Monday, April 07, 2014

Indignada adjetivação


Pedro J. Bondaczuk


A revelação da existência de uma organização secreta controlando um governo paralelo, à margem das leis da moral e da decência, destinada a dilapidar o patrimônio nacional, feita na Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga o esquema de corrupção no Orçamento da União, estarreceu e revoltou o País.

A que ponto chegamos! Em que mãos está o nosso destino, o nosso futuro e a administração do nosso pretenso bem comum! É impossível a um comentarista, por mais acostumado que esteja a lidar com assuntos escabrosos, manter a serenidade e traçar uma análise fria e objetiva diante de bandalheira tão vergonhosa.

Essa é uma questão cujo comentário é para ser feito na base da farta adjetivação, com uma infinidade de adjetivos que caracterizem, sobretudo, indignação e onde os pontos finais sejam todos substituídos por sinais de exclamação. Ou seja, fugindo, por completo, das regras clássicas que norteiam os bons artigos.

Essa quadrilha está se locupletando à custa da miséria dos brasileiros. Graças a esses apátridas egoístas, que não têm a mínima noção de nacionalidade e cujo deus e ideologia são apenas o dinheiro – e não o ganho honestamente, mercê do trabalho individual, mas o obtido mediante mutretas e esquemas – temos 32 milhões de famintos, 6 milhões de pais de família desempregados, 7,2 milhões de crianças abandonadas, um sistema de saúde medieval e em franca decomposição, escolas e universidades sucateadas e um ensino de baixíssimo, além de outras realidades tão apavorantes ou mais, que nos fazem rolar ladeira abaixo na direção do abismo.

O “governo paralelo”, de acordo com o pouco que foi divulgado nos documentos apresentados na CPI da corrupção, vem dilapidando a Nação desde pelo menos 1985. Isto, porque ninguém pode garantir que a mesma organização, ou outras similares, não tenham atuado em outras ocasiões.

Em inúmeras oportunidades, os brasileiros, certamente, se perguntaram: onde foi parar a riqueza gerada nas décadas de 60 e 70, quando o País teve o maior crescimento do mundo, com taxas superiores a 10% por vários anos consecutivos? Hoje, já se sabe pelo menos parte da resposta. Está nos célebres “paraísos fiscais” espalhados pelo mundo, nas contas numeradas dos que ousaram roubar o Brasil.       

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 7 de dezembro de 1993)


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