Entre
o céu e o inferno
Pedro J. Bondaczuk
O peronista Carlos Saul Menem, que depois de amanhã assume
os destinos de 32 milhões de argentinos, em meio à maior crise já enfrentada
por esse país em toda a sua história, terá pela frente um desafio e uma oportunidade.
O primeiro caso é óbvio. Não é uma tarefa nada
agradável (e muito menos fácil) a de conter um processo hiperinflacionário com
taxas mensais em torno de 110%. Tal afirmação, de tão evidente, chega a ser
acaciana (palavra surgida do personagem de Eça de Queiroz, do livro “O Primo
Basílio”, Conselheiro Acácio, que só dizia obviedades e passava por gênio entre
os ingênuos que o rodeavam). Há quem preveja, até, que a inflação anual desse
país pode chegar aos astronômicos 440.000% em 1989, como que agourando o
fracasso do futuro presidente.
Menem vai assumir em meio a um clima de
indisfarçável inquietação. Saques a estabelecimentos que vendem alimentos estão
ameaçando se disseminar de novo. A população está apavorada e temerosa pelo dia
seguinte. Boatos de demissões em massa circulavam insistentemente, ontem, pelo
país, aumentando o justificado pânico de milhares e milhares de pais de
família.
Comerciantes, na incerteza do que terão pela frente,
remarcam furiosamente os preços das suas mercadorias, numa manifestação
indisfarçável de terror diante das incertezas do amanhã. Como se vê, trata-se
de um magnífico desafio para esse descendente de sírios, que acima de tudo
demonstra Ter bom senso ao não se ater aos quadros do seu partido na escolha da
sua equipe de governo.
No entanto, o fato do presidente eleito pegar a
Argentina nestas circunstâncias tão negativas, pode ser uma rara oportunidade
de consagração. Se Menem conseguir, em primeiro lugar, a confiança de todos os
setores da sociedade; se puder, de uma forma ou de outra, colocar em marcha o
que durante a sua campanha denominou de “revolução produtiva”, que para
funcionar precisa dar ocupação para cada cidadão válido, com condições de
trabalhar; se tiver como conciliar facções inconciliáveis dentro das Forças
Armadas e, principalmente, se obtiver o apoio geral na luta contra a
hiperinflação e vencer esse terrível monstro das economias desorganizadas,
terminará seus seis anos de mandato, em 1995, como um herói nacional.
Ganhará estátuas em praças públicas, terá cidades
com o seu nome e tudo o mais a que líderes carismáticos bem-sucedidos têm
direito. “E se fracassar?”, perguntará o leitor. Se não tiver sucesso, pode
preparar as malas para um prolongado exílio, como o de seu grande inspirador e
mentor, Juan Domingo Peron. Será tudo ou nada para Carlos Menem, sem
meios-termos.
(Artigo publicado na
página 14, Internacional, do Correio Popular, em 6 de julho de 1989)
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk.
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