Os
grandes perdedores
Pedro J. Bondaczuk
O cientista político italiano Norberto Bobbio
afirmou, numa entrevista, que “a democracia é o estado no qual a luta contra o
abuso de poder é travada paralelamente em duas linhas: contra o abuso de poder
que parte do alto em nome do poder que vem de baixo, e contra o poder
concentrado, em nome do poder distribuído”. A citação vem a propósito de uma
notícia dando conta de que, em 1993, o governo e o setor financeiro lucraram
US$ 21,7 bilhões com a inflação.
Tal constatação desmente as afirmações de ministros
e de políticos em épocas de campanha de que todos perdem com essa disfunção
econômica, concentradora de renda. Do montante citado, US$ 12,8 bilhões foram
para os cofres do Tesouro, enquanto os restantes US$ 8,9 bilhões desse lucro
couberam aos bancos.
O deputado e ex-ministro Delfim Netto costuma citar,
freqüentemente, um princípio lógico, que embora óbvio, nem todos se dão conta.
O de que, sempre que alguém lucra, certamente, outro alguém saiu perdendo. E
quem perdeu, neste caso, com a inflação?
Um levantamento do Banco Central responde a esta
questão. O referido relatório revela que mais de 59% da população brasileira
não tem acesso sequer à caderneta de poupança como forma de proteger seu
dinheiro da corrosão inflacionária. Estes, que somam 115 milhões de habitantes
com mais de 10 anos de idade, os grandes perdedores.
Os titulares das 47,2 milhões de contas, que
constituía, em 1993, o universo dos poupadores, se não lucraram, pelo menos não
tiveram perdas. Outro aspecto a considerar é o fato de uma inflação baixa nem
sempre significar justiça social. O combate às altas taxas inflacionárias deve
vir acompanhado de medidas tendentes a gerar empregos à população.
Exemplo atual são os casos do México e da Argentina,
países que nos últimos dias estiveram às voltas com sangrentos conflitos. Os
mexicanos obtiveram, em 1993, índices notáveis, fechando o ano com um acumulado
anual de apenas 5%. Todavia, 20% dos seus trabalhadores estão desempregados.
Os argentinos emplacaram uma inflação de 7% no ano
passado. Porém, 10% da sua população não tem trabalho e o país ostenta um nível
de empobrecimento de 30%. Combate à inflação e justiça social, portanto, devem
andar lado a lado na promoção do desenvolvimento.
(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio
Popular, em 14 de janeiro de 1994)
Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk
No comments:
Post a Comment