"Perestroika" está chegando
à África
Pedro J.
Bondaczuk
A chamada "Revolução de Veludo", ocorrida
no segundo semestre de 1989, no Leste europeu, como conseqüência da nova
doutrina não-intervencionista soviética apelidada de "My Way" ---
numa alusão à célebre canção de Frank Sinatra --- pelo ex-chanceler Eduard
Shevardnadze e que pôs fim ao regime comunista na maioria dos países da Europa
Oriental, está influenciando decisivamente um outro continente: a África.
Nos derradeiros dois anos, várias guerras civis
africanas, irresolutas, acabaram. Outras, estão em vias de terminar. Algumas
chegaram ao fim mediante acordos entre as partes em conflito, como foi o
recente caso da de Angola. Outra, não tiveram nada do "veludo" do
Leste europeu e se encerraram com a chegada ao poder de grupos guerrilheiros,
algumas com espetáculos deprimentes de violência e muito sangue.
Um caso bem sucedido foi o da ex-colônia
sul-africana da Namíbia, que finalmente conquistou sua independência e entregou
a direção nacional ao seu maior herói contemporâneo, líder da guerrilha Swapo
(Organização do Povo do Sudeste da África), Sam Nujoma. Ele foi eleito por
folgada maioria, em eleições limpas e honestas, supervisionadas pelas Nações
Unidas.
Outro "happy end" é o de Angola, que após
16 anos de violência e horror, que foram responsáveis pela perda de pelo menos
300 mil vidas e pela ruína da economia de um dos poucos países da África que,
dada a fertilidade do solo e suas riquezas naturais, tinha tudo para ser
viável, se tornou um dos mais pobres do mundo.
Agora, finalmente, os angolanos poderão dedicar
todos os seus esforços à construção de uma pátria e não mais à preservação do
que se transformou num imenso quartel.
A Etiópia, por sua vez, esteve muito próxima de um
final feliz para a sua guerra civil, não estivesse seu ditador marxista,
Mengistu Hailé Marian, tão desgastado a ponto de precisar fugir para o
Exterior, deixando atrás de si o caos e a desordem, às vésperas das negociações
de paz, em Londres. Os três principais grupos guerrilheiros etíopes não deram
tempo para que se chegasse a um pacto político. Tomaram Addis Abeba, para
salvar a cidade dos saques e atos de banditismo que lá se registravam, no dia
28 de maio passado.
Anteontem, o jovem líder da maior facção que
derrubou o regime, Meles Zenawi, de 36 anos, ex-estudante de medicina, chefe da
Frente Democrática Revolucionária do Povo da Etiópia, assumiu o poder, com
promessas de democracia e de eleições livres até o fim de 1992. Oxalá cumpra o
prometido.
Três outras guerras civis africanas terminaram de
forma melancólica: a do Chade (com a vitória do grupo de Uadal Abdelcacer
Camuguê); da Libéria (onde o principal dirigente rebelde, Charles Taylor, viu
escapar de suas mãos o comando do país, na última hora, tomado pelo seu rival Prince
Johnson, após o assassinato do ex-ditador Samuel Doe) e da Somália, que está
sob o controle de Abdullaí Iussuf Ahmed, da Frente Democrática de Salvação,
depois da dramática queda do controvertido presidente Mohammed Siad Barre, em
janeiro passado.
Outros conflitos estão sem solução, como o de
Ruanda, por exemplo, com o major-general Juvenal Habyarimana se conservando
teimosamente à frente do governo, no auge de impopularidade, salvo recentemente
da derrubada por uma providencial intervenção franco-belga. De qualquer forma,
há algo de novo acontecendo na África. Tomara que seja, finalmente, o emergir
da democracia. Tomara.
(Artigo publicado na página 14, Internacional, do
Correio Popular, em 4 de junho de 1991).
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