Quadro sombrio
Pedro J. Bondaczuk
As
perspectivas econômicas mundiais para 1981 se apresentam mais sombrias do que
as do ano que recentemente se encerrou. Na esfera capitalista, recessão,
desemprego e altas taxas inflacionárias vão marcar profundamente o período. Na
socialista, o problema será de gravidade idêntica. Mas vai se caracterizar por
escassez de alimentos e pela tentativa dos técnicos estatais marxistas em
conseguir significativos aumentos de produtividade da classe operária, com
concomitantes congelamentos salariais, causando, em conseqüência, visível
decréscimo do padrão de vida dos trabalhadores.
Os
governos do Ocidente terão que implantar medidas restritivas bastante severas e
impopulares para o desaquecimento econômico, visando a, a qualquer custo, deter
a espiral inflacionária que lhes corrói a economia. Elas vão se concentrar
especialmente nos cortes das despesas públicas, redução das importações, maior
severidade na arrecadação tributária e em outras providências de caráter
recessivo. Com isso, no plano político, pode-se esperar crescente inquietação
social, especialmente na Europa, no ano de 1981.
Esse
quadro mundial vai desfavorecer a tentativa brasileira de reequilibrar a sua
cambaleante balança de pagamentos, deficitária em cerca de US$ 2,9 bilhões no
exercício recém-findo. As autoridades de Brasília estão incentivando --- além
de um necessário arrocho nas importações --- um volume que seja expressivo nas
vendas externas. Mormente se estas forem de produtos industriais. A meta, segundo
o ministro do Planejamento, Delfim Netto, é que as exportações brasileiras
ascendam aos US$ 26 bilhões ao longo de 1981. E, se possível, até mesmo superem
essa cifra recorde.
Mas
a situação econômica do mundo ocidental gera um certo pessimismo nos círculos
financeiros, quanto às possibilidades do Brasil alcançar essa marca. A Suécia,
por exemplo --- grande cliente do nosso País na Escandinávia --- apresentou um
alarmante déficit na sua balança de pagamentos. Conseqüentemente, adotará
medidas restritivas severas para contê-lo neste ano.
EUA,
França, Inglaterra e Itália não fugirão à regra. E suas autoridades financeiras
apenas pensam em reduzir as suas alarmantes taxas inflacionárias. Mesmo que
isso se dê às custas do desemprego --- em virtude da ocorrência de uma
quantidade maior de falências de empresas, tanto industriais, como comerciais e
de prestação de serviços --- elas acham válida a providência, embora tal
situação apresente riscos de levar esses países a um verdadeiro caos social.
A
Alemanha Ocidental, cuja economia vinha se pautando por um relativo equilíbrio,
não vai conseguir fugir à crise generalizada que afeta atualmente não apenas o
continente europeu, mas o mundo todo. O último pronunciamento feito no ano
passado pelo chanceler germânico Helmuth Schmidt foi muito franco e realista.
Indicou as dificuldades que o país atualmente atravessa. E pediu sacrifícios
redobrados aos alemães para a superação desse crítico momento econômico
mundial.
Até
mesmo o Japão, dono de miraculosas taxas de crescimento no pós-guerra, teve que
se contentar, no ano passado, com um modesto avanço de apenas 1,5% na sua
economia. Isso foi motivado, principalmente, pelas dificuldades que atingem a
todos os importadores de petróleo: problemas de abastecimento por causa da
guerra do Golfo Pérsico e custos sempre crescentes do produto. A Coréia do Sul,
protagonista de outro milagre econômico na Ásia, pela primeira vez nos últimos
vinte anos sofreu um decréscimo no seu PNB. Isso, depois de anos seguidos em
que o seu incremento médio se deu a taxas superiores a 10% anuais.
Mas
o Brasil tem outras saídas. Poderá lograr sucesso em sua política exportadora
junto ao mundo socialista. Porém terá que vender produtos primários ao Leste
Europeu, especialmente grãos. O ano agrícola soviético foi desastroso, por
causa de problemas climáticos. Foi sua terceira safra desastrosa de cereais
seguida. Sua produção de alimentos ficou muito aquém das 250 milhões de
toneladas requeridas. Foi da ordem de apenas 188 milhões de toneladas. O desempenho
agrícola soviético chegou a ser, no ano passado, pior, inclusive, do que no
desastroso 1979.
Com
o embargo decretado pelo presidente norte-americano Jimmy Carter a Moscou, em
virtude da invasão ordenada pelo Kremlin ao Afeganistão, a URSS teve que se voltar
para as nações do Terceiro Mundo para poder controlar seus parcos estoques de
ração animal. A grande beneficiada com o boicote dos EUA foi a Argentina, que
incrementou as suas exportações para os russos em cerca de 80%. Por que o
Brasil, um dos maiores produtores mundiais de soja, não procura conquistar esse
ávido mercado?
A
Polônia é outro país socialista às voltas com a falta de alimentos. No último
Natal, por exemplo, uma simples barra de chocolate era considerada mercadoria
de alto luxo naquela República marxista. Foi um dos presentes mais cobiçados
pelos poloneses. Manteiga, toucinho, açúcar, salsicha e carne tornaram-se
artigos raros naquele país. E a situação da Polônia, no abastecimento de
alimentos, tende a agravar-se com a reconhecida carência mundial de gêneros
alimentícios.
Esse
seria outro promissor mercado para os brasileiros. E deveria ser explorado
rapidamente, antes que qualquer outro país o conquiste. O Brasil pode vender
aos poloneses principalmente alimentos industrializados.
O
governo do general Figueiredo vive apregoando a prioridade para o setor
agrícola quanto aos investimentos federais. As autoridades de Brasília esperam,
inclusive, graças a fatores climáticos altamente favoráveis, uma nova safra
nacional recorde. É o caso de tentar-se, também, conseguir uma exportação
recordista de alimentos às desesperadas Repúblicas socialistas do Leste
Europeu, aproveitando as circunstâncias peculiares do momento. Essa seria a
forma mais racional, e rápida, de restabelecer o equilíbrio comercial
brasileiro. De quebra, o País poderia exportar produtos industriais no âmbito
do Terceiro Mundo, especialmente aos africanos.
Mas
a saída para o Brasil está mesmo na agricultura, graças à sua dimensão e à
fertilidade do seu solo. Porque, com a recessão mundial, querer vender grandes
quantidades de produtos industrializados para nações altamente desenvolvidas
--- embora em crise --- é o mesmo que negociar geladeiras com esquimós do
Alasca.
(Artigo
publicado na página 4 do jornal "Fatos & Negócios" em 30 de
janeiro de 1981)
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