Pigmalião
ameaçado
Pedro J. Bondaczuk
O Parlamento
da República da Rússia fez, ontem, sério desafio ao poder central, ao aprovar
uma medida considerando as leis russas superiores às nacionais dentro de seu
território. É evidente que a decisão representou o primeiro passo para a
reivindicação da soberania completa em relação à União Soviética.
Foi
isso o que fizeram, por exemplo, os legisladores dos Estados bálticos,
Lituânia, Letônia e Estônia, antes de declararem, unilateralmente, sua
independência de Moscou. Quanto a essas unidades federativas, embora o
presidente Mikhail Gorbachev tentem fazer com que revoguem as medidas
secessionistas (por contrariarem a Constituição da URSS), o dirigente até
admite que elas venham, a médio prazo, a se separar da Federação.
Mas
e a Rússia? É possível, viável ou plausível sua separação? Caso esta República
venha a tomar essa atitude, será o fim da União Soviética! Se isso acontecer, o
maior império já formado no mundo em todos os tempos estará desfeito, ou, pelo
menos, desfigurado.
Restarão
à União republiquetas miseráveis, problemáticas, onde vivem etnias que nutrem
histórico rancor umas pelas outras. Mikhail Gorbachev não terá para quem
implantar a sua perestroika. Afinal, a Rússia tem dois terços do território da
atual superpotência do Leste, detém muito mais da metade da sua riqueza e
abriga 52% dos 285 milhões de habitantes do país.
Pode-se
dizer, sem menosprezo aos demais Estados, que ela, virtualmente, é a União
Soviética. As outras 14 Repúblicas não passam de meros apêndices. Para
complicar ainda mais as coisas, a segunda República em importância da
Federação, a Ucrânia, que já chegou a ser um país independente (posto que por
pouco tempo, logo após a assinatura do Tratado de Brest-Litovsk, de 1918) não
esconde de ninguém as suas aspirações autonomistas.
Isto
sem contar a Geórgia, a Moldávia (que os romenos reivindicam) e o Azerbaijão
(que sonha em se fundir com a sua outra parte, a pertencente ao Irã). Pode
parecer uma dolorosa ironia, mas foi o próprio presidente Mikhail Gorbachev,
com a sua larga visão de futuro, que propiciou essa situação, ao lançar a
glasnost e a perestroika.
Evidentemente,
sua intenção não foi esta, mas a de fortalecer a União e tornar a URSS também
superpotência econômica, já que militarmente ela o é. Todavia teve, ou está
tendo (ou pelo menos caminha para ter) o mesmo destino do mítico Pigmalião Erigiu uma estátua tão perfeita, que esta
adquiriu vida. Apaixonou-se perdidamente por sua obra, por essa verdadeira
Galatéia política. Só que a criatura conquistou personalidade própria e agora
está na iminência de destruir o criador..
(Artigo
publicado na página 11, Internacional, do Correio Popular, em 9 de junho de 1990).
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