Wednesday, November 13, 2013

"Perestroika" está chegando à África



Pedro J. Bondaczuk


A chamada "Revolução de Veludo", ocorrida no segundo semestre de 1989, no Leste europeu, como conseqüência da nova doutrina não-intervencionista soviética apelidada de "My Way" --- numa alusão à célebre canção de Frank Sinatra --- pelo ex-chanceler Eduard Shevardnadze e que pôs fim ao regime comunista na maioria dos países da Europa Oriental, está influenciando decisivamente um outro continente: a África.

Nos derradeiros dois anos, várias guerras civis africanas, irresolutas, acabaram. Outras, estão em vias de terminar. Algumas chegaram ao fim mediante acordos entre as partes em conflito, como foi o recente caso da de Angola. Outra, não tiveram nada do "veludo" do Leste europeu e se encerraram com a chegada ao poder de grupos guerrilheiros, algumas com espetáculos deprimentes de violência e muito sangue.

Um caso bem sucedido foi o da ex-colônia sul-africana da Namíbia, que finalmente conquistou sua independência e entregou a direção nacional ao seu maior herói contemporâneo, líder da guerrilha Swapo (Organização do Povo do Sudeste da África), Sam Nujoma. Ele foi eleito por folgada maioria, em eleições limpas e honestas, supervisionadas pelas Nações Unidas.

Outro "happy end" é o de Angola, que após 16 anos de violência e horror, que foram responsáveis pela perda de pelo menos 300 mil vidas e pela ruína da economia de um dos poucos países da África que, dada a fertilidade do solo e suas riquezas naturais, tinha tudo para ser viável, se tornou um dos mais pobres do mundo.

Agora, finalmente, os angolanos poderão dedicar todos os seus esforços à construção de uma pátria e não mais à preservação do que se transformou num imenso quartel.

A Etiópia, por sua vez, esteve muito próxima de um final feliz para a sua guerra civil, não estivesse seu ditador marxista, Mengistu Hailé Marian, tão desgastado a ponto de precisar fugir para o Exterior, deixando atrás de si o caos e a desordem, às vésperas das negociações de paz, em Londres. Os três principais grupos guerrilheiros etíopes não deram tempo para que se chegasse a um pacto político. Tomaram Addis Abeba, para salvar a cidade dos saques e atos de banditismo que lá se registravam, no dia 28 de maio passado.

Anteontem, o jovem líder da maior facção que derrubou o regime, Meles Zenawi, de 36 anos, ex-estudante de medicina, chefe da Frente Democrática Revolucionária do Povo da Etiópia, assumiu o poder, com promessas de democracia e de eleições livres até o fim de 1992. Oxalá cumpra o prometido.


Três outras guerras civis africanas terminaram de forma melancólica: a do Chade (com a vitória do grupo de Uadal Abdelcacer Camuguê); da Libéria (onde o principal dirigente rebelde, Charles Taylor, viu escapar de suas mãos o comando do país, na última hora, tomado pelo seu rival Prince Johnson, após o assassinato do ex-ditador Samuel Doe) e da Somália, que está sob o controle de Abdullaí Iussuf Ahmed, da Frente Democrática de Salvação, depois da dramática queda do controvertido presidente Mohammed Siad Barre, em janeiro passado.

Outros conflitos estão sem solução, como o de Ruanda, por exemplo, com o major-general Juvenal Habyarimana se conservando teimosamente à frente do governo, no auge de impopularidade, salvo recentemente da derrubada por uma providencial intervenção franco-belga. De qualquer forma, há algo de novo acontecendo na África. Tomara que seja, finalmente, o emergir da democracia. Tomara.

(Artigo publicado na página 14, Internacional, do Correio Popular, em 4 de junho de 1991).


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