Vendedores
de armas
Pedro J. Bondaczuk
A guerra entre Irã e Iraque vai completar, no dia 22
do próximo mês, o quinto ano consecutivo de duração e não há a mínima
perspectiva de que o conflito – que os analistas previram, no início, como de
rápido desfecho – esteja próximo do fim.
Estima-se que a intransigência do iraquiano Saddam
Hussein e do líder iraniano, aiatolá Ruhollah Khomeini, já tenha custado, no
mínimo, um milhão de vítimas fatais e mais uma quantidade indeterminada (várias
vezes maior do que a dos mortos) de feridos, em ambos os lados.
Muita gente pergunta como o Irã conseguiu o milagre
de recuperar um terço do seu território que havia sido tomado pelo inimigo nos
primeiros meses de guerra, se está, desde 1980, sob um formal boicote imposto
pelos principais fornecedores internacionais de armas. Onde o regime dos
fundamentalistas desse país tem se abastecido de equipamentos bélicos, alguns
relativamente sofisticados, como o míssil de médio alcance soviético Scud, com
que Teerã atacou, por diversas vezes, Bagdá?
Dos EUA, oficialmente, os iranianos não conseguem
importar sequer uma reles agulha, já que os dois países não mantêm, há tempos,
qualquer espécie de relacionamento. Quanto à União Soviética, Khomeini abomina
o seu regime e procura distância de Moscou, ao menos para consumo externo. Os
países europeus, teoricamente, mantêm sanções contra o Irã, em apoio aos
norte-americanos. Como Teerã faz para se municiar?
Bem, para quem tem dinheiro para pagar à vista,
nunca faltarão vendedores de canhões, tanques, granadas e até caças e mísseis.
E o governo iraniano, graças ao petróleo farto que o país possui, ainda está
longe da falência. Portanto, não tem a mínima dificuldade de adquirir
equipamento bélico e peças de reposição, tanto no mercado marginal e
clandestino, responsável por armar guerrilhas de vários países, em diversos
continentes, quanto, até, no oficial, o dos grandes países, mediante operações
triangulares.
O armamento soviético, por exemplo, é fornecido ao
Irã através da Coréia do Norte, da Líbia e da Síria. E na quantidade que os
iranianos quiserem, desde que tenham o dinheiro para pagar. O norte-americano
envolve uma operação mais complicada um pouquinho, mas nem por isso tão
dramática. É vendido através dos chamados freelancers.
Às vezes acontece do grupo que opera a venda ser
descoberto, como no caso que envolveu o tenente-coronel Wayne Gillespie,
detido, anteontem, pelo FBI, por tentar remeter 1.200 mísseis para Teerã.
Quantos outros foguetes, porém, já não terão sido enviados por esse meio, sem
que as autoridades suspeitassem (ou fizessem vistas grossas)? Não se pode
afirmar com certeza que isso já tenha sido feito. Mas negar peremptoriamente,
também não.
Uma coisa fica patente até para o leigo. No mercado
de armamentos, a ideologia do comprador é o que menos conta. O que importa é se
o cliente tem ou não condições de pagar o preço exigido. Onde, quando e como
ele vai usar esse equipamento simplesmente não interessa a esses grupos, que se
alimentam de conflitos e desavenças, de ambições desmedidas de tiranos e de
utópicos sonhos de fanáticos.
Eles não querem saber se essas armas vão conservar
no poder endoidecidos ditadores, que não têm o mínimo escrúpulo de mandar para
os campos de batalha crianças de dez anos ou menos. Ou se vão manter em seus
cargos homens que têm insensatas ambições hegemônicas.
Por isso, a guerra do Golfo Pérsico tem tudo para
emplacar não apenas um lustro, mas até mesmo uma década, ou mais.
Principalmente, depois que o Ocidente percebeu que, ao contrário do que temia a
princípio, ela não põe, absolutamente, em risco o seu fornecimento de petróleo.
(Artigo publicado na página 9, Internacional, do
Correio Popular, em 2 de agosto de 1985)
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