Thursday, October 13, 2016

Sociedade enferma



Pedro J. Bondaczuk


O pensador Herbert Marcuse – hoje fora de moda, mas que foi o guru da geração rebelde dos anos 60, aquela que protagonizou os levantes estudantis de 1968 – escreveu, em um de seus livros: “Uma sociedade está doente quando as instituições fundamentais e suas relações (ou seja, sua estrutura) são de tal natureza, que não permitem a utilização dos meios materiais existentes para o desenvolvimento ideal da existência humana”.

Por esse parâmetro, a nossa, brasileira, está gravemente, copiosamente, perigosamente enferma, embora sua enfermidade tenha cura. Convenhamos, a vida de 85% da população do País, especialmente dos 32 milhões de famintos (ou mais), não é das mais dignas e invejáveis.

O problema do Brasil não é a falta de recursos, embora os vários governos que se têm sucedido no correr da nossa história choraminguem sobre a falta de dinheiro para cobrir todas as necessidades dos cidadãos.

Já fomos a sétima economia do mundo e hoje, de acordo com levantamento insuspeito do Fundo Monetário Internacional, divulgado em maio passado, ocupamos a nona colocação. Apenas isso serviria para não justificar tamanha legião de miseráveis, tendo, como contraponto, fortunas fabulosas, com rios de dólares investidos no exterior, no outro extremo.

Trata-se, pois, de uma sociedade doente, injusta, desunida e não-solidária. Nossas instituições têm se revelado frágeis e, sobretudo, incompetentes para utilizar os meios materiais existentes para valorizar, proteger e promover o maior patrimônio de uma nação: o seu povo.

Enquanto nos parâmetros econômicos, a despeito da propalada crise – da qual uma minoria privilegiada está absolutamente a salvo – o Brasil ocupa posição de destaque, nos quesitos sociais despenca ladeira abaixo, igualando-se aos países mais miseráveis da Ásia, da África e, principalmente, da América Latina.

As mazelas políticas, a corrupção desbragada, a institucionalização da impunidade para os “poderosos”, enquanto com os humildes a Justiça costuma ser severa, quando não vingativa – contrariando a doutrina de Cesare Beccaria, segundo a qual a pena não é uma vingança, mas uma chance de reeducação – e o uso da retórica, para substituir ações, ameaçam tirar do brasileiro seu último e mais precioso bem: a esperança.

(Artigo publicado na página 2, Opinião, do Correio Popular, em 23 de dezembro de 1993)


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