Saturday, March 11, 2017

Perestroika vive hora decisiva


Pedro J. Bondaczuk


O momento decisivo para Mikhail Gorbachev se aproxima. Os extremos, na União Soviética, direita e esquerda, mais uma vez se tocaram e se uniram com a finalidade de derrubá-lo, e não é de agora. Os objetivos das duas facções, evidentemente, são diferentes. Aliás, esse conceito, na URSS, é diverso do que conhecemos no Ocidente.

Ali, ser esquerdista é pretender, simplesmente, derrubar o comunismo e o direitista, evidentemente, está do lado oposto, objetivando restaurar o Estado totalitário. O presidente, na qualidade de reformador, não é compreendido. Carece de aliados e sobretudo de quem realmente entenda o alcance de suas idéias e não as apóie apenas por oportunismo, visando a conseguir vantagens pessoais.

Nicoló Machiavelli, pensador do século XVI, já observava, em sua época, o comportamento natural em relação aos que pretendem reformar algo, uma reação que cabe como uma luva ao caso atual de Gorbachev: "O reformador tem inimigos em todos aqueles que se aproveitam da velha ordem, e somente tíbios defensores naqueles que se aproveitariam da nova ordem; essa tibieza resulta em parte do medo dos seus adversários...e em parte da incredulidade do gênero humano que não acredita em nada que é novo até que tenha plena consciência de sua realidade".

O presidente soviético superestimou a capacidade de seu povo de raciocinar acerca de questões políticas, econômicas e sociais, ou seja, de seus problemas, por conta própria. Convém sempre ressaltar, e reiterar o quanto se torna necessário, que a atual geração desse país foi condicionada ao totalitarismo. Por isso, confunde democracia com anarquia e liberdade com libertinagem.

A população tem servido, inocentemente, de massa de manobra de políticos oportunistas. Está, evidentemente, mal informada. E a culpa por essa desinformação cabe aos meios de comunicação, que sempre foram manipulados pelo Estado. Eles apregoaram, por tanto tempo, tanta falsidade, que agora ninguém crê quando procuram expressar a verdade. Ocorre como naquela história de Pedro e o Lobo.

Gorbachev cometeu um pecado mortal ao elaborar e expor seu projeto reformista. Atribuiu papel fundamental ao Partido Comunista, exatamente o maior interessado em manter as coisas como sempre estiveram, mesmo estando evidente que o país caminha para o abismo.

Quando se deu conta disso, já era tarde. Afastou a agremiação das decisões de governo, mas não pôs fim à "Nomenklatura" do PC. Ou seja, é esse sistema pervertido e corrupto que ainda se aplica ou deixa de aplicar as determinações emanadas do Cremlin. Tem tudo nas mãos para sabotar a execução de qualquer mudança. Nomeia desde o presidente de uma fábrica a um simples capataz. Continua todo-poderoso e agora aspira novamente o poder total. Assim não há quem consiga mudar alguma coisa.

Essa sabotagem só podia dar no que está dando: no caos administrativo, no vácuo do poder. O ex-presidente do Banco Mundial e ex-secretário de Defesa norte-americano, Robert McNamara, constatou, num célebre seminário de que participou, em fevereiro de 1967, em Jackson, no Mississippi: "A suborganização, a subgestão de uma sociedade, não significa respeito pela liberdade. Significa, simplesmente, consentir que outras forças, que não as da razão, dêem forma à realidade. Essas forças podem ser a emoção, o ódio, a agressão, a ignorância, a inércia --- tudo menos a razão. Sejam elas quais forem, se a força que rege a atividade humana não for a força da razão, o homem ficará sempre abaixo de seus meios". E é isso o que vem ocorrendo na União Soviética contemporânea.

(Artigo publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 20 de abril de 1991).

 
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