Wednesday, March 01, 2017

Golfo Pérsico continua instável


Pedro J. Bondaczuk


A guerra do Golfo Pérsico, com todos os seus horrores e sua dramaticidade, não resolveu, em absoluto, os problemas que envolvem o Oriente Médio e fazem dessa região a mais instável e tensa do mundo há pelo menos quatro décadas. Quando muito, eliminou uma ameaça --- se é que fez de fato isto, o que ainda é contestável --- representada pela existência da quarta maior força militar mundial situada no Golfo Pérsico, que era o Iraque antes da confrontação.

Todavia, o fenômeno Saddam Hussein não desapareceu do cenário regional. Por algum tempo, enquanto cura as feridas da derrota, o presidente iraquiano pode não representar mais um risco  que se deva levar em consideração. Mas por quanto tempo?

Um novo equilíbrio de forças, centrado numa solução árabe, envolvendo Síria e Egito, está sendo tentado. As seis monarquias do Golfo --- Arábia Saudita, Kuwait, Bahrein, Qatar, Oman e Emirados Árabes Unidos --- concordaram, na reunião realizada nesta semana em Damasco, com o estabelecimento de uma tropa permanente na zona, como uma espécie de guarda, de "gendarme", que era o título empregado para o Irã de antes de 1979, anterior à Revolução Islâmica, quando esse país exercia tal papel, defendendo, bem ou mal, os interesses do Ocidente.

O pacto firmado na quarta-feira representa uma vitória para o presidente sírio, Hafez Assad, visto com desconfiança pela sua comunidade por haver apoiado a posição iraniana na guerra que esse país travou com o Iraque, de 1980 a 1988.

Para um Saddam enfraquecido --- se de fato estiver impedido de se rearmar, o que é muito contestável, dados os interesses dos que comandam o mercado "spot" de armas --- esta solução será um tormento a mais para ele suportar. Afinal, a Síria sempre foi tida e havida como sua maior antagonista na região. E a nova força será composta por soldados dessa nação e do Egito.

Resta saber se sírios e egípcios conseguirão coexistir nesse tipo de aliança. O fato de haverem lutado juntos, do mesmo lado, no recém findo conflito, não eliminou as divergências, inclusive ideológicas, e portanto muito profundas, entre seus regimes.

É verdade que ambos têm um retrospecto de cooperação, pois já compuseram uma fracassada federação, que foi a República Árabe Unida, que se esfacelou na década de 1970. Além disso, o novo sistema de segurança regional, a dita solução árabe para garantir a estabilidade no Golfo, não levou em conta um país importante nesse contexto: o Irã.

O regime dos aiatolás saiu fortalecido da guerra, pela posição inteligente --- diríamos, pragmática --- de seu presidente, Ali Akbar Hashemi Rafsanjani, de, embora condenando a invasão iraquiana ao Kuwait, se opor à destruição do Iraque pelas forças multinacionais.

Economicamente, Teerã só teve benefícios ao longo de toda a crise, "herdando" os clientes de petróleo dos dois fornecedores locais envolvidos na confrontação. Portanto, à primeira vista, a propalada "solução" árabe para a segurança regional tem tudo para ser, na verdade, uma nova complicação.

(Artigo publicado na página 13, Internacional, do Correio Popular, em 8 de março de 1991).


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