Friday, November 15, 2013

Novas pontes e velhos muros


Pedro J. Bondaczuk

A data de hoje, para a Europa e para o restante da comunidade internacional, marca um acontecimento que, certamente, ficará registrado na história dos povos como um momento de grandeza e de entendimento, quando o fim da guerra fria, que durou praticamente 45 anos, apresenta o seu primeiro resultado palpável.

A pátria de Schiller, Nietszche, Göethe, Schopenhauer, Beethoven e Wagner, para citar apenas alguns grandes nomes da cultura que este grande povo produziu, está, finalmente, restaurada. Há somente 365 dias, quando o Muro de Berlim ainda estava em pé como um trágico símbolo de discórdia e de rancor, se alguém dissesse que num tão curto espaço de tempo o fato iria acontecer, todos iriam duvidar dele. Mas aconteceu.

É verdade que a Alemanha unida, uma potência que renasce das próprias cinzas, surge no cenário mundial em meio a um clima de indisfarçável temor dos países outrora ameaçados e duramente atingidos pelo pesadelo nazista que se abateu sobre a Europa na primeira metade deste século.

O passado, convenhamos, não é algo que se esquece. Ninguém pode apagar, por exemplo, a tragédia do genocídio de seis milhões de judeus, exterminados brutalmente como se não fossem seres humanos. Para quem não viveu naquele período, este fato é tão absurdo, tão hediondo, tão inverossímil, que as novas gerações às vezes chegam a duvidar que haja ocorrido. Mas, desgraçadamente, ocorreu.

Certamente esse episódio nada brilhante na extraordinária história germânica jamais será esquecido pelo povo alemão. E nem pode. O passado, todavia, é apenas válido no sentido de uma autocrítica. Somente é útil como um modelo a ser evitado ou seguido, dependendo se o que esconde é um conceito, uma prática ou um costume positivos ou negativos.

A nova potência nasce não em decorrência de uma conquista militar ou em virtude de qualquer concessão dos vencedores da Segunda Guerra Mundial. Seu surgimento é uma decorrência natural de um processo de distensão. A reunificação germânica era algo que já se impunha há tempos, desde o surgimento da República Federal Alemã, em 1949, baseada em princípios de fraternidade e cooperação, sem nutrir mais os sentimentos revanchistas do fim da Primeira Guerra Mundial ou as ambições hegemonistas do III Reich.

Oxalá o país ressurja tendo por lema a inscrição que consta no sino instalado na torre da prefeitura da antiga Berlim Ocidental (hoje com sua unidade restaurada): “Que este mundo, pela vontade de Deus, ganhe o renascimento da liberdade”. E que o mundo aja de acordo com as palavras ditas anteontem pelo presidente norte-americano George Bush, ao discursar na Assembléia Geral da ONU: “Que possamos construir novas pontes e derrubar velhos muros”. 

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 3 de outubro de 1990)


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