Tuesday, March 07, 2017

Perestroika ou estagnação


Pedro J. Bondaczuk


O Partido Comunista da União Soviética começa, hoje, na 19ª conferência extraordinária que realiza desde 1917, a busca de uma identidade, diante de uma série de propostas para a mudança, não apenas do seu papel na sociedade desse país, mas de conduta de seus membros e dirigentes, para que a agremiação não fique tão distante da população o quanto se encontra atualmente.

Nessa reunião, estarão em jogo a sorte e a forma de implantação (caso sejam aprovadas) das reformas econômicas, políticas e sociais que o líder Mikhail Gorbachev pretende fazer. Opositores não faltam ao projeto reformista e eles são muito poderosos. Tratam-se, em geral, ou de fanáticos, perdidos no tempo, no espaço e na história, ou de burocratas corruptos, que não querem perder privilégios conquistados através de anos de práticas nada recomendáveis.

Há, também, muitos que encamparam as medidas reformistas de imediato e que entendem que estas podem ser a única solução para tirar a superpotência oriental de uma perigosa e até humilhante estagnação econômica.

Mesmo a população está bastante dividida a respeito. A enquête feita por um jornalista ocidental, que percorreu a “Transiberiana” de ponta a ponta, da qual um trecho foi mostrado no “Fantástico” deste domingo, da Rede Globo, mostrou bem isso.

Os indolentes, que se contentam apenas com um prato de comida e um teto sobre a cabeça, sem se importar com a qualidade de nada e que detestam trabalhar, estão contra a “Perestroika”. Os de espírito dinâmico, que nutrem ambições não apenas pessoais, mas de progresso também do Estado, apóiam com entusiasmo o projeto reformista.

E há os eternos alienados, que declaram “não entender” e nem gostar de política, que se dizem satisfeitos com qualquer coisa que for decidida, como se isso fosse possível e desejável.

O fato é que as mudanças propostas vão implicar em sacrifícios. Aliás, milagres só existem na cabeça dos néscios ou dos preguiçosos, que ficam sempre esperando “benesses divinas”, esquecidos de que até Deus somente “ajuda a quem se auxilia”.

Os soviéticos, que nunca, desde a Revolução Bolchevique de 1917, tiveram tanta liberdade para discutir o que ocorre no país e jamais o fizeram com tanta intensidade, têm, agora, uma oportunidade rara (estas sempre o são) e talvez a derradeira, de definir se viverão eternamente num Estado policial, que vigia cada passo dos seus cidadãos e que pune ou premia seus atos de acordo com critérios que dependem da cabeça de uma diminuta elite burocrática, ou se deixam de ser habitantes de uma potência somente militar, incapaz de prover dos bens essenciais e de boa qualidade à sua população e se tornam membros de uma sociedade que reponha as coisas no seu devido lugar. Ou seja, onde o mais capaz, esforçado e inteligente sempre se sobressaia sobre os parasitas.

(Artigo publicado na página 14, Internacional, do Correio Popular, em 28 de junho de 1988).


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