De mentiras e
mentirosos
Pedro
J. Bondaczuk
A mentira, o leitor há
de convir comigo, dispensa dia especial que a celebre. É onipresente. Está em
nosso cotidiano e é tão comum, que sequer lhe damos atenção, a menos que se
trate de algo que nos traga algum tipo de prejuízo: à reputação, aos relacionamentos,
à imagem ou, o que nem é muito raro, ao bolso. Convivemos com mentirinhas e
mentironas, ditas por amigos, por desafetos, por parentes, por colegas de
trabalho, por estranhos e... por políticos (provavelmente mais freqüentes). Se
todos que mentem tivessem, por castigo, o crescimento de seus narizes,
desconfio que a Terra seria um planeta de narigudos. E olhem que sequer estou
me referindo à ficção que, até por definição, é deslavada mentira, já que se
trata do ato de inventar histórias. Ou seja, de narrar, dando-lhe a máxima
verossimilhança, o que nunca aconteceu.
O jornalismo tem como
premissa básica, fundamental, rigorosa, como regra de ouro, como uma espécie de
“cláusula pétrea”, compromisso com a verdade. Portanto, não apenas execra, como
teoricamente bane da atividade a mentira (e o eventual jornalista mentiroso). É
certo que nem sempre essa postura é respeitada. Não, pelo menos, por todos. E
não pelo tempo todo. Aqui e ali, uma vez ou outra, algum órgão de imprensa dá
sua escorregadela, raramente percebida pelos leitores. Afinal, jornais são
feitos por pessoas e dessas não há nenhuma garantia que sejam “todas” ou
“sempre” verdadeiras. Quem disser, ou sequer insinuar, o contrário, mesmo que
não admita, estará mentindo.
Mas, o que o leitor
diria se eu lhe informasse que existiu, no Brasil, um jornal que no próprio
nome violava a regra de ouro do jornalismo, a de ter compromisso absoluto com a
verdade? Seu próprio nome já explicitava sua característica e explicitava sua
linha editorial. Chamava-se “A Mentira”. Tinha periodicidade quinzenal, nem
sempre respeitada, já que circulava somente quando seus editores tinham
dinheiro para pagar a impressão. Teve vida curta, como seriam as pernas do
comportamento que lhe dava o nome. Claro que não era sério e sua proposta nem
era esta. Tratava-se de jornal humorístico, ao qual nem o mais tolo dos tolos
poderia dar crédito. Destinava-se a fazer rir.
Como no mundo há
ingênuos para tudo, havia, entre seus escassos leitores, vários que acreditavam
nas “notícias” – escandalosas petas, posto que redigidas de forma tal a
convencerem principalmente os incautos – que estampava, além de mentir sem
remorso nos editoriais e em suas colunas de opinião. O sujeito crédulo, no meu
modo de entender, é o verdadeiro culpado, o responsável de fato pela existência
do malandro. Se não existisse o “trouxa”, este também não existiria. Ou, no
mínimo, esses pilantras, dispostos o tempo todo a tapear alguém para levar
vantagem, seriam raridades. Não são!
Entendo que se pode
mentir de duas formas principais: por ação e por omissão. A primeira maneira de
fazê-lo é óbvia e a mais comum, embora, salvo exceções, a menos perigosa. Ou
seja, dizendo inverdades. Alguns mentirosos são tão hábeis nesse mister, que
são capazes de convencer o mais cético dos céticos. Há, claro, algumas mentiras
que se desmascaram por si sós. São tão “cabeludas” e estapafúrdias, que o mais
ingênuo dos ingênuos as identifica de imediato. Mas há algumas tão elaboradas
que, não raro, assumem, e por anos, foros da mais rigorosa verdade.
A outra maneira de
mentir é por omissão. Esse tipo é sumamente perigoso por instalar dúvida no
espírito do interlocutor (ou interlocutores). É o caso em que o mentiroso
conhece a verdade sobre alguém ou algo, mas a omite. Deixa o caso no ar. Nessas
circunstâncias, formam-se, via de regra, duas correntes antagônicas: uma
defendendo que o que se diz ou se pensa a propósito de algo ou de alguém é
verdadeiro. A outra, por seu turno, acha que seja a mais deslavada das
mentiras. Se o verdadeiro “mentiroso” revelasse a verdade que conhece (mas que
omite), não haveria a dúvida. Tudo se esclareceria. Mas...
Sei que o leitor está
curioso por mais detalhes a propósito do insólito jornal que citei. Também
estou. Passei horas pesquisando no Google, em busca de maiores informações a
respeito (como onde era sua sede, em que época foi fundado, quando encerrou as
atividades, quem era seu proprietário etc.etc.etc.), em vão. Não encontrei
nada, rigorosamente nada. Fico, portanto, na dúvida: existiu, mesmo, um periódico
com estas características? Pode ser que sim, pode ser que não. Não que eu
esteja desconfiando da respeitabilidade de quem me deu a informação. Desconfio,
isso sim, da ocasião em que ela me foi passada: exatamente, num primeiro de
abril, o Dia Universal da Mentira.
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
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