Pigmeus
com complexo de gigantes
Pedro J. Bondaczuk
A
vida é um dom precioso demais para que em algum momento da sua trajetória
venhamos a abrir mão dessa prerrogativa, perdendo a vontade de viver. Qualquer
que seja seu conteúdo, devemos beber esse cálice até o fim, seja doce ou
amargo, de vinho capitoso ou de fel, por ele ser único. Não é, porém, o que
ocorre com determinadas pessoas quando sentem que perderam o vigor físico, a
beleza e parte da capacidade mental. Muitos, nestas circunstâncias, deixam-se
abater pelos anos e chegam, mesmo, a abrir mão de sua dignidade. Aceitam o
rótulo de “inválidos”, sem nem esboçar reação, como se fosse possível algum
homem, em algum tempo, perder seu valor por completo.
Quem
foi que disse, e baseado em que dados concretos, que um idoso é,
necessariamente, um peso, um ser humano desinteressante, improdutivo e acabado,
que apenas serve de estorvo aos que convivem com ele? Observem com atenção esta
relação: Eugênio Gudin (100 anos), Cary Grant (82), Dom Avelar Brandão Vilela
(74), Henry Moore (88), Simone de Beauvoir (78), Magdalena Tagliaferro (92) e
Jean Genet (74). O que essas personalidades têm em comum, além do fato de todas
terem morrido no ano de 1986? A idade. Todas essas pessoas mantiveram-se ativas,
e foram celebridades em suas respectivas profissões, para além dos 70 anos.
Beberam o cálice da vida até a última gota, porque eram indispensáveis.
Demonstraram, com isso, que se trata de uma façanha possível, caso haja
determinação e vontade para tal.
Todo
ser humano que sabe se valorizar e lutar por uma causa, qualquer que ela seja;
que ocupa a mente com idéias construtivas e nunca apenas com lembranças (boas
ou ruins não importa) de um passado que não se recupera jamais, tem essa
possibilidade. Basta querer e agir para concretizar sua vontade. No passado, os
povos civilizados da Antigüidade tinham nos anciões suas “bibliotecas”, numa
época em que não havia sido inventada a escrita. Eles é que transmitiam as
tradições e descobertas das respectivas comunidades de uma geração a outra,
impedindo que se perdessem. Será que o homem contemporâneo é tão mais burro do
que seus antepassados? Claro que não!!!
Os
povos antigos, que lançaram os fundamentos da civilização, concediam status
especialíssimo aos seus cidadãos de maior idade pelo fato deles terem algo
preciosíssimo que só com o muito viver se adquire: a experiência. Na Grécia,
por exemplo, o Legislativo de Atenas, composto por 400 membros, era vedado a
quem tivesse menos de 30 anos. Tratava-se da "Bulé", cuja tradução
seria "A Razão".
Em
Roma, havia o culto dos antepassados, os "deuses lares", para os
quais eram erguidos altares no interior das casas, as tão conhecidas
"lareiras", que hoje têm função de apenas aquecer as moradias nos
países mais frios e de mera decoração nos de clima quente, entre eles o Brasil.
Na
China, a Assembléia dos Anciãos dava sempre a última palavra, antes de alguma
decisão dos imperadores, o mesmo ocorrendo no Japão e entre outros tantos
povos. A Rússia, nos seus primórdios, tinha uma câmara semelhante: a dos
boiardos. E o que ocorre no Brasil contemporâneo? Total e absoluto desrespeito
pelos mais idosos. A partir dos 30 anos, por exemplo, quando o indivíduo atinge
o apogeu em termos de razão, já é considerado ultrapassado e enfrenta
dificuldades para arranjar emprego.
Parte
considerável dos cidadãos mais velhos passa a ser encarada como trambolho,
estorvo e sofre toda a sorte de agressões à sua dignidade, principalmente por
parte de parentes que sequer chegam a pensar que um dia também irão envelhecer.
Há milhares de asilos espalhados por este País, muitos dos quais meros e
literais “depósitos” de gente, onde os que lá vivem (na verdade, vegetam ou
limitam-se a sobreviver) são tratados como sombras, zumbis, como tudo, menos
como pessoas.
Mais
do que nunca o sofrido cidadão, portanto, se conscientiza de que é sumamente
verdadeira a afirmação de que o homem contemporâneo não passa de pigmeu que
somente aparenta ser grande (e se julga como tal) porque está de pé nos ombros
dos antepassados. Um país que não respeita e nem protege seus verdadeiros
heróis – em geral anônimos – ou seja, os que o construíram e impulsionaram, não
pode aspirar nenhum futuro. Não tem memória, não tem tradições, não tem
história e não tem nada. Deus que nos livre do Brasil ser assim!!!
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