Novas
pontes e velhos muros
Pedro J. Bondaczuk
A data de hoje, para a Europa e para o restante da
comunidade internacional, marca um acontecimento que, certamente, ficará
registrado na história dos povos como um momento de grandeza e de entendimento,
quando o fim da guerra fria, que durou praticamente 45 anos, apresenta o seu
primeiro resultado palpável.
A pátria de Schiller, Nietszche, Göethe,
Schopenhauer, Beethoven e Wagner, para citar apenas alguns grandes nomes da
cultura que este grande povo produziu, está, finalmente, restaurada. Há somente
365 dias, quando o Muro de Berlim ainda estava em pé como um trágico símbolo de
discórdia e de rancor, se alguém dissesse que num tão curto espaço de tempo o
fato iria acontecer, todos iriam duvidar dele. Mas aconteceu.
É verdade que a Alemanha unida, uma potência que
renasce das próprias cinzas, surge no cenário mundial em meio a um clima de
indisfarçável temor dos países outrora ameaçados e duramente atingidos pelo
pesadelo nazista que se abateu sobre a Europa na primeira metade deste século.
O passado, convenhamos, não é algo que se esquece.
Ninguém pode apagar, por exemplo, a tragédia do genocídio de seis milhões de
judeus, exterminados brutalmente como se não fossem seres humanos. Para quem
não viveu naquele período, este fato é tão absurdo, tão hediondo, tão
inverossímil, que as novas gerações às vezes chegam a duvidar que haja
ocorrido. Mas, desgraçadamente, ocorreu.
Certamente esse episódio nada brilhante na
extraordinária história germânica jamais será esquecido pelo povo alemão. E nem
pode. O passado, todavia, é apenas válido no sentido de uma autocrítica.
Somente é útil como um modelo a ser evitado ou seguido, dependendo se o que
esconde é um conceito, uma prática ou um costume positivos ou negativos.
A nova potência nasce não em decorrência de uma
conquista militar ou em virtude de qualquer concessão dos vencedores da Segunda
Guerra Mundial. Seu surgimento é uma decorrência natural de um processo de
distensão. A reunificação germânica era algo que já se impunha há tempos, desde
o surgimento da República Federal Alemã, em 1949, baseada em princípios de
fraternidade e cooperação, sem nutrir mais os sentimentos revanchistas do fim
da Primeira Guerra Mundial ou as ambições hegemonistas do III Reich.
Oxalá o país ressurja tendo por lema a inscrição que
consta no sino instalado na torre da prefeitura da antiga Berlim Ocidental
(hoje com sua unidade restaurada): “Que este mundo, pela vontade de Deus, ganhe
o renascimento da liberdade”. E que o mundo aja de acordo com as palavras ditas
anteontem pelo presidente norte-americano George Bush, ao discursar na
Assembléia Geral da ONU: “Que possamos construir novas pontes e derrubar velhos
muros”.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio
Popular, em 3 de outubro de 1990)
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