Tuesday, March 28, 2017

Quadro sombrio


Pedro J. Bondaczuk


As perspectivas econômicas mundiais para 1981 se apresentam mais sombrias do que as do ano que recentemente se encerrou. Na esfera capitalista, recessão, desemprego e altas taxas inflacionárias vão marcar profundamente o período. Na socialista, o problema será de gravidade idêntica. Mas vai se caracterizar por escassez de alimentos e pela tentativa dos técnicos estatais marxistas em conseguir significativos aumentos de produtividade da classe operária, com concomitantes congelamentos salariais, causando, em conseqüência, visível decréscimo do padrão de vida dos trabalhadores.

Os governos do Ocidente terão que implantar medidas restritivas bastante severas e impopulares para o desaquecimento econômico, visando a, a qualquer custo, deter a espiral inflacionária que lhes corrói a economia. Elas vão se concentrar especialmente nos cortes das despesas públicas, redução das importações, maior severidade na arrecadação tributária e em outras providências de caráter recessivo. Com isso, no plano político, pode-se esperar crescente inquietação social, especialmente na Europa, no ano de 1981.

Esse quadro mundial vai desfavorecer a tentativa brasileira de reequilibrar a sua cambaleante balança de pagamentos, deficitária em cerca de US$ 2,9 bilhões no exercício recém-findo. As autoridades de Brasília estão incentivando --- além de um necessário arrocho nas importações --- um volume que seja expressivo nas vendas externas. Mormente se estas forem de produtos industriais. A meta, segundo o ministro do Planejamento, Delfim Netto, é que as exportações brasileiras ascendam aos US$ 26 bilhões ao longo de 1981. E, se possível, até mesmo superem essa cifra recorde.

Mas a situação econômica do mundo ocidental gera um certo pessimismo nos círculos financeiros, quanto às possibilidades do Brasil alcançar essa marca. A Suécia, por exemplo --- grande cliente do nosso País na Escandinávia --- apresentou um alarmante déficit na sua balança de pagamentos. Conseqüentemente, adotará medidas restritivas severas para contê-lo neste ano.

EUA, França, Inglaterra e Itália não fugirão à regra. E suas autoridades financeiras apenas pensam em reduzir as suas alarmantes taxas inflacionárias. Mesmo que isso se dê às custas do desemprego --- em virtude da ocorrência de uma quantidade maior de falências de empresas, tanto industriais, como comerciais e de prestação de serviços --- elas acham válida a providência, embora tal situação apresente riscos de levar esses países a um verdadeiro caos social.

A Alemanha Ocidental, cuja economia vinha se pautando por um relativo equilíbrio, não vai conseguir fugir à crise generalizada que afeta atualmente não apenas o continente europeu, mas o mundo todo. O último pronunciamento feito no ano passado pelo chanceler germânico Helmuth Schmidt foi muito franco e realista. Indicou as dificuldades que o país atualmente atravessa. E pediu sacrifícios redobrados aos alemães para a superação desse crítico momento econômico mundial.

Até mesmo o Japão, dono de miraculosas taxas de crescimento no pós-guerra, teve que se contentar, no ano passado, com um modesto avanço de apenas 1,5% na sua economia. Isso foi motivado, principalmente, pelas dificuldades que atingem a todos os importadores de petróleo: problemas de abastecimento por causa da guerra do Golfo Pérsico e custos sempre crescentes do produto. A Coréia do Sul, protagonista de outro milagre econômico na Ásia, pela primeira vez nos últimos vinte anos sofreu um decréscimo no seu PNB. Isso, depois de anos seguidos em que o seu incremento médio se deu a taxas superiores a 10% anuais.

Mas o Brasil tem outras saídas. Poderá lograr sucesso em sua política exportadora junto ao mundo socialista. Porém terá que vender produtos primários ao Leste Europeu, especialmente grãos. O ano agrícola soviético foi desastroso, por causa de problemas climáticos. Foi sua terceira safra desastrosa de cereais seguida. Sua produção de alimentos ficou muito aquém das 250 milhões de toneladas requeridas. Foi da ordem de apenas 188 milhões de toneladas. O desempenho agrícola soviético chegou a ser, no ano passado, pior, inclusive, do que no desastroso 1979.

Com o embargo decretado pelo presidente norte-americano Jimmy Carter a Moscou, em virtude da invasão ordenada pelo Kremlin ao Afeganistão, a URSS teve que se voltar para as nações do Terceiro Mundo para poder controlar seus parcos estoques de ração animal. A grande beneficiada com o boicote dos EUA foi a Argentina, que incrementou as suas exportações para os russos em cerca de 80%. Por que o Brasil, um dos maiores produtores mundiais de soja, não procura conquistar esse ávido mercado?

A Polônia é outro país socialista às voltas com a falta de alimentos. No último Natal, por exemplo, uma simples barra de chocolate era considerada mercadoria de alto luxo naquela República marxista. Foi um dos presentes mais cobiçados pelos poloneses. Manteiga, toucinho, açúcar, salsicha e carne tornaram-se artigos raros naquele país. E a situação da Polônia, no abastecimento de alimentos, tende a agravar-se com a reconhecida carência mundial de gêneros alimentícios.

Esse seria outro promissor mercado para os brasileiros. E deveria ser explorado rapidamente, antes que qualquer outro país o conquiste. O Brasil pode vender aos poloneses principalmente alimentos industrializados.

O governo do general Figueiredo vive apregoando a prioridade para o setor agrícola quanto aos investimentos federais. As autoridades de Brasília esperam, inclusive, graças a fatores climáticos altamente favoráveis, uma nova safra nacional recorde. É o caso de tentar-se, também, conseguir uma exportação recordista de alimentos às desesperadas Repúblicas socialistas do Leste Europeu, aproveitando as circunstâncias peculiares do momento. Essa seria a forma mais racional, e rápida, de restabelecer o equilíbrio comercial brasileiro. De quebra, o País poderia exportar produtos industriais no âmbito do Terceiro Mundo, especialmente aos africanos.

Mas a saída para o Brasil está mesmo na agricultura, graças à sua dimensão e à fertilidade do seu solo. Porque, com a recessão mundial, querer vender grandes quantidades de produtos industrializados para nações altamente desenvolvidas --- embora em crise --- é o mesmo que negociar geladeiras com esquimós do Alasca.

(Artigo publicado na página 4 do jornal "Fatos & Negócios" em 30 de janeiro de 1981)


Acompanhe-me pelo twitter: @bondaczuk        

No comments: