Tribo
tem liderado todas rebeliões
Pedro J. Bondaczuk
O povo curdo, embora tenha ascendido às manchetes
dos grandes jornais do mundo a partir de abril passado, quando esteve ameaçado
de ser massacrado pelas tropas leais a Saddam Hussein, depois do seu fracassado
levante, ao término da guerra do Golfo Pérsico, é pouco conhecido em sua
maneira de viver.
Seus costumes, lendas e tradições, riquíssimos, por
serem multimilenares, começam, agora, a despertar as atenções. Ainda assim,
diminuíram bastante de interesse, tão logo a etnia foi salva de um possível
genocídio pela providencial ajuda ocidental, em especial dos Estados Unidos, da
França e da Grã-Bretanha.
Uma das tribos curdas mais fascinantes de se estudar
é a dos jesidas, que se concentra ao redor da cidade iraquiana de Mosul. É dela
que saem os chamados “peshmercas”, guerrilheiros que há séculos vêm combatendo
turcos, ingleses, iraquianos e persas, para conquistar sua própria pátria.
A revista “Eu Sei Tudo”, que circulou entre 1916 e
meados da década de 1950 e que teve muita popularidade no Brasil, dedicou
várias matérias a esse grupo. Uma foi na edição de dezembro de 1932 e outra,
por exemplo, na de julho de 1939.
A despeito do avanço nas comunicações mundiais, os
jesidas mantêm-se isolados nas montanhas, cultivando suas tradições, praticando
sua estranha religião, preservando intacta a língua curda e conservando seus
costumes, nem sempre bem-compreendidos.
Eles são considerados pelos etnólogos como o mais
belo e bravo dos povos que habitam as montanhas entre a Turquia e o Mar Cáspio,
na União Soviética. Dessa tribo saíram virtualmente os chefes de todas as
revoltas já promovidas pelos habitantes do Curdistão através dos tempos.
O autor de uma das matérias da revista “Eu Sei
Tudo”, intitulada “Uma Religião Alucinante”, que não assinou o texto, publicado
na edição de dezembro de 1932, escreveu a respeito dos jesidas: “São tão
bravos, que em uma das últimas revoltas (a de 1920, contra os britânicos) um só
jesida deteve e destruiu a granadas de mão um tanque inglês, obrigando todos os
seus tripulantes a se renderem”.
A característica talvez mais peculiar desse grupo
curdo é a sua religião. Trata-se do único povo conhecido no mundo a,
abertamente, sem disfarces, sem lhe dar o nome de Sol, Fogo ou qualquer outra
coisa, render culto ao demônio.
Na matéria supracitada, o autor assinalou, acerca
dos jesidas: “Orgulhosos de sua religião e de seus costumes, são os unidos
povoadores da Ásia Menor que nunca se deixaram influenciar em suas moradas e
vestuários pelos europeus. Entre eles não há o menor vestígio de civilização e
a maioria dos jesidas nunca viu um europeu”.
A religião proíbe-lhes ler e escrever. Este é um
privilégio detido somente pelos sacerdotes, guardiões dos livros sagrados e dos
lugares santos de peregrinação situados em Sheik-Adi, a Leste de Mosul, onde
está a sepultura de seu maior santo, que dá nome à localidade. O admirável é
como, sendo analfabetos, os jesidas detêm tamanha liderança sobre os
“peshmercas”, os temidos e valentes guerrilheiros curdos.
(Artigo publicado na página 16, Internacional, do
Correio Popular, em 16 de maio de 1991)
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