?

Bem, de Aristóteles, por exemplo, que foi quem mais influência exerceu, inclusive sobre a Filosofia contemporânea, considerado “o mais versátil filósofo da história”, há consenso entre os entendidos que muita coisa se perdeu. O que, quanto e qual a importância, no conjunto de sua obra, do que foi perdido, é algo sobre o que só se pode especular. Mas muito de sua vasta produção, irremediavelmente se perdeu. O mesmo se pode dizer dos escritos de outros tantos homens notáveis, luminares da Filosofia, de quem restaram, pelo menos, fragmentos de idéias – uns mais e outros menos – como Epicuro de Samos, Plutarco de Queroneia, Tales de Mileto, Aristótenes de Atenas, Parmênides de Eléia, Heráclito de Efeso, Empédocles de Agrigento e Anaxágoras de Clazômenas, entre tantos, e tantos e tantos outros.

A parte mais importante da obra literária de Platão são os “Diálogos”, em número de trinta e cinco. Além deles, o filósofo nos legou ainda um conjunto de treze cartas, em que também traz à baila questões tais como conduta ética, cidadania e propostas políticas, entre outras coisas. Em tudo o que ele escreveu fica clara a busca pela verdade, através do processo mais humano que existe, o da “dialética”, que pode ser definida como a “arte de dialogar”. E nisso Platão foi insuperável. Daí seus livros terem esse nome genérico. Para efeito didático, os especialistas dividem os “Diálogos” platônicos por ordem cronológica, em quatro períodos.

Os primeiros são os de juventude, ou socráticos, escritos antes da morte de Sócrates, seu mestre e mentor, e consistem nos seguintes livros: “Apologia de Sócrates”, “Criton” ou “Do dever”; “Ion” ou “Da Ilíada”; “Laqués” ou “Da coragem”; “Lisis” ou “Da amizade”; “Cármides” ou “Da sabedoria” e “Eutifron” ou “Da santidade”.

Os “Diálogos” da fase de transição de Platão, são: “Eutidemo” ou “Da Eristica”; “Hipias menos” ou “Da mentira”; “Crátilo” ou “Da etimologia”; “Hipias Maior” ou “Do belo”; “Menexeno” ou “Do epitáfio”; “Górgias” ou “Da retórica”; “República – livro I”; “Protágoras” ou “Dos sofistas” e “Menon” ou “Da virtude”..

Os livros da fase de maturidade são quatro, a saber: “Fédon” ou “Da alma”; “Banquete” ou “Do bem”; “República – Livros II a X” e “Fedro” ou “Da beleza”.

Finalmente, os “Diálogos” da velhice são oito, com os seguintes títulos: “Parmênides” ou “Das formas”; “Tecteto” ou “Da ciência”; “Sofista” ou “Do ser”; “Político” ou “Da realeza”; “Filebo” ou “Do prazer”; “Timeu” ou “Da natureza”; “Crítias” ou “Da Atlântida” e “Leis” (livro inacabado).

Ler a obra de Platão, a despeito da complexidade de alguns dos seus livros, e mesmo que discordemos de muitas de suas colocações (que, no entanto, devem ser sempre contextualizadas, levando em conta a realidade do tempo em que os escreveu) é, sem dúvida, inigualável aventura do espírito. Não sou filósofo e tenho dificuldades em entender determinadas idéias, principalmente por causa do excesso de jargões característicos da “mãe de todas as ciências”. Mas, para mim, é sempre renovado prazer a leitura dos “Diálogos” desse gênio, sobre o qual não me canso de escrever e que pretendo, oportunamente, abordar muito mais.


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